segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Mais Algumas Lendas do Concelho de Mirandela

Lenda da Fonte de Vide
Em Vale de Telhas, concelho de Mirandela, há um lugar a que o povo chama Fonte da Vide. Dizem os mais antigos, e já o ouviam dizer aos avós e bisavós, que naquela fonte há um encanto. Um encanto que é uma menina transformada em serpente.
Dizem que duas senhoras, que vinham dos Possacos a vender leite a Vale das Telhas, ao passarem naquela fonte viram uma menina muito bonita, e puseram-se a falar com ela. E ela disse-lhes então:
– Agora vêem-me aqui como menina, mas eu estou encantada numa serpente.
Qual de vós me quer quebrar o encanto? Eu deixo-as ricas se o conseguirem. Mas não podem ter medo.
Uma das mulheres fugiu logo, dizendo que tinha medo às serpentes. A outra não. Disse-lhe que sim. Então, dali a nada, a menina apareceu transformada em serpente e pôs-se a subir pela mulher acima. Ela deixou até certo ponto, mas ao chegar-lhe ao peito, a serpente esticou a cabeça para a beijar. Nesse momento, a mulher teve tanto medo que deu um grito e a serpente caiu. A seguir desapareceu. Foi-lhe por isso dobrado o encanto.
Fonte: Inf.: Maria Inês Sousa, 42 anos; rec.: Vale de Telhas, Mirandela, 2000.


O Lavrador e a Cobra

Vivia antigamente em Vale de Telhas, concelho de Mirandela, um lavrador que costumava levantar-se muito cedo para ir trabalhar. Numa certa madrugada de Primavera levantou-se, matou o bicho, tratou dos animais, pôs o arado na carroça e meteu-se ao caminho.
Ao chegar ao Monte da Vide encontrou uma tremoncela(38) no chão. Mas como tal coisa não lhe fazia falta, continuou o caminho. Mais à frente pôs-se a pensar que, se lhe não fazia falta agora, talvez lhe fizesse jeito depois. Por isso, voltou para trás para a apanhar. Só que quando lá chegou, o que lhe parecia uma tremoncela era agora uma enorme cobra, que lhe disse:
– Já vens tarde. Tiveras aproveitado e ambos poderíamos ser felizes. Assim, dobraste-me o encanto e vais carregar esse peso o resto da vida. Serás sempre pobre.
A seguir evaporou-se. Segundo se conta, a cobra não era mais senão uma princesa moura encantada.

(38) Designativo local que equivale a timãozeira noutras zonas de Trás-os-Montes. Trata-se de uma espécie de timão rudimentar, feito em madeira, que serve para atrelar o arado ao animal.
Fonte: Inf.: Ana Batista, 68 anos; rec.: Vale de Telhas, Mirandela, 2000.


A fraga da mula

Perto da aldeia de Frechas, no concelho de Mirandela, há um local que é conhecido por "Fraga da Mula", onde muitos sempre tiveram receio de passar. Nesse local existe um poço onde se diz que está uma moura encantada.
Diziam os mais velhos que para a desencantar era preciso ir lá um dia à meia noite, sem olhar para trás e levar um copo de leite e azeitonas. A quem cumprisse estas regras aparecia-lhe uma mula encantada que previa o futuro. Mas se as não cumprisse, o chão começava a abrir-se, as fragas rebentavam e saía de lá uma mula que engolia as pessoas. Daí a dita fraga ser chamada "Fraga da Mula".

Fonte: Inf.: Lídia da Assunção Caseiro, 45 anos; rec.: Mirandela, 1999.


Lenda do Regodeiro

Diz a lenda que os mouros viveram nas proximidades do Regodeiro, no concelho de Mirandela, e que a aldeia ficou a dever-lhes o nome que tem. Conta-se que no sopé monte, ainda hoje, chamado "Cabeça dos Mouros", corria noutros tempos um regato, no qual os mouros se dedicavam à pesquisa de ouro. E por isso lhe chamaram "Rego do Ouro". Com o passar dos tempos, o povo foi dizendo "Regodouro" ou “Regodoiro”, e, por força do uso, o nome acabou por ficar Regodeiro(39).

(39) Note-se que, numa grande parte do nordeste transmontano, a pronúncia do ditongo "oi" resulta muito próxima de "ei". Ex: Em vez de "Boas Noites", diz-se algo como "Boas neites". Assim se explica o facto de a denominação "Regodoiro" se haver fixado em "Regodeiro".
Fonte: Inf.: Lídia da Assunção Caseiro, 45 anos; rec.: Mirandela, 1999.


A grade de ouro

Um dia estava um lavrador a pastorear as suas vacas perto de Vila Verdinho, concelho de Mirandela, quando lhe apareceu uma mulher desconhecida, que depois soube ser uma moura, e lhe disse:
– Tens aí duas vacas que vão ter dois bezerros. Tu vais criá-los, mas nunca tires às vacas uma pinga de leite. Daqui a um ano, quando for S. João, metes os bezerros no rio com uma grade de gradar a terra. Se assim fizeres terás a tua fortuna.
O lavrador, ao chegar a casa, contou à mulher, pedindo-lhe que fizesse como a outra lhe tinha dito.
O tempo passou, nasceram os bezerros e lá foram crescendo. Acontece que um dia a mulher do lavrador esqueceu-se do pedido do marido e foi tirar o leite às vacas.
Estava então nesta tarefa quando, de repente, se lembrou; e, com a atrapalhação, atirou com o leite por cima de um dos bezerros, que logo ficou todo malhado de branco.
Ao chegar a manhã de S. João, o lavrador fez como a moura lho havia dito: meteu os bezerros ao rio com a grade. E qual não é o seu espanto ao ver que a grade, ao ser puxada pelos animais, ia aparecendo à tona da água transformada em ouro. Só que, logo em seguida, do lado do bezerro malhado a grade começa a afundar-se.
O lavrador dizia então para os bezerros:
– Quer Deus queira, quer não queira, a grade vai p'ró cima da barreira!
É o vais. Quanto mais ele os picava mais a grade se afundava. E, dali a nada, tanto ela como os bezerros foram parar ao fundo das águas. Perdeu tudo. Ouviu-se então uma voz a dizer:
– Maldito, que me dobraste o encanto!

Fonte: Inf.: Gabriel Coelhoso Moreira, 45 anos; rec.: Vila Verdinho, Mirandela, 2001.

1 comentário:

  1. Antigamente havia o hábito das lendas. Em todas as esquinas e encruzilhadas se falava de lendas. Até às crianças se falava de lendas. Atualmente, como os antigos já faleceram os mais novos emigraram já não há ninguém para contar essas lendas e,
    ao serem ignoradas, são esquecidas. E, ainda bem. Já é tudo mais esclarecido.

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