A aldeia de Brunhosinho, no concelho de Mogadouro, distrito de Bragança, está apostada em recuperar uma "ancestral chocalhada", que tinha por missão afastar as pragas, doenças e até os lobos dos rebanhos que circundavam a população.
Segundo a população local, o gado, quer ovino, caprino, quer bovino, que abundava e ainda abunda no Nordeste Transmontano usava chocalhos e campainha para anunciar a sua presença e para indicar aos pastores por onde andava, quando algum se tresmalhava.
Para uns, tratava-se de uma forma de "ritualizar" os medos que os pastores sentiam quando, isolados em noites escuras de inverno enfrentavam as intempéries e os perigos da proximidade dos lobos "esfomeados", , quanto mais não fosse pela solidão e impossibilidade de ter ajuda, caso algo corresse mal.
Esta tradição tão ruidosa era uma forma de "espantar os maus espíritos", para que não exercessem as suas más influências sobre si e os seus rebanhos.
Segundo o investigador Antero Neto, esta tradição que agora se pretende recuperar são "reminiscências" das velhas "Festas de Rapazes", que se realizavam em Brunhosinho, a 20 de janeiro, e que passava pela tradicional "chocalhada" em honra de São Sebastião.
"O santo aparece, naturalmente, devido à cristianização da festividade, outrora pagãs que a comunidade dedica à proteção dos animais e à expulsão dos espíritos malignos da aldeia. Ancestralmente, esta função desenrolava-se ao longo de três dias, tendo o seu apogeu a 20 de janeiro, e após nove dias de orações, também conhecidas por novenas", explicou.
No entanto, se a festa era reservada aos rapazes, muitos acabaram por deixar a terra e foi uma jovem rapariga que, na companhia do seu irmão mais novo que e desde tenra idade conseguiu manter viva a tradição.
"Herdei o gosto por estas chocalhadas do meu avô, já que era pastor e sempre nos ensinou a forma de manter viva esta tradição", contou Marcela Pereira.
Atualmente, as migrações levaram a juventudes local para outras paragens, e a que festa passou a ser realizada num altura em que se possa juntar o maior número de residentes e mais próximo possível do dia de São Sebastião.
Para "compensar" o santo, pela sua proteção aos animais, no último dia da chocalhada, que hoje termina, acende-se a fogueira, sendo igualmente feito um peditório ao longo da localidade.
"As pessoas ofereciam peças de fumeiro e outras partes dos animais, que no final eram leiloados, revertendo o respetivo pecúlio para a mordomia da festa", observou.
Antero Neto lembra que estas chocalhadas, ou "pandorcas", chegaram a ser "fortemente perseguidas pela hierarquia católica".
Porém, conseguiram sobreviver fruto da resiliência do povo, que "as manteve contra tudo e contra todos".
Para António Galvão, um dos promotores, foi preciso criar uma entidade coletiva, sob a forma de confraria, e agora se tornou responsável pela preservação e divulgação dos valores inerentes a esta tradição.
Lusa
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