quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Memórias Orais - Amélia Paulo

“No meu tempo, ajudávamos aos vizinhos, os vizinhos ajudavam-nos a nós mas aquilo era uma vida alegre. A gente cantava, ria, o meu pai a tocar o “bajolim” que era muito alegre, chamava-se Benjamim Paulo, e então num instante formávamos ali um jogo de roda , era uma alegria. Mas trabalhava-se, tudo em conjunto, a gente era mais humana, mais humilde...”
A felicidade para si é alegria. Simples e claro como quem deseja tudo com o pouco que tem. Amélia Paulo vive em Lagoaça, a terra que lhe proporcionou as maiores alegrias e lhe mostrou que viver livre era meio caminho para ser feliz. “Aprendi pouco, tenho a terceira classe mas depois também nunca me puxou muito, eu só é rendas e bordados, ao mais livros tenho lá muitos, mas pronto cada um é para o que puxa. Puxava muito pelo campo, ia sempre tudo ao meu pai, plantar melancias, feijões, batatas. Apetecia-me, ainda hoje gosto do campo, tenho um quintalzinho ainda pus uma cebolinhas, umas favas, tudo, gosto de ter, gosto de trabalhar. Quero trabalhar até ao fim da minha vida enquanto puder”.
Casou porque insistiram muito. Por ela não tinha pressa ,queria ter gozado mais a mocidade mas nunca teve motivos para ter mudado os pensares. “Graças a Deus nunca me arrependi, foi uma companhia muito boa e muito séria”. A vida de guarda fiscal obrigava muitas vezes a deslocações para longe da terra e Amélia tinha que acompanhar o marido. No Alentejo deixou dois filhos que não chegaram a ver o dia. Mais tarde, noutro destacamento do marido para a Póvoa de Varzim, haveria de ajudar uma senhora a dar à luz: “Fui por uma rua até que fui dar a um quarto onde estava então uma mulher a ter um filho e eu nunca tal me aconteceu, foi a primeira criança que eu vi nascer. A mulher pediu-me que chamasse a parteira e eu telefonei para Vila do Conde. A criança nasceu (...) e então tratei de matar uma galinha, fiz-lhe um caldinho e dei-lho. Depois lavámos o garoto e tudo aquilo...”.
(Foi assim vida e a gente tem que a saber levar com paciência, diria Amélia dos seus 77 anos...)
Agora governa-se sozinha. Os irmãos estão sempre por perto para qualquer coisa que precise e de vez em quando visita o filho e a neta mas sempre lhe custa deixar a sua terra. E é para ela que canta sempre que se lembra que é alegre:

Somos um rancho da brincadeira
Trazemos ramos da folha da oliveira 
Viva Lagoaça com alegria
Viva Lagoaça toda a nossa freguesia
Terra pequena, cheia de rosas 
Tens bons rapazes e raparigas formosas 
Tens oliveiras e laranjeiras
Tens bons rapazes e raparigas fagueiras
Viva Lagoaça não tem rival
Viva Lagoaça viva também Portugal
Portugal! Portugal!

Texto: Joana Vargas

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