segunda-feira, 14 de outubro de 2019

A HISTÓRIA DA FERA

Era uma vez um homem que ia por um caminho fora e encontrou um homem morto, naquele sítio, estava um galgo, um leão, um corvo e uma formiga para dividirem entre eles, em partes iguais, o homem morto. Ao verem chegar aquele homem diz o leão para o galgo:
- Olha, vem ali um homem, vamos chamá-lo para que nos parta este homem e ficarmos todos contentes.
O homem partiu o morto dividindo-o pela bicharada, dando a cabeça à formiga e dizendo:
- Pega, tens ai muito que comer e casa para viver!
Ao corvo deu-lhe as tripas, ao galgo deu-lhe os quartos e ao leão deu-lhe o lombo.
No final, ficaram todos contentes com a sua parte, ao que o homem resolve perguntar:
- Então ficaram todos contentes?
Respondendo o leão:
- Ficamos! Podemos ir embora?
O homem respondeu que sim e foi-se embora, quando já ia um bocado longe, diz o leão para o galgo:
- Então, o homem esteve aqui com tanto trabalho a dividir a carne por entre nós e não lhe pagamos nada?! Tu galgo vais dar uma corrida para o homem voltar cá.
O galgo foi chamar o homem que voltou para trás, dizendo-lhe o leão:
- Então, estiveste aqui com tanto trabalho e não te pagamos nada?
O homem responde:
- Vós não tendes nada que me pagar!
- Temos sim, tens aí uma caixinha?
O homem respondeu que sim, o leão puxou de um cabelo e deu-o ao homem dizendo-lhe que quando se sentisse aflito para puxar por ele dizendo: “valha-me aqui o rei dos leões”, transformando-se, assim, em leão.
O galgo fez o mesmo e disse ao homem:
- Pega lá este pêlo, quando vires alguma coisa que te agrade e que te fuja, puxas pelo pêlo e dizes: “valha-me o rei dos galgos”, transformando-te em galgo e apanhando tudo.
O corvo arrancou uma pena sua dando-a ao homem:
- Pega lá esta pena, quando quiseres agarrar alguma ave puxas pela pena e dizes: “valha-me o rei dos corvos e transformas-te no rei dos corvos, apanhando o que tu quiseres.
A formiga coitadinha teve de arrancar um corninho e dá-lo ao homem:
- Toma lá este corninho quando quiseres fugir de alguém, puxas por este corninho e dizes: “valha-me a rainha das formigas” e transformas-te em formiga, podendo esconderes-te num buraquinho.
O homem transformou-se em tudo o que lhe disseram e lá continuou todo contente, chegou a um alto onde andavam dois irmãos a baterem-se, ao ver aquilo disse:
- Andais aqui a bater-vos porquê?
- É por causa destas botas.
- Então por causa destas botas é preciso baterem-se?!
- Oh! Senhor, estas botas têm muito valor, são mágicas, levam-nos onde nós quisermos.
Então, o homem explica-lhes:
- Eu tenho aqui esta bola, quando a atiro pela ladeira abaixo, o primeiro que a apanhar fica com as botas.
Os irmãos concordaram com a proposta, enquanto foram os dois atrás da bola o homem calçou as botas e disse:
- Botas, quero ir para aquele sítio.
As botas obedeceram e lá o levaram, o homem ficou, assim, muito feliz pelos novos poderes. O homem foi à pesca e apareceu-lhe o rei dos peixes que o agarrou levando-o ao fundo do mar. Na casa do rei dos peixes o homem abriu a porta de um quarto e saiu de lá uma mulher, com a qual esteve a conversar muito, e nisto ela diz-lhe:
- Nós nunca vamos sair daqui, porque para sairmos temos que matar uma fera que há numa serra perto da cidade de Berlim, mas não há ninguém que a consiga matar, porque ela é muito grande e come tudo. Depois de a matar sai de dentro da fera uma lebre a fugir e é preciso correr muito para a apanhar, de dentro da lebre sai, também, uma pomba a voar precisando-se apanhar a pomba e tirar-lhe um ovo que lá tem, depois é preciso trazer o ovo para a matar o rei dos peixes e só depois é que podemos sair daqui. Diz o homem para a mulher:
- Pois custe o que custar tenho que arranjar esse ovo.
O homem pediu um mês de licença ao rei dos peixes para o deixar ir à cidade. O rei dos peixes deixou-o sair, mas disse-lhe que tinha só esses dias, tendo que estar lá nessa data para voltar para o fundo do mar.
