quinta-feira, 26 de outubro de 2017

No Distrito de Bragança há dinossauros que lutam contra a extinção e estão de volta

Em comum, têm a longevidade à frente das suas Juntas de Freguesia

Adriano Rodrigues é presidente da
Junta de Rebordãos desde 1993
Não vieram do Parque Jurássico nem são uma criação de Steven Spielberg mas no Nordeste Transmontano há, pelo menos, uma mão cheia de uma espécie de dinossauros que foi revelada no início do mês nas eleições autárquicas, a do presidente de junta veterano.
O mais antigo deles é o presidente da Junta do Romeu, que já leva 38 anos à frente desta
freguesia do concelho de Mirandela. Ininterruptamente.
Bernardino Pereira é presidente de junta desde 1979. Já ganhou onze atos eleitorais, dez dos quais com maioria absoluta e, em 2013, escapou à lei da limitação de mandatos, porque a junta do Romeu, no concelho de Mirandela, agregou-se a Avantos e formaram uma nova União de Freguesias (UF).
Nas autárquicas de 1 de outubro voltou a ser o cabeça de lista do PSD naquela união de freguesias com 411 eleitores.
Ao Mensageiro explica que a necessidade de “fazer sempre mais isto ou aquilo pelo [seu] povo”, vai sendo o antídoto para continuar a candidatar-se a gerir os destinos da junta, agora união de freguesias.
“Não estou agarrado ao poder, simplesmente sinto que ainda tenho todas as condições para ajudar a população e não me têm agradado os candidatos que vão aparecendo”, adianta.
Agora com 62 anos de idade, o empreiteiro recorda os primeiros tempos na junta, quando tinha apenas 24 anos.
“Era tudo mais difícil, a câmara não tinha tanto dinheiro para obras. Na altura, o Romeu não tinha nada, nem sequer arruamentos era tudo em terra batida, não tinha água, nem saneamento”, recorda.
Bernardino Pereira (a tomar posse)
é presidente do Romeu desde 1979
Bernardino Pereira lembra o trabalho árduo que foi necessário fazer para que fosse possível ter água canalizada. “Tive de utilizar as minhas máquinas e socorrer-me da ajuda do povo. Foi mesmo a obra que me deu mais gozo, andei num poço, seis a oito horas diárias, durante 16 dias, a fazer rebentamentos com explosivos”, lembra.
O autarca social-democrata não tem dúvidas da importância que as juntas ainda têm no relacionamento de proximidade com a população cada vez mais envelhecida. “Por exemplo.
Não há um serviço de transportes públicos, a não ser os táxis e os nossos idosos precisam de se deslocar com alguma frequência a Mirandela ou a Macedo e nós temos uma carrinha de nove lugares, que, duas vezes por semana, as leva ao médico, à farmácia e até fazer as compras para casa”, acrescenta.
No entanto, garante que o vencimento de presidente de junta não dá para as despesas.
“Ganha-se cerca de 270 euros, que praticamente não dá para pagar o gasóleo para as deslocações que temos de fazer.
Não tenho telefone da junta, sempre fiz os telefonemas pelo meu telemóvel”, diz este ‘dinossauro’ do Romeu.
Antes de abandonar, Bernardino Pereira confessa que gostaria ainda de ter tempo para construir um polidesportivo e um loteamento para construção a preços acessíveis.
“Era importante cativar mais pessoas para viver no Romeu, porque atualmente há muita gente a fugir para as grandes cidades”, lamenta.
Bernardino tem mais quatro anos e ainda não sabe se volta a candidatar-se em 2021.
“Logo se vê, porque também já não sou novo”, conclui. 
Já em Vinhais há outro caso de longevidade autárquica. De seu nome, Franclim do Nascimento, o homem que não para de dar música aos eleitores, em Ervedosa.
“Já fui Presidente da Mesa da Assembleia, já fui secretário, já fui presidente”, conta, na sua loja de música, com quem tem de dividir o tempo de autarca. Aos 63 anos, não se pode dar ao luxo de deixar o seu posto de trabalho, apesar de convites “não faltarem”, até para mais altos voos.
“Entrei para a Junta, pela primeira vez, como presidente, em 1997. Tinha estado antes como secretário mas tive divergências com o presidente e, nesse ano, fui o único da equipa a sair. Concorri pelo PS e ganhei”, recorda Franclim do Nascimento.
Diz que aquilo que o move “são os investimentos que podemos fazer na nossa terra”.
“Na altura achava que tinha competência para fazer alguma coisa pela freguesia.
Quando chegámos à Junta, nem sequer uma calculadora havia”, lembra. De então para cá, foram “muitas as coisas bonitas” que se fizeram. “Agora temos um pavilhão multiusos que é usado por toda a região, colaborámos para a construção do lar e a sua ampliação, fizemos investimentos na floresta e agora estamos a receber um rendimento bem interessante”, explica. Ao serviço da população está ainda um serviço de farmácia, CTT e uma empresa de inserção.
Há quatro anos, fruto da limitação de mandatos, passou a secretário mas, agora, voltou a encabeçar a lista. “Falta a parte de lazer. Queremos concluir a praia fluvial do Tuela”, refere, como grande projeto do mandato.
Em situação parecida está Fernando Brás, atual presidente de Santa Comba da Vilariça.
Em 1989 foi cabeça de lista e perdeu. Negociou com o vencedor e entrou para o executivo como secretário. Em 1997, avançou outra vez e, desta, ganhou mesmo. Saiu pela limitação de mandatos há quatro anos mas como o então presidente foi trabalhar para
Santarém, voltou a ser desafiado.
