quarta-feira, 4 de novembro de 2020

A aldeia em Arganil que quer regressar à Natureza para salvar o planeta

Numa freguesia de Arganil, há hoje mais crianças do que há 30 anos. A maioria já nasceu em Portugal, filhos dos estrangeiros que repovoaram aldeias entretanto desertificadas. Mas cresce...


Das estradas íngremes avistam-se montanhas e vales, a serra queimada pelo fogo. Mas lá em baixo, nas encostas, há a vida toda. O caminho para Benfeita, a freguesia do concelho de Arganil envolta pela serra do Açor, parece serpenteado por casas de xisto. Foi como se tivesse renascido duas vezes nas últimas duas décadas: primeiro quando começaram a chegar os estrangeiros que a repovoaram, depois quando se ergueu, de novo, das chamas e das cinzas do grande incêndio de outubro de 2017.

Estima-se que vivam mais de mil novos habitantes nos vários concelhos da região, que se estende pelos distritos de Coimbra e Viseu. Estão por toda a parte, nas serras do Açor e da Estrela, reconstruíram casas em ruínas nos lugares que há décadas ficaram desertos por toda a Beira Baixa. Voltaram a trabalhar a terra, plantam e colhem a maior parte dos alimentos que consomem, criam ovelhas. Adotaram quase todos a permacultura, o sistema de "cultura permanente" que torna a vida sustentável. Paradoxalmente, garantem o futuro como nos tempos passados.

“Estamos a trabalhar no sentido de recriar o nível de autossuficiência que estas aldeias tinham há apenas uma ou duas gerações”, diz a escocesa Wendy Howard.© Maria João Gala/Global Imagens

"Não se trata de voltar a uma vida dura de pobreza extrema, mas a uma vida de abundância dentro dos limites naturais, onde o desejo de adquirir cada vez mais desaparece. Temos um caminho a percorrer antes de chegarmos a esse ponto - especialmente quando consideramos a destruição causada pelos incêndios - mas temos uma visão e um plano." Wendy Howard é escocesa, tem 62 anos, é respeitada na comunidade e descreve assim esta forma de vida. Fala no caminho de terra batida que nos leva até à casa que construiu, numa encosta ao cimo da vila, no meio da floresta. Foi ali que recolheu toda a lenha que vai pondo no fogão da cozinha, onde nasceram as compotas e os chás alinhados nas prateleiras em frascos de vidro. São dezenas de variedades que lhe adoçam os invernos. Cheira a maçãs e dióspiros, que acabou de colher. Plantou as primeiras macieiras quando ali chegou, há mais de dez anos, numa decisão "que ponderei bastante e tomei de forma consciente. Aqui, no centro de Portugal, o solo é mais fértil, retém melhor a água e os nutrientes".

O voluntariado que vem de fora
De resto, Wendy sempre gostou de montanhas. "Sinto-me em casa e gosto das pessoas que vivem nas montanhas. São praticamente iguais em todo o mundo: esforçadas, trabalhadoras, respeitadora e justas. E era disso que eu vinha à procura." Trazia com ela os filhos (agora com 22 e 30 anos, entretanto regressados à Escócia) e "procurava um sítio onde pudéssemos plantar a nossa própria comida, onde nos sentíssemos minimamente seguros, porque a situação no Reino Unido já ameaçava tornar-se muito complicada: hoje não há um pedaço pequeno de terra que consigas comprar para plantares, tudo se transformou em enormes produções agrícolas, em quintas gigantes, por isso este tipo de vida não é possível lá. Só se tiveres muita sorte e muito dinheiro para o fazer. E eu não tinha muito dinheiro, mas tinha o suficiente para vir para aqui".

Licenciada em Biologia, Wendy foi designer gráfica, o que, de certa forma, explica a minúcia nos pormenores daquela casa de xisto e madeira, destruída pelas chamas em 2017 e agora já reconstruída. O fogo atingiu a todos naquele 15 de outubro, muitos perderam tudo, a maioria já reergueu as casas e a vida.

"Sinto-me em casa e gosto das pessoas que vivem nas montanhas. São praticamente iguais em todo o mundo: esforçadas, trabalhadoras, respeitadora e justas. E era disso que eu vinha à procura", diz a escocesa Wendy Howard, que vive na Benfeita há mais de dez anos.

