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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira..
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 23 de maio de 2016

Campanha alerta que estes podem ser os últimos meses do Tua

Lançada nas redes sociais, a campanha conseguiu meio milhão de visualizações em menos de dois meses. E à caixa de correio da UNESCO já chegaram mais de 22 mil cartas a apelar para a paragem imediata das obras de construção da barragem, o que a EDP rejeita.
As últimas betonagens da obra de aproveitamento hidroeléctrico do Tua, a barragem que está a ser construída pela EDP na foz daquele rio, a um quilómetro da confluência com o Douro, estão praticamente concluídas. Numa corrida contra o tempo, o consórcio construtor, liderado pela Mota-Engil, faz avançar a obra nas frentes da central eléctrica e no que vai ser o circuito hidráulico de restituição. E é também uma corrida contra o próprio Tua, um rio que, por estes dias de chuva, tem teimado em mostrar a sua face de rio de cheias, com um caudal intenso, a ameaçar entrar pelas cavidades de rejeição. Mas a EDP mantém que o início do enchimento da albufeira ocorrerá ainda durante este mês de Maio, “após visita das autoridades”. A intenção é a utilizar a potência de 270 megawatts que está a ser instalada e começar a produzir energia até ao final do primeiro semestre de 2017.

Nas redes sociais, e em paralelo, a Plataforma Salvar o Tua, fundada em 2013 por um conjunto de organizações locais e organizações ambientalistas às quais se juntou uma empresa vinícola, procura aumentar outro caudal: aquele que ameaça inundar as instalações da UNESCO de cartas com pedidos para que a obra pare.

“Peço à UNESCO que cumpra a sua missão: proteger da destruição locais como o Alto Douro Vinhateiro e assegurar que as futuras gerações possam deles desfrutar. E peço à UNESCO para agir: fazendo uma visita à área, reunindo com todos os afectados pela construção da barragem e colocando o Alto Douro Vinhateiro na Lista do Património Mundial em perigo”, lê-se no texto enviado ao organismo das Nações Unidas.

A campanha assenta em quatro histórias-documentário, realizados por Jorge Pelicano, autor do premiado documentário Páre, Escute e Olhe sobre a linha ferroviária do Tua, suspensa desde 2008, depois de muitos anos de desinvestimento e a pretexto de um acidente mortal. Jorge Pelicano escolheu quatro personagens reais para documentar a última caminhada, a última vindima, a última colheita, a última descida de rio.

Não está a dramatizar. Este é mesmo o último ano do Tua, pelo menos como toda a gente que ali aparece retratada o conheceu. Já não é possível fazer caminhadas ao longo da linha (os túneis já estão emparedados, o património ferroviário há muito foi levantado), a desmatação já levou área de cultivo (mesmo que a cota máxima de enchimento (NPA) tenha descido, durante o processo de avaliação de impacte ambiental, para os 170 metros. E, a confirmarem-se os planos de arrancar com o enchimento da albufeira ainda neste mês de Maio, para que se começar a produzir energia no primeiro semestre de 2017, as alterações tornar-se-ão, então, definitivas. Serão 420 hectares de vale inundado, 19 quilómetros de linha submersos, e um novo plano de mobilidade cuja operação, da primeira vez que foi lançado o concurso, ficou deserto.

A campanha também está a decorrer em inglês. Há marcas, como a Patagónia, que comercializa roupa e equipamento de aventura nos Estados Unidos da América, que na passada sexta-feira incluiu a campanha “salvem as barragens portuguesas” na newsletter que enviou para as suas dezenas de milhares de clientes em todo o mundo.

E o vídeo da campanha já teve mais de meio milhão de visualizações. “Estamos muito satisfeitos, e até surpreendidos com a adesão que esta campanha está a ter”, disse ao PÚBLICO João Roquette, administrador do Esporão, a única empresa que integra a plataforma Salvar o Tua, e que é também o financiador assumido desta campanha.

O Esporão investiu 60 mil euros do seu orçamento de marketing para custear esta acção de sensibilização, referindo fazê-lo não apenas porque está preocupado com a qualidade do azeite e do vinho que quer continuar a produzir com origem no Douro, mas por uma questão de consciência ambiental e de participação cívica. “Se não chegarmos a ganhar esta batalha, e a barragem for construída, sei que não perderei tanto como aquelas quatro pessoas que Jorge Pelicano nos revela nos seus filmes. Eu vivo em Lisboa, não sofrerei tanto o impacto directo. Mas acredito que será todo o país que perde”, afirma o empresário.

O sabor amargo do Sabor
Faz sentido fazer estes apelos, a escassos dias de a barragem começar a encher? Os activistas acreditam que sim. Já perderam uma batalha: não conseguiram travar o Sabor, cuja barragem que submergiu “o último rio selvagem da Europa” está em operação plena desde Janeiro deste ano. Mas lembram-se de Foz Côa, e de as obras terem parado quando a construção do paredão já ia a meio.  Desta vez, argumentam, está em causa o último rio de montanha, uma barragem cara que vai acrescentar quase nada ao sistema eléctrico nacional e que vai custar muito aos contribuintes e aos consumidores portugueses. “Parar agora a construção da barragem de Foz Tua é, pelo menos, vinte vezes mais barato do que deixá-la avançar e pagar, a posteriori, os custos de uma electricidade cara e de uma obra inútil e lesiva do interesse público”, argumenta a Plataforma Salvar o Tua.

