Sempre que um acto eleitoral se aproxima, a maior parte dos eleitores não sabe, à partida, em quem votar ou está predisposta a não o fazer. A questão coloca-se com maior acuidade aquando da eleição de uma nova Assembleia da República.
Por isso as forças políticas habilitadas ao acto eleitoral em jogo respondem com encenações vistosas baseadas em cartazes com fotografias cuidadosamente retocadas e chavões ridículos, que pouco ou nada dizem, mas sempre despertam a curiosidade dos transeuntes, como se de um produto de supermercado, detergente ou pasta de dentes, se tratasse.
No próximo dia 1 de Outubro vão ser eleitos novos e reeