terça-feira, 11 de julho de 2017

Salvar as sementes

mostajeiro
Tem sido grande a polémica em torno dos interesses que se movem, à escala global, pelo controlo das sementes. Há multinacionais a deterem patentes que restringem o uso da semente própria pelos agricultores. E se é certo que os protestos mais recentes levaram o Parlamento Europeu a travar a aplicação de uma lei que, pura e simplesmente, ilegalizava a troca e comercialização das sementes tradicionais pelos agricultores, também é certo que a luta não está ganha: com as patentes e outros direitos de “propriedade intelectual” nas suas mãos, as poderosas corporações podem, em qualquer momento, alegar uma “concorrência desleal” pelo uso e troca das sementes tradicionais dos agricultores e impedi-los assim de prosseguirem uma prática milenar no cultivo dos seus campos. Empenhadas em padronizar o paladar à escala global para melhor venderem os seus produtos, estão-se “nas tintas” para as realidades culturais que os seus interesses afrontam.
Nos últimos 100 anos, desapareceram mais de 90% de variedades de sementes da Terra, o que empobreceu a diversidade da alimentação humana, cada vez mais refém de variedades manipuladas visando maior rendimento. Entretanto, o país rural português possui cerca de duas mil variedades de sementes. Há que zelar pela sua salvaguarda. As sementes são parte do património cultural, histórico e alimentar de um povo. A parábola bíblica alegoriza-as como arquétipo da vida: se plantarmos hoje a boa semente, amanhã colheremos saúde, amor, abundância e paz.

Mas esta parábola conduz-nos também, de novo, às grandes ameaças que pairam sobre a sobrevivência da nossa floresta autóctone. Dada a grande extensão de áreas consumidas pelos incêndios, muitas espécies autóctones estão a desaparecer. E, para que num futuro plano de reflorestação se possam recuperar as espécies perdidas, lá voltamos à questão das sementes.
O mostajeiro, por exemplo, uma espécie outrora muito usada para madeira e artesanato e cujo fruto as populações aproveitavam para uma excelente compota, está hoje limitado a duas únicas árvores conhecidas em Portugal, diz-nos um especialista da UTAD. Por isso, há que recuperar e proteger num banco de sementes as espécies que estão em risco efetivo. 
Sem a biodiversidade ativa, estará em causa a qualidade de vida nos territórios, sendo que a qualidade das sementes é um dos importantes aspetos a ter em conta em qualquer programa de arborização. E daí que proteger os recursos genéticos e promover a arborização de espécies autóctones, seja também uma forma de proteger o futuro.


Alexandre Parafita
in:diariodetrasosmontes.com

Sem comentários:

Enviar um comentário