Barroso da Fonte |
Muita gente do interior do país ainda é escrava da palavra. Foge dos tribunais e nem sequer conhece o significado de palavras como: testemunha, arguido, réu, queixoso, assistente, oficial de diligências, escrivão, sentença, pena, juiz de círculo, desembargador, conselheiro, bastonário, tribunal comum, tribunal de penas, varas mistas, tribunal de relação, supremo tribunal de justiça, tribunal constitucional etc. etc.
As pessoas mais idosas dos meios rurais, quando se lhes pergunta se fulano tal é boa gente, se sicrano é pessoa de respeito, respondem logo: - já andou nos tribunais, já se meteu com a justiça, já cumpriu cadeia, ou, ao invés: - nunca respondeu, não é gente de andar pelos tribunais, é «dos nossos»...Ocorre-me regressar às minhas origens e ao tempo em que havia medo de instituições e de pessoas comuns cujas vestes faziam o monge. Mas o ditado diz que o hábito não faz o monge. E os tempos de hoje são radicalmente diferentes no linguarejar, no agir, no modo de ser das pessoas.
Habituei-me a ler as crónicas de 2ª feira, no JN, de Marinho Pinto, Bastonário da Ordem dos Advogados. Nasceu em Vila Chã do Marão que apanha os ventos nortenhos do Larouco, em cujo sopé vim ao mundo. Temos, pois, algo de comum, para além de confrades da imprensa. Admiro a frontalidade com que fala e, embora eu seja mais velho do que ele, dá-me inspiração para falar de alguns titulares da justiça, no tom de voz com que ele – Bastonário – os trata.
Na crónica de 29/4/2013 abordou a «pobreza e desenvolvimento» para concluir que «a instauração da democracia trouxe profundas transformações à sociedade portuguesa. Mas há dois domínios em que essa revolução falhou: nas reformas da justiça e no combate à pobreza». Em 13/5/2013 aborda a falência da democracia e é levado a escrever que «a democracia representativa está doente, muito doente...».
Se perante tão arrojado bastonário as ideias que dele transcrevo perturbam as minhas convicções democráticas, nascidas da revolução que alguns capitães da minha geração impuseram, mais intrigado fiquei ao ler a sua crónica de 17/6/2013 (no JN) subordinada ao título: «A mulher de César». Esse seu desassombrado artigo que até hoje não vi contestado, fará mudar os meus patrícios Transmontanos que tinham horror aos tribunais. E até eu fiquei com o pé atrás depois de ler o que li e de que deixo aqui alguns excertos, tais quais, Marinho Pinto os escreveu:
«Luís Noronha Nascimento deixou a presidência do Supremo Tribunal de Justiça e jubilou-se, ou seja, deixa de trabalhar, mas continua com todas as regalias dos juízes no ativo, incluindo as remuneratórias.
O trajeto que o levou a presidente do STJ começou no início dos anos noventa. Primeiro conquistou o sindicato dos juízes, depois o Conselho Superior da Magistratura e, finalmente, o STJ. Noronha Nascimento é daquelas pessoas que não olha a meios para atingir os fins. Os seus princípios estão orientados para os seus fins. Ideologicamente, é um estalinista puro, ou seja um indivíduo que é capaz de fazer alianças com o próprio diabo, se isso for útil ao que pretende. De uma ambição sem limites, instrumentalizou o sindicato dos juízes e o próprio CSM. Muitos acusam-no de, a partir do CSM, ter controlado o acesso ao STJ e, assim, ter formado, com amigos seus, o colégio eleitoral que haveria de o eleger presidente desse tribunal. O caso chegou a ser denunciado, mas sem quaisquer consequências.
Todos se calaram, ou melhor todos comentavam em privado, mas publicamente agiam como se nada estivesse a acontecer, mostrando, assim, o que é, desde há muitos anos, o principal (des)«valor» da nossa República Democrática: a cobardia. A sua ilimitada vaidade levou-o a contratar, mal chegou a presidente do STJ, uma agência de comunicação e a alterar o site do tribunal para aparecer, logo na abertura, em lugar de destaque, a sua fotografia em pose provinciana de estadista. Enquanto todos os outros tribunais mostravam aquilo que se procura no site de um tribunal, o do STJ exibia a figura mefistofélica do seu presidente ladeado de bandeiras. Foi a decisão de mandar destruir as escutas de José Sócrates no processo «Face Oculta» que levantou dúvidas sobre a sua imparcialidade como juiz, já que o suspeito era nem mais nem menos o primeiro-ministro e líder da maioria política que aprovara, contra toda a nossa tradição judicial, algumas medidas tão queridas pelos conselheiros do STJ, nomeadamente a célebre «dupla conforme», ou seja, a impossibilidade de se recorrer para o STJ da decisão do tribunal da relação que confirme a decisão de primeira instância.
Por outro lado, o filho de Noronha Nascimento conseguiu, durante o tempo em que o pai foi presidente do STJ, arranjar um emprego num organismo do Estado que dependia directamente de José Sócrates. Pode ser apenas coincidência, pode tudo ter corrido dentro da mais estrita legalidade e normalidade, mas, até por isso, Noronha Nascimento deveria ter-se recusado a apreciar o caso das escutas de José Sócrates e, sobretudo, não deveria andar a fazer insistentes declarações públicas sobre a irrelevância criminal de conversas telefónicas cujo conteúdo as pessoas ignoram. É que a um juiz não basta ser honesto, é preciso parecê-lo».
Por: Barroso da Fonte
in:jornal.netbila.net
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