quarta-feira, 2 de maio de 2012

O Valor da Biodiversidade


Num mundo regido por interesses económicos, a salvaguarda da biodiversidade parece depender da quantificação dos seus bens e serviços. Quanto estaria disposto a pagar para desfrutar de uma paisagem luxuriante ou de uma caminhada no campo?
Vários têm sido os artigos no nosso portal dedicados à preservação da diversidade biológica. Dela se destacou, entre outras coisas, a sua importância no ciclo do ar e da água, na reciclagem dos nutrientes, na descoberta de produtos para o tratamento de diferentes doenças, como fonte de alimento e no uso para recreio.
Um aspecto ainda não debatido prende-se com a quantificação económica dos bens e serviços resultantes da biodiversidade. Quanto vale - em escudos, dólares ou libras - uma paisagem luxuriante ou o descanso que um passeio pelo “campo” nos proporciona? Dez, vinte, cem contos? Como proceder para atribuirmos um valor económico a bens não transaccionáveis?
De uma forma simples podemos dizer que a economia visa a distribuição de recursos escassos por diferentes alternativas. Assim, a exploração desregrada dos recursos naturais, que conduziu à sua escassez e fragilidade, tornou-os objecto de estudo da economia.
Esta aproximação da economia à ecologia não tem sido bem vista por alguns ecologistas, que receiam que a tomada de decisões venha a ser feita com base em critérios económicos e não ecológicos. Outros, pelo contrário, argumentam que o facto de não ser atribuído um valor económico à biodiversidade pode fazer com que não lhe seja reconhecida importância.
A dificuldade na atribuição de valor económico aos bens e serviços gerados pela diversidade biológica depende do tipo de valores em questão. Assim, estes têm sido divididos, por autores como Young e Barbier, em valores de uso e valores de não uso. Entre os valores de uso, os bens e serviços podem ter um valor resultante do seu uso directo – madeira, caça, turismo, da sua função ecológica – fotossíntese, protecção contra a erosão, ou por serem um valor de opção. Por valor de opção entende-se os benefícios ainda desconhecidos da biodiversidade, como a descoberta de novas substâncias para o tratamento de doenças. Os valores de não uso separam-se entre valores de existência, como é a satisfação por sabermos que o Lince-ibérico ainda existe nas serras do Sul de Portugal, ou o valor de doação, relacionado com a possibilidade de podermos transmitir às gerações vindouras o mesmo património que nos foi legado.
A inventariação da totalidade dos bens e serviços provenientes da diversidade biológica em categorias de valor económico permite que, ao analisarmos duas alternativas de uso para o mesmo espaço, estejamos a ter em consideração todos os proveitos daí resultantes. No entanto, a quantificação dos valores de não uso dificulta a avaliação. Numa tentativa de ultrapassar esta dificuldade vários métodos têm sido enunciados para estimar os valores de não uso e de uso. Um deles é o do valor de substituição. Por exemplo, sabendo que os pinhais da zona litoral centro de Portugal asseguram a fixação das areias e protegem dos ventos salgados, este método propõe que o valor a encontrar seja dado pelo que teríamos de despender na construção de uma estrutura que oferecesse os mesmos benefícios. Outro dos métodos utilizados consiste em questionar o público sobre o valor que estaria disposto a pagar por um determinado recurso - método do valor de contingência.
Recentemente, o Ministro do Ambiente, José Sócrates, estabeleceu que ao preço de cada carro novo fosse adicionado o valor de 1 euro (cerca de 200$00) por pneu, com o objectivo de incentivar a reciclagem de pneus e assim diminuir o uso da borracha. Outro caso concreto da aplicação destas metodologias permitiu avaliar que a manutenção da floresta tropical de Korup, nos Camarões, era económica e ecologicamente mais vantajosa que a sua transformação em explorações agrícolas.
A avaliação e a conservação da natureza, especialmente nas regiões menos desenvolvidas, enfrentam ainda o problema das disparidades entre custos e benefícios. Assim, ao pedirmos a um proprietário para conservar um dado habitat, mantendo um determinado uso do solo, em detrimento de outro economicamente mais rentável, estamos a pedir-lhe para arcar com os custos da conservação, enquanto nós, sociedade em geral, receberemos os benefícios.
Uma tentativa de contrariar esta disparidade tem vindo a ser feita na Europa Comunitária, através das medidas agro-ambientais. Considerada como importante para o desenvolvimento rural e para a fixação das populações, a agricultura tem beneficiado de apoios sempre que as suas práticas sejam ecologicamente benéficas para a conservação de um ecossistema. Exemplo disso é o Plano Zonal de Castro Verde, onde, com o objectivo de preservar a avifauna da região, os agricultores recebem importantes incentivos financeiros em troca da manutenção de um sistema cerealífero extensivo, longos pousios e com o recurso a quantidades mínimas de agro-químicos.
Actualmente, o valor da biodiversidade não reside apenas na beleza de uma paisagem ou na manutenção de espécies em vias de extinção, mas no facto da nossa sobrevivência neste planeta depender da sua conservação. Este deve ser um objectivo a alcançar pela sociedade e não simplesmente a quimera de alguns sonhadores.


in:naturlink.sapo.pt

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