Se nos invernos a companhia se queda pelos sete gatos e um cão (que vai com ela para todo o lado), no verão Wendy tem sempre gente em casa. "Recebo a visita de pessoas que vêm de todos os cantos do mundo para aprenderem e trabalharem comigo. Eu gostava muito de viajar, mas agora já não preciso, o mundo vem ter comigo", brinca. Dos sete que recebeu no último verão - voluntários para o campo e para a floresta em troca de alojamento -, cinco ficaram a viver na região. Aliás, o voluntariado é uma prática por ali. Não apenas no verão, por parte de quem vem de fora, mas também dos estrangeiros que vivem naquelas aldeias.

"Pouco tempo depois de cá chegar criei um website", diz Wendy. "Inicialmente mais para a minha família no Reino Unido, para verem o que eu andava a fazer, mas entretanto outras pessoas começaram a encontrá-lo. Foi assim que tudo começou. No ano passado comecei a dar cursos de Permacultura e agora vejo esse projeto a crescer." A escocesa não acredita em comunidades intencionais para a sustentabilidade, como as que vivem "isoladas, fora do resto da sociedade. Muitas delas dependem de fundadores carismáticos para a inspiração e a tomada de decisões. Outras têm um foco mais espiritual/ideológico do que prático - para mim são mais como mosteiros modernos. O que estamos a construir aqui é mais prático e realista. Estamos a trabalhar no sentido de recriar o nível de autossuficiência que estas aldeias montanhosas tinham há apenas uma ou duas gerações. A ideia não é apenas ser sustentável, mas regenerativo do ambiente, da comunidade e da economia local."

"As nossas organizações governamentais tornaram-se tão grandes que não podem tomar decisões contextualizadas e apropriadas para as suas diversas comunidades", sublinha Wendy. No fundo, o que quer dizer é que a regionalização seria o melhor que poderia acontecer ao interior, no sentido de aproximar os centros de decisão das comunidades. "Decisões à distância tornam-se divorciadas de pessoas reais e são facilmente influenciadas por outros interesses", acrescenta. Ela, que acredita num futuro feito de "organização biorregional", sustenta essa tese na relocalização das economias e das redes de distribuição, onde a economia "não se baseie no crescimento, mas na manutenção de uma circulação saudável de recursos, para que todos tenham o que precisam para uma vida feliz e saudável, sem explorar e destruir o nosso ambiente. Isso é criar resiliência e flexibilidade na comunidade com um senso de responsabilidade e autonomia. Esta visão garante também que a riqueza e o poder não se podem concentrar nas mãos de tão poucos", frisa.

"A comunidade criou uma moeda - estrela - que usa para comercializar produtos entre todos, nos mercados, depois de registados numa página da internet criada para o efeito. "Fixamos o preço de cada coisa e depois usamos créditos."

Foi nessa linha de pensamento e ação que, depois dos incêndios, um grupo de moradores da Benfeita (maioritariamente estrangeiros) bateu à porta da da Câmara Municipal de Arganil. "Fomos muito bem recebidos, mas depois de muita pesquisa e aconselhamento a câmara não conseguiu encontrar uma forma de criar a tal entidade dentro da atual estrutura administrativa."

Foi assim que nasceu a ideia de tornar Benfeita uma ecofreguesia. "A comunidade imigrante trabalhou com a junta de freguesia e fomos bem-sucedidos. Benfeita é a primeira freguesia do concelho de Arganil a obter esta designação. Na realidade, é apenas um crachá, mas estabelece a intenção e a capacidade de trabalhar como comunidade para atingir um objetivo", diz Wendy. E foi assim que acabou por nascer a ideia de formar uma associação "para agir como uma organização de cúpula para projetos regenerativos que a comunidade cria na área. Apesar de ainda não estar concluído o processo legal e administrativo, deverá chamar-se ARBOR - Associação da Região de Benfeita para Objetivos Regenerativos. Nesta altura, Wendy e um grupo de amigos e vizinhos estão a reunir vários membros fundadores, que representem todos os segmentos da comunidade e que tenham experiência em áreas diversas: biólogos, ecologistas, administradores, angariadores de fundos.