“Isto é um processo dinâmico. Falta sempre alguma coisa por fazer”, frisa Fernando Brás. Depois de ter feito um largo junto à igreja e outro junto aos cafés, que permitiu a instalação de esplanadas, conta, agora, poder avançar para uma obra que considera fundamental para a freguesia: um loteamento.
“Os jovens que queiram fazer casa já não precisam de sair daqui”, aponta. “Agora temos condições para isso”, acredita, pelo menos com mais convicção do que na ideia de voltar a fazer três mandatos. “Três?
É muito difícil. Vamos ver como corre este”, prefere dizer o presidente de uma freguesia com cerca de 400 habitantes, no concelho de Vila Flor, que viu o IP2 e, sobretudo, o IC5, abrir-lhe as portas do mundo. “Foi fundamental para a agricultura pois permitiu trocas comerciais com concelhos perto mas cuja deslocação demorava tanto como
ir ao Porto, como os do Planalto Mirandês”, sublinha.
Ora, precisamente a cidade de Miranda viu regressar, aos 75 anos, Abílio Barril. Foi presidente da junta durante 12 anos, três mandatos, então “desafiado por Manuel Rodrigo”. Há oito, deixou a Junta, tal como o amigo fez com a Câmara. Este ano, foi Rodrigo que o desafiou outra vez. Mas enquanto Manuel Rodrigo perdeu a autarquia, Abílio Barril ganhou a Junta e um novo problema, de convivência com o presidente da autarquia. “Vai ser bonito trabalhar com uma Câmara com a qual não nos damos. Não vai ser fácil”, acredita. Mas já deitou mãos à obra. “Quero concluir o saneamento de Vale d’Águia, que ficou por terminar.
Aliás, encontrei tudo como deixei há oito anos, não se fez mais nada”, acusa, em jeito de lamento.
Abílio Barril diz que aquilo que o move “é o contacto com as pessoas”.
É também pelas pessoas que Adriano Rodrigues mantém uma invejável longevidade na freguesia de Rebordãos, às portas de Bragança. Nem no anterior mandato, há quatro anos, deixou a prática das funções, apesar da imposição teórica após cinco mandatos consecutivos, sempre pelo PSD. “Nos últimos quatro anos era secretário mas assumi todas as funções de presidente.
De tal forma que ele [o presidente] até me dava o salário.
Ainda ficou aqui na gaveta quatro ou cinco meses”, conta, num gabinete que sempre foi o seu.
A aventura começou em 1989.
“Quando o Dr. Mina concorreu pelo PS, andaram muito tempo a chatear-me. Lá decidi avançar mas começaram uns boatos de que, afinal, o candidato era outro (o presidente de então). Reuni com eles e percebi que já não me queriam a mim. Então primeiro convencem-me e depois escolhem outro? Fiquei chateado e disse-lhes logo que haveriam de perder a Junta. Foi o que aconteceu. Passados quatro anos, fiz uma lista contra eles e ganhei”, conta, orgulhoso.
De então para cá, o nome de Adriano Rodrigues confunde-se com o da freguesia de Rebordãos. O PS ainda o tentou recuperar. “Tentaram-me com quatro mil contos, na altura, e 20 camiões de paralelos mas não cedi”, frisa.
O trabalho, esse, foi sendo feito. Dono de uma vontade férrea e de um coração mole, orgulha-se da ajuda que deu a várias famílias de etnia cigana a saírem “da miséria em que viviam”. “Fui lá e vi meia dúzia de crianças deitadas com a mãe no meio das palhas, ao pé dos animais. Ainda hoje não consigo falar disso”, recorda, emocionado.
Agora, já com essas crianças adultas e a criarem a sua própria família, ambiciona construir
um bairro social na aldeia da Sarzeda. “São mais 40 ou 50 pessoas que se fixam aqui”, nota.
Franclim do Nascimento reparte o tempo
entre Ervedosa e a sua loja de música
Mas o grande projeto que tem em mente é outro e está apontado para a serra da Nogueira,
sobranceira à freguesia.
“Uma barragem com oito hectares de bacia”, que pode ajudar no combate aos incêndios no verão mas, sobretudo, apoiar um projeto de regadio de 800 hectares que pretende estimular a produção de castanhas.
“E até dá para o abastecimento da cidade”, sublinha.
O investimento ronda os “seis milhões de euros” e esse é que é o problema. Mas Adriano Rodrigues lembra que “custa um bocado menos do que aquilo que foi enterrado no BES ou no BPN”. “Ficamos com 20 ou 30 milhões de litros de água disponíveis”, explica.
Mas esse projeto “é um sonho”. Pragmaticamente, a grande obra planeada é o asfaltamento da estrada que liga a aldeia à estrada da Sra. da Serra, atualmente em terra batida, e que passa pelo castelo medieval que ali existe.
Mas por entre o orgulho de toda a obra feita não esconde a mágoa de não ter conseguido levar por diante o parque eólico da Serra da Nogueira.
“Podia ter-nos garantido um rendimento mensal de 15 mil euros. E a própria Câmara também ganhava mas não estavam criadas as condições de transporte da eletricidade”, lamenta.
Quando começou, em 1993, esperava ficar apenas quatro anos. Já lá vão 24. “Ao fim de sete mandatos, não tivemos oposição. É sinal que as pessoas gostam do nosso trabalho”, aponta Adriano Rodrigues, de sorriso aberto.
Afinal, ele é apenas um dos muitos presidentes da freguesia.
“Ainda vive o antigo presidente da Junta. Mas o presidente do Académico é daqui, o presidente do GDB é daqui, o do aeroclube… temos uns 15”, brinca. Mais a sério, não quer fazer futurologia. “Mais três mandatos? Vamos ver como corre este…” Palavra de dinossauro.

António G. Rodrigues
Fernando Pires
in:mdb.pt

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