quarta-feira, 29 de julho de 2015

Fundos Europeus: obrigação de acolher para contribuir

O burburinho começa lentamente a instalar-se num ambiente descontraído, falsamente descontraído, quem sabe, fluido como se deseja neste tempo que antecede a  reunião para que todos foram convidados: pequenos empresários, simples negociantes, expositores, artistas, artesãos, curiosos, representantes regionais de partidos políticos. As escadas de acesso à antecâmara deram suporte aos primeiros cumprimentos ou só acenos, uns espontâneos, outros diplomáticos.

A sala encontra-se completamente cheia! A uma certa distância e num patamar superior, à mesa de trabalhos, assim se depreende pelos adereços, os notáveis, em fila, foram chegando e tomando lugar. Por fim, com ar de desembaraço, sentam-se os orientadores, só podem ser pelo ar de convicção que expressam. Desfazem-se dúvidas e passa-se imediatamente às apresentações: o senhor Governador, o sr. Presidente, o sr. Delegado, o sr. Diretor e a sra. Diretora, o sr. Engenheiro, Adjunto já não me lembro de quê, o sr. Representante dos comerciantes do nordeste da zona norte que simultaneamente vereia no seu município, a senhora Professora que acumula funções no Departamento Económico para o Desenvolvimento Regional, a sua Assessora, o sr. Doutor, Professor jubilado que “nos” honra com a sua presença e o distinto Empresário, reconhecido no meio e por todos como exemplo máximo nas suas virtudes de verdadeiro empreendedor e conhecedor da dinâmica do bom aproveitamento de fundos. Apresentaram-se ainda os mentores do projeto – apenas seis aqui presentes, pela impossibilidade de os outros seis se encontrarem já no terreno na implementação de medidas necessárias para o estabelecimento de escalões de representação nos setores de apoio.

Sem mais demoras, deu-se início à apresentação do plano que, segundo as palavras naturalmente sábias do dissertador, funcionará, em resumo, como sustentáculo e ao mesmo tempo reprodutor de pequenos nichos empresariais que incrementarão um conjunto de sinergias para o crescimento imprescindível da nossa região o do “nosso” futuro.

- Posso falar, sr.… Engenheiro?

- Evidentemente que sim, faça o favor. O nosso primeiro objetivo é precisamente o esclarecimento de todas as dúvidas. Seria impensável após larga explanação levada a cabo pelo meu colega a quem aproveito para agradecer, seria impensável, dizia eu, que os estimados convidados não sentissem necessidade de colocar questões, dúvidas e expor pontos de vista segundo os seus próprios interesses. Aliás, não poderia ser de outra forma; primeiro porque serão muitos dos presentes, talvez mesmo o senhor - não sei se reside próximo ou talvez venha de longe mostrando o seu interesse, iniciativa e, pelo que constato, capacidades -, a levarem por diante, “desculpe-me a expressão”, a rédea deste megaprojeto, sendo certo que privilegiaremos os reais interessados em trabalhar dentro de um bom espírito de equipa com qualidades humanas tão necessárias nos dias de hoje; segundo porque na génese deste nosso cometimento reside um amor profundo pela nossa região e às nossas gentes, sedentas de lideranças capazes de implementarem progresso e riqueza, evitando males como a desertificação, prestando um contributo essencial ao país, mesmo até no aspeto demográfico, problemática a que somos, desde o início, sensíveis e que se encontra plasmada, como repararão, em vários pontos da minuta que distribuiremos, cativando jovens, aproveitando a sua força natural, o seu conhecimento e cultura para, todos em conjunto, de modo ordenado e exigente, aglutinarmos saberes e aptidões através de especificidades de grupos de trabalho, contextualizados num tronco de sistematização e de orientação, capaz de projetar as nossas terras, pequenas cidades e vilas e as aldeias onde nascemos para patamares de eficiência sócio-económica ao nível do que de melhor existe nos países mais prósperos da Europa. Mais alguma dúvida?

- Desculpe sr. Engenheiro… queria só dizer uma coisinha… é que… ouvi com atenção o que disseram, umas coisas percebi, outras não percebi muito bem, mas parece-me no essencial que um projeto como este já existe, eu mesmo já faço parte dele.

- O teor da sua intervenção, que muito agradecemos, tem razão de ser e, para lhe ser sincero, estava, ou por outra, estávamos já à espera duma questão como a que apresentou. Partamos, para que consigamos bem escrutinar e compreender, de um ponto comum, penso eu, a todos quantos demonstraram pelo menos um pouco de interesse nas informações desta reunião. Como verificam, estão aqui presentes as figuras mais importantes e as autoridades proeminentes da região. Ao contrário de todos vós, não foram convidadas para os primeiros trabalhos oficiais do que julgamos ser o início do empreendimento regional da década com repercussões para o futuro que, certamente esperamos de sucesso e bons resultados individuais. Os autarcas e especialistas desta mesa prontificaram-se desde a primeira hora, exatamente a partir do momento em que tomaram conhecimento do essencial desta iniciativa de pessoas com provas dadas no que respeita às suas formações académicas e de trabalho com resultados exemplares em diferentes áreas. Deste modo, e respondendo concretamente à sua questão, não é nossa intenção, de um modo direto nem mesmo sub-repticiamente veicular análises mais ou menos negativas em relação a outros projetos, limitando-nos à concentração no que estritamente nos diz respeito. No entanto, estou em condições de peremptoriamente afirmar, com o testemunho de todos os que fazem parte desta mesa,  que a iniciativa hoje aqui apresentada possui todos os requisitos estabelecidos. Além disso, a sua abrangência vai além do esperado pelas entidades da Comunidade Europeia que reconheceram a importância e a originalidade do empreendimento desenvolvedor, suportado em bases de planeamento sustentável devidamente reconhecidas. Dele participam, melhor dito, participarão, não só as zonas mais favorecidas, mas também, na devida proporção, sub-regiões até agora botadas praticamente ao abandono, dos fundos comunitários que, diga-se de passagem, temos todos, todos nós, a obrigação de acolher na promessa de prestarmos a nossa contribuição por mais humilde que seja. O projeto tem “pernas para andar” e, como vos disse, é promissor, possuindo já uma marca reconhecida, cuja imagem e sua divulgação em sítio da internet estão já em andamento com empresa especialista da nossa absoluta confiança, destacada para o efeito.

- Mas… já possuo uma marca comum assim, sr. Engenheiro, com logotipo e tudo. Eu e um grupo alargado!

- Bem, muitas outras questões ocorrerão. Sem querermos abusar do vosso precioso tempo, aproveitaremos as próximas reuniões a realizar conforme o calendário que entregámos junto com a minuta. Aqui estaremos, brevemente, mais uma vez, em moldes de estratégia de trabalho um pouco diferentes, efetuando, como disse, reuniões de pequenos grupos, onde questões mais específicas serão certamente debatidas. Agradecemos o interesse e a vossa simpática disponibilidade.

por: A. Fernando Vilela
in:atelier.arteazul.net

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