Saudável e feliz
Elsa, uma holandesa de 34 anos, guia-nos até ao centro comunitário a que chamam de "escola". Mudou-se há três anos para Benfeita, já fez voluntariado no lar de idosos algumas vezes. Foi quando descobriu como gostava de trabalhar com a terceira idade. "Mas os salários são muito baixos, é um dos problemas", diz a antiga professora de Geografia.

Duas gerações: Alice Ventura, 73 anos (esq.), e Elsa Leeft, uma holandesa de 34.© Maria João Gala/Global Imagens

Para ganharem dinheiro, muitos estrangeiros fazem temporadas nos países de origem, precisamente a tomar conta de idosos. Quando chegamos a casa de Laura Williams, no Sardal, tem a mala quase pronta para rumar a Londres por quatro semanas e acompanhar uma idosa. Saudável e feliz

Laura tem 44 anos, chegou à Benfeita há menos de dez, como voluntária na Quinta da Mizarela (projeto Vida Desperta, uma comunidade espiritual, também dedicada a permacultura). "Na altura pesquisei na internet por uma vida diferente. Queria viver perto da natureza." De Portugal sabia muito pouco, só aquilo que os pais lhe contaram da lua-de-mel que passaram na região de Espinho, há muitos anos.

Em Inglaterra foi ativista ambiental, ecologista, com formação de base em ornitologia - o ramo da biologia que se dedica ao estudo das aves. Depois de se mudar para Portugal, viveu cinco anos na quinta, até que um dia encontrou umas ruínas na floresta. Conseguiu saber quem era proprietário e comprou os dois hectares de terreno por 19 mil euros. Na altura, era ela e o marido - que acabou por regressar à Áustria depois do fogo de 2017, traumatizado com aquilo que Laura descreve como "um pesadelo" - deitaram mãos à obra. "Só o revestimento de xisto é que foi feito por uma empresa. O resto fomos nós. Tudo o que é de madeira fizemos por nós, e a madeira era daqui mesmo, da floresta."

As mãos de Laura são calejadas. Nos últimos tempos ela e os amigos cortaram muitas das árvores que apodrecem agora nas encostas, depois de carbonizadas pelo fogo daquele outubro negro. Ali, no Sardal, mora também o irmão, David, que acabou por render-se a Portugal e à serra do Açor. "Tornei-me muito saudável e muito feliz", diz. A irmã conclui: "Ele via-me tão bem que um dia veio morar para cá." De vez em quando recebem a visita dos pais, embora o casal britânico não se adapte completamente àquele modo de vida, mesmo que em férias. "Como a casa de banho é seca [os dejetos são usados para compostagem], a minha mãe tem alguma relutância em ficar aqui. Não está habituada."

Estrela, a moeda de Benfeita
Por maior que seja a vontade de cultivar a terra, é preciso perceber o que ela pode dar, em cada lugar. Ali é difícil cultivar batatas, cenouras e outros hortícolas, mas é sempre a troca de produtos que norteia este modo de vida. "Tenho castanhas, tenho bolotas, posso trocar com outros, por outras coisas."

Laura (a cozinhar num forno solar) tem 44 anos e chegou à Benfeita há menos de dez, como voluntária na Quinta da Mizarela. “Na altura pesquisei na internet por uma vida diferente. Queria viver perto da natureza.”
© Maria João Gala/Global Imagens

"Elsa, como se chama a moeda que usamos aqui?", pergunta Laura à amiga holandesa que aproveitou a nossa boleia para uma visita. "Euros?!", responde Elsa. É uma risada sonora. Não é disso que se trata, afinal. Com o passar do tempo, a comunidade acabou por criar uma moeda - estrela - que usam para comercializar produtos entre todos, nos mercados, depois de registados numa página da internet criada para o efeito, entre eles. "Fixamos o preço de cada coisa e depois usamos créditos", conta Laura.

Todos os dias levanta-se cedo para meditar, entre as sete e as oito da manhã, faz exercício. "É muito importante." Depois responde aos e-mails, passa muito tempo ao computador. Continua uma ativista, agora na luta contra a exploração de lítio na serra da Estrela. Neste outono plantou quatro hectares de floresta, entre os lugares de Sardal e Pardieiros. Por esta altura alguém lhe toma conta da casa, em Portugal, enquanto ganha dinheiro em Inglaterra.