O rapaz foi logo para a cidade de Berlim, ao chegar lá encontrou uma casa para servir que era de um príncipe, falou com este e ajustou-se para andar lá com o gado.
No entanto, o patrão disse-lhe para não ir para a serra com o gado, pois havia lá uma fera que o comia a ele e ao gado. Mas o rapaz não quis saber e foi logo direitinho a ter com o gado, entrou para a cerca enquanto o gado comia ele foi para a entrada do buraco a chamar pela fera:
- Ó fera anda cá para fora que eu quero lutar contigo. Valha-me aqui o rei dos leões.
Lutaram, lutaram, até que cada um caiu para o seu lado até que se cansaram e cada um caiu para o seu lado de cansaço.
A fera ia a entrar para o seu buraco dizendo para o leão:
- Se eu tivesse aqui um bocado de pão matava-te a ti e ao rei leão.
Respondendo o rei leão:
- Se eu tivesse aqui um beijo de uma donzela, um copo de aguardente e uma bola quente matava-te a ti serpente.
A filha do príncipe para o outro dia foi atrás dele a espreitá-lo para ver onde ele ia, quando viu entrar o gado ela foi logo para os portões e viu o rapaz a transformar-se num leão, estando a ver lutar os dois até ao fim, ouvindo depois dizer à fera:
- Se eu tivesse aqui um bocado de pão matava-te a ti e ao rei leão.
Respondendo de seguida o leão:
- Se eu tivesse aqui um beijo de uma donzela, um copo de aguardente e uma bola quente matava-te a ti serpente.
A rapariga ouviu isso tudo quando nisto viu o rapaz a transformar-se outra vez na pessoa, seguindo para casa.
Pela noite fora a rapariga levantou-se e foi cozer a bola, de manhã o rapaz tinha uma bola quente, um beijo de aguardente e o beijo dava-lho ela.
O rapaz voltou a levar o gado direitinho à cerca, a rapariga foi atrás dele com a aguardente, a bola e o beijo para lhe dar. Quando o leão estava a lutar com a fera a rapariga aproximou-se do rapaz quando os viu tombar cada um para seu lado dando o que trazia consigo ao leão, ao recuperar as forças o leão dirigiu-se logo à fera para a matar.
Depois ele e a rapariga abriram a fera saindo de lá uma lebre, ao ver isto o rapaz puxou do pêlo que o galgo lhe tinha dado e disse:
- Valha-me o rei dos galgos.
Ele transformou-se num galgo apanhando de seguida a lebre, de dentro desta saiu uma pomba a voar e ele puxou da pena do corvo e disse:
- Valha-me aqui o rei dos corvos.
E logo apanhou a pomba, mas de dentro dela ainda retirou um ovo, dirigindo-se depois os dois para casa contando o que se tinha passado ao príncipe, mas este não queria acreditar na história. O príncipe queria que o rapaz casasse com a sua filha, mas este negou visto ter de voltar para casa do rei dos peixes.
O rapaz, quando voltou para o fundo do mar, contou à rapariga tudo o que lhe tinha acontecido até então e os poderes que tinha arrecadado, foi aí que a rapariga teve
uma ideia:
- Então amanhã quando o rei dos peixes vier falar comigo ele fica de pé à minha frente, enquanto tu te transformas em formiga e sobes por mim até ao peito dando-me o ovo para a mão que eu dou-lho com ele na testa para o matar.
No outro dia o rei dos peixes foi a falar com a rapariga e esta deu-lhe com o ovo na testa como combinado, fazendo com que o rei dos peixes morresse.
O rapaz e a rapariga foram libertados, querendo esta agora casar com ele, mas o rapaz tinha outros planos, casando-se sim, mas com a filha do príncipe.

RECOLHA 2005 SCMB, CASIMIRO PARENTE, Idade: 66.
Localização geográfica: PAÇO DAS MÓS – ORIGEM + 60 anos.

FICHA TÉCNICA:
Título: CANCIONEIRO TRANSMONTANO 2005
Autor do projecto: CHRYS CHRYSTELLO
Fotografia e design: LUÍS CANOTILHO
Pintura: HELENA CANOTILHO (capa e início dos capítulos)
Edição: SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DE BRAGANÇA
Recolha de textos 2005: EDUARDO ALVES E SANDRA ROCHA
Recolha de textos 1985: BELARMINO AUGUSTO AFONSO
Na edição de 1985: ilustrações de José Amaro
Edição de 1985: DELEGAÇÃO DA JUNTA CENTRAL DAS CASAS DO POVO DE
BRAGANÇA, ELEUTÉRIO ALVES e NARCISO GOMES
Transcrição musical 1985: ALBERTO ANÍBAL FERREIRA
Iimpressão e acabamento: ROCHA ARTES GRÁFICAS, V. N. GAIA

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