sábado, 16 de abril de 2022

Notícias da aldeia

Por: Fernando Calado
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)

A campainha da Capela de São Sebastião, meu vizinho, quase meu irmão, amigo e companheiro, toca todas as manhãs e todos os anos, durante 40 dias. Quaresma! As mulheres mais pesarosas do que nunca, embrulhadas no xaile, vão andar as Cruzes. Seja pelos nossos pecados! E a capela branqueja sem lutos, nem mágoas, só memórias. À tua sombra descansou o meu avó…o meu pai e descanso eu e todos andamos as mesmas e pesadas cruzes da vida… pela vida, mais do que por ti Jesus de Nazaré… Ben Youssef (filho de José)… tão humano como eu sou… Bem Serafim (filho de Serafim)

Só que tu Jesus, o Nazareno, és Cristo que no Grego antigo significa “ungido”… enquanto eu sou somente um pobre mortal, criado à beira da aldeia… espreitando a sombra da Capela e os sinais do céu e todos os anos…longos… andando tantas cruzes que a alma já me sangra e unge o meu pesar.
Assim, irei contigo Nazareno andar as Cruzes, para quando me cansar da viagem poder descansar no teu regaço, enquanto as velhas mais velhas do povoado ficarão para sempre a encomendar as Almas, na longa noite transmontana:

“À porta das Almas Santas
Bate Deus a toda a hora.
Almas Santas lhe perguntam:
O que quereis, meu Deus, agora?
Quero que venhas comigo
Para o Reino da Glória”.


…longa é a noite…Quaresma infinda!

Fernando Calado
nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança. 
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.

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