Noto com tristeza que as pessoas deixaram de falar umas com as outras. Continua a comunicar-se, cada vez mais, com conexões permanentes e sem horas marcadas, mas não há um verdadeiro diálogo entre elas.
Sou nova por fora e velha por dentro quando o assunto é estabelecer contacto com outros seres humanos. É que sempre que possível não dispenso um cara a cara. Em todos os contextos da vida.
Isto era uma técnica muito usada pelas mulheres, no que toca a relacionamentos amorosos. O falar “pessoalmente”. Quando chegava aquela fase do “não te aguento mais, mulher! Está tudo acabado!”, um encontro a dois operava milagres. O que é certo é que se do outro lado se acedesse a este pedido, do “pessoalmente”, era sinal claro de que ainda se nutria interesse, e a coisa dava-se.
Ora, agora isso do “vai ali falar com sicrano” foi trocado por um “depois ligo-lhe”. E nem isso! (Desculpa, Bell). Mandam-se mensagens escritas e emails em telegrama: “assunto-tratado-falar-contigo-quando-andar-menos-ocupado”. E nunca se fala, de falar realmente, porque não interessa.
Qualquer dia, vamos deixar de ter cordas vocais, numa evolução manhosa. É que não usamos com a devida frequência. Ou passa a ser daquelas coisas que temos nos pordentros mas que tanto dá estarem lá como não. Ou, como o mundo está cada vez mais avançado, vamos poder escolher se as queremos ou não.
Há uns tempos um amigo meu dizia-me que tem o que considera ser um defeito, e que é ter a tendência para tocar nas pessoas com quem fala. Eu não o faço com recorrência, admito, mas em boa verdade porque poderia ser confundida com um iceberg. Por vezes tenho inveja de quem o faz (à excepção daquela malta chata, que apetece logo espetar-lhe com uma ordem de restrição na cara). É um dom além de conseguir falar com alguém, mostrar-lhe de uma outra forma que estamos ali, presentes.
E isto lembra-me outro factor determinante: estar presente quando falarmos. Ouvir, compreender, dar verdadeira atenção.
Desenganem-se – tudo actualmente é de plástico e para consumo imediato. Até as pessoas. No outro dia, disseram-me que me viram num local, mas, porém, não me dirigiram palavra. Não me falaram. E arranjam-se justificações lógicas para que isto aconteça. Depois, procura-se um contacto impessoal, sem presença nenhuma associada. Deduzo eu que isto seja uma maneira de avaliar a pessoa antes de saber como é o timbre da voz dela. Se não interessa, amassa-se e atira-se para o lixo cibernético, e faz-se de conta que nem sabemos quem é tamanha personagem. Ok, se calhar há quem se identifique com esta sintomatologia. Eu não.
Antes saíamos de casa, íamos beber um café, fumar uns cigarros às escondidas, e conhecíamos quem era habitual por ali. Conhecíamos pelo nome, dizíamos “olá”, sem receio algum. Aliás, fiz montes de amigos assim, a entabular conversas com desconhecidos.
Hoje fomos trocados, profanamente, por perfis descartáveis nas redes sociais, onde todos somos iguais, onde ninguém se fala. Falar, mas de verdade, digo!
Hoje ligamo-nos na internet, e esquecemos que do outro lado estão seres humanos de carne e osso, que, provavelmente, ainda saem de casa para ir beber um café e fumar às escondidas, mas que não falam com ninguém pessoalmente. Nem com eles próprios.
Tânia Rei
in:diariodetrasosmontes.com
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