quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Aldeia bordada de xisto

Chelas, Mirandela – "Aldeia bordada de xisto"
Igreja Matriz de Chelas, Mirandela
«Aldeia bordada de xisto» foi o epíteto dado pelo Cónego Silvério Pires, pároco de Chelas, do concelho de Mirandela, por ter no casario antigo e arruinado como material mural o belo e nobre xisto. Todo o arciprestado de Mirandela mostrou desinteresse em ficar com o pároco de Chelas. Há valores que vão para além do somatório das «côngaras» dos paroquianos e talvez o Cónego Silvério tenha querido dar esta sábia lição aos demais padres.
Apesar de ser uma pequena aldeia, outrora sede de freguesia e famosa pelas «barbas» e pelas «Barcas de Chelas» por onde, até final do século XIX, se escoavam muitos dos produtos agrícolas e pecuários, de toda a lombada ou corda que se estende até ao extremo das Terras de Lomba. Apesar de pequena, a Igreja matriz, dedicada a Sta. M.ª Madalena, edificada no sentido poente-nascente, uma linha imaginária a passar pelo meio da porta principal/campanário e do altar-mor divide-a em duas partes: as Eiras a Norte da Igreja (Nova) e o Carrascal a Sul. Carrascal tem como sinónimo sardoal ou azinhal. Os moradores das Eiras julgavam-se mais importantes do que os do Carrascal. O Carrascal tinha mais operários e um só casal (a Casa Lima ou Casal dos Limas) importante.
Nas Eiras havia os casais: Casal do João Vaz (herdado pela esposa), o Casal da D.ª Elisa (de Vassal-Valpaços), o Casal dos Sarmentos e o Casal do Capitão Ilídio Esteves. Na minha infância eram frequentes as brigas colectivas entre a garotada, bem como os desafios de futebol entre adultos ou entre crianças, os das Eiras contra os do Carrascal. E anunciava-se com pompa, como se fosse a fronteira entre duas nações: - Atenção, muita atenção!// Vai-se realizar um desafio internacional,// são «os das Eiras»,// contra «os do Carrascal»! Eram jogos de futebol renhidos como se fossem duas selecções de dois países rivais. Ninguém queria perder. Quando jogava o rapazio, às vezes, havia uma batalha campal à pedrada, em que o campo de morte era o Terreiro da Pôça.
A toponímia é implacável no campo da verdade ou da realidade. No Terreiro da Pôça, havia uma pôça de água, quase no seu extremo Noroeste, que eu vi com os meus olhos, quando o empedrado das ruas era a palha centêa que ali curtia, no Outono e Inverno, para se transformar em estrume. Cada lavrador deitava a palha na sua rua. Quando curtida era levada para a estrumeira em que se iam colocando camadas sucessivas de palha curtida e de estrume das loijes ou do curral. Nas estrumeiras, de forma rectangular, nasciam na primavera frágeis cogumelos ou fungos a que se chamava mijacões.

(Nota escrita com base no livro «Mirandela Outros Falares», pág. 33 e 118)

Jorge Lage
in:atelier.arteazul.net

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