Voltaram a trabalhar a terra, plantam e colhem a maior parte dos alimentos que consomem, criam ovelhas. Tentam garantir o futuro como nos tempos passados.

Bárbara Sá faz parte do grupo de portugueses que se misturam com todas as outras nacionalidades nas encostas e vales. Ela, natural de Braga, e o companheiro, Miguel, natural de Viseu, decidiram há dez anos ir à procura de "um cantinho no mundo, no meio da natureza, que pudéssemos tratar e cuidar". Trabalharam no estrangeiro, juntaram dinheiro e compraram um vale no lugar de Luadas, na serra do Açor. "Apaixonámo-nos pelo ar silvestre deste lugar", diz enquanto uma dúzia de crianças almoçam no Centro Comunitário Folha Verde. Na vila, chamam-lhe escola, embora não o seja.

Também lá está a pequena Olívia, filha do casal, que já nasceu na freguesia de Benfeita. E Bárbara contribui voluntariamente (como todos os outros) para a atividade do centro comunitário. É licenciada em Filosofia e Serviço Social, aos sábados ensina português a adultos estrangeiros. O marido é professor de artes marciais e dá aulas nas localidades vizinhas.


"Quando aqui cheguei, a ideia era viver sozinha com o Miguel, no meio da montanha. Rapidamente percebemos que havia outras pessoas, algumas da nossa idade e com as mesmas ideias. E gostei de me sentir abraçada", conta Bárbara, habituada que estava a ser "sempre questionada e contrariada". Não foi fácil para a família de ambos perceber aquela opção. Com o tempo, Bárbara acredita que uns e outros se vão habituar à ideia. "Quem quer realmente que eu seja feliz vai ter de aceitar que a minha maneira de ser feliz é esta. O amor também é isso."

“A ideia não é apenas ser sustentável, mas regenerativo do ambiente, da comunidade e da economia local.” As 35 crianças entre os 3 e os 12 anos que frequentam o centro comunitário estão em ensino doméstico. O projeto começou antes do incêndio de 2017.© Maria João Gala/Global Imagens

As crianças que frequentam o centro comunitário Folha Verde estão todas em ensino doméstico. Atualmente são 35, entre os 3 e os 12 anos. O projeto começou antes do fogo de 2017, que consumiu as instalações. O Folha Verde acabaria por ficar suspenso um ano, mudando-se para o vale da Lomba do Pousio em outubro de 2018.

E o que fazem as crianças ao longo de todo o dia? "Brincam muito, que é essencial. Aprendem muito sobre as relações, com os outros, consigo próprias - sobre as suas emoções - e a relação com a natureza. Porque tudo se resume a isso: olhares para ti, para o outro e para a terra que te rodeia", conclui Bárbara.

Renascer das cinzas
Na Folha Verde o dia começa pelas 09.30, altura em que se define quais os pais que vão ajudar naquele dia e se fazem turnos de atividade. Cá fora encontramos Adrian Jennings, um dos pais envolvidos no projeto, que cedeu parte do espaço físico. Era um antigo lagar de azeite em ruínas quando o comprou. Carpinteiro de profissão, o inglês de 59 anos foi ajudando a moldar o centro.

O inglês Adrian Jennings cedeu parte do seu terreno para o espaço educativo Folha Verde.
© Maria João Gala/Global Imagens

Juntaram-se vontades e meios, através de um crowdfunding, e assim apareceram os materiais para a cozinha, a sala de refeições, e até uma pequena biblioteca. "A única condição para fazer parte do projeto é os pais terem disponibilidade e energia para o integrar. Não é chegar aqui e deixar as crianças, porque isto não é um jardim de infância nem uma escola."

Cá fora, perto de 20 crianças brincam, saltam num trampolim ou andam de balouço, mas sobretudo mexem na terra. Algumas andam descalças, alheias ao frio de dezembro. Todas sabem plantar, regar e colher da terra.