Enquanto engenheiro do ambiente, João Joanaz de Melo, do GEOTA - Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e do Ambiente – a associação que tem a presidência da Plataforma Salvar o Tua –, faz muitas avaliações de impactos ambientais e tem dedicado a carreira académica ao estudo da eficiência energética e da sustentabilidade. Joanaz de Melo refere que os indicadores económicos destas novas barragens são “patéticos”, e que os resultados operacionais da exploração de Foz Tua vão estar próximos do zero – “se não forem mesmo negativos”, diz, ao PÚBLICO.

Não faz sentido nenhum, responde fonte oficial da EDP, mesmo quando confrontada com o decréscimo do consumo que a levou a aplaudir a decisão do governo de adiar a construção da barragem do Fridão, no Tâmega. Qual é o racional económico que continua a apontar o início da operação da central  Foz Tua como essencial para o plano eléctrico nacional? “A obra de Foz Tua está numa fase de conclusão. A barragem está construída. Não faz sentido pensar em outro cenário que não seja o de conclusão das frentes em curso, fundamentalmente trabalhos de escavação a jusante da barragem”, limita-se a responder a mesma fonte da empresa.

De acordo com a EDP, a empresa já realizou cerca de 80% do investimento total previsto no projecto - só a construção implicou mais de 300 milhões de euros. Um dos intervenientes no projecto foi Souto Moura, que se estreou em projectos de barragem assinando o edifício do Aproveitamento Hidroeléctrico. O arquitecto desenvolveu o projecto com o objectivo de eliminar todo o carácter de “edifício” da construção para que esta passasse a ser uma máquina “inserida na paisagem”, enterrando a central, inserindo-a num bunker.  A ideia foi reduzir o impacto da barragem na paisagem do Douro Vinhateiro, depois de técnicos da UNESCO terem ameaçado com uma desclassificação - mas se a obra da central hidroeléctrica fica praticamente enterrada, o paredão da barragem continua a exibir a sua altura de 108 metros.

Joanaz de Melo mostra-se inconformado, insistindo que valorizar a região do Tua e do Douro, fomentar o emprego e o crescimento económico não se faz com a construção de barragens, como argumenta a EDP, ou como tem defendido a Agência para o Desenvolvimento da Região do Vale do Tua (ADRVT). “Faz-se com a valorização dos recursos naturais, como tem feito o Geoparque de Arouca e o movimento turístico à volta do rio Paiva”, refere o presidente do GEOTA.

A ADRVT é composta pelos cinco municípios que foram afectados pela construção da barragem (Alijó, Carrazeda de Ansiães, Mirandela, Murça e Vila Flor) e é uma espécie de fiel depositária das contrapartidas financeiras pagas pela EDP para minimizar impactos e promover o desenvolvimento económico, social e ambiental da região. A criação de um Parque Natural foi uma das primeiras medidas anunciadas pela agência - mas não se conhecem muitas mais. O PÚBLICO tentou fazer um balanço da actividade com os dirigentes da estrutura, mas não obteve respostas em tempo útil.

De acordo com a EDP, presidida por António Mexia, o valor anual entregue ao Instituto  da Conservação da Natureza durante a fase de construção, e que posteriormente remete à ADRVT a parte que lhe é devida,  é de 470 mil euros. “Na fase de exploração da barragem será entregue 3% da receita líquida de produção”, refere a EDP, escusando-se a antecipar valores.

São exactamente os mesmos 3% de receitas geradas que a EDP entrega para o Fundo do Aproveitamento Hidroeléctrico do Baixo Sabor, e que é gerido pela associação de municípios local. A EDP diz que, até ao momento e desde o arranque do projecto, entregou a este fundo 2,8 milhões de euros. Vítor Bebiano, proprietário da empresa de animação turística MapAventura, que se ocupava com a realização de descidas de cano-rafting do Sabor, refere ao PÚBLICO que, em termos turísticos, “tudo ficou morto” na região. A albufeira continua sem plano de ordenamento, nem sequer estão construídos os dois cais de embarque previstos. “Não tínhamos noção do que para aí vinha. Eu, que até defendia a barragem, não tinha percebido que o Sabor se ia transformar num Douro. Só que agora não serve para nada. Nem para o regadio nem para o turismo”, constata o empresário.

É para evitar situações idênticas que a Plataforma Salvar o Tua promete continuar empenhada, nas redes sociais, a conquistar mais adesões para a causa. “O Tua é um preso inocente que está no corredor da morte, a aguardar a injecção letal. Enquanto ela não acontecer, há esperança”, termina João Roquette.

Luísa Pinto
Correio da Manhã

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