"Estou convencido de que hoje há mais crianças nesta freguesia do que havia há trinta anos", diz Nuno Pereira, o empresário de Oliveira do Hospital que conhece quase todos os habitantes da região. Leva-lhes pés de framboesas e de mirtilos para plantarem, ajuda nas burocracias municipais, tem estado sempre ao lado da comunidade estrangeira desde o fogo. Por estes dias, alguns desses habitantes de Benfeita estão empenhados em criar uma associação que lhes sirva de base legal para alguns projetos.

Não tem sido fácil renascer das cinzas. "Ainda me sinto agarrada às memórias do que esta serra era antes do fogo." Mas a tragédia do incêndio uniu-os: "Começámos a ter ideias muito mais sólidas sobre o que queremos fazer e o que queremos transformar", diz Bárbara.

Naquela "comunidade não intencional" (como lhe chama Bárbara) há várias correntes políticas e espirituais, com total liberdade. Até porque, na base, todos têm a mesma intenção: "Regeneração daquilo que nos rodeia. Ajudar a mãe Terra a mostrar o que pode ser e todo o potencial que pode ter. É isso que tem de ser o futuro. Não é explorar, não é estar sempre a usar como se tivéssemos algum direito sobre a terra, enquanto afinal todos nós somos parte dela."

Mas não tem sido fácil renascer das cinzas dos grandes incêndios. "Ainda me sinto muito agarrada às memórias do que esta serra era antes do fogo." Mas, por outro lado, a tragédia do incêndio uniu-os: "Começámos a ter ideias muito mais sólidas sobre o que queremos fazer e aquilo que queremos transformar, o que para mim foi altamente inspirador. Ao nível da resiliência, trouxe-nos muito", sublinha Bárbara, ainda surpreendida com os que chegaram já depois do fogo.

Integração com a população local
"A ideia sempre foi integrarmo-nos e aprendermos com os locais. Alguns de nós querem iniciar negócios próprios, querem ajudar. Alguns vão ao lar de idosos e fazem festas de anos lá", conta Bárbara Sá, mesmo que nem sempre a convivência seja fácil com todos. "Por vezes as pessoas não compreendem, é preciso explicar que não estamos a fazer nada de ilegal, por exemplo, com o ensino doméstico das crianças."

Folha Verde, espaço educacional que pretende complementar o ensino doméstico das crianças tendo como base os princípios do Agile Learning Centre.© Maria João Gala/Global Imagens

No centro da Benfeita, Alice Ventura borda um pano de cozinha de linho branco, sentada numa poltrona da moradia que serve de apoio a muitos dos habitantes estrangeiros da região. Aos 73 anos, viúva, é uma espécie de mãe e avó para a comunidade que viu nascer há mais de vinte anos, quando chegou a Benfeita a primeira família de alemães. "Os mais novos foram criados comigo, a menina até dormiu muitas vezes." Os pais, já falecidos, estabeleceram-se com um ateliê de feltro. Depois chegaram Pete e Cynthia, proprietários da Quinta da Mizarela. "Ficámos muito amigos, ainda hoje somos. Vou lá às festas e eles vêm cá", conta Alice, cujo terraço da casa serve de base logística "quando vêm os camiões de França com as comidas deles". Porque para a sustentabilidade que esta comunidade procura "é preciso uma negociação, sermos realistas", como diz Bárbara. "Não é possível produzir tudo o que comemos", acrescenta Laura. Mas é possível "aprender a trabalhar com a natureza, e não contra ela", diz Wendy.

O interesse de Harvard pela Benfeita: Depois do incêndio de 2017, a Universidade de Harvard interessou-se pela Benfeita. No ano passado, duas alunas da Escola Superior de Design da universidade norte-americana criaram o projeto O Que Leva a Levada, desenvolvido em conjunto com o município de Arganil, orientado pela professora Sílvia Benedito, uma arquiteta natural de Silves e licenciada em Coimbra que há anos leciona em Harvard. Durante algum tempo, Inés Benítez Gómez e Melissa Naranjo exploraram o impacto dos antigos socalcos e dos sistemas de gestão da água da região na vida da população local. À pequena escala, é o que fazem agora as novas comunidades. Wendy Howard sublinha esse trabalho tão importante: "Tal como com o projeto Eco-Freguesia, o que se pretende é estabelecer as bases. Neste caso, para o desenvolvimento de projetos de restauro deste património nacional, no futuro."

Paula Sofia Luz

Sem comentários:

Enviar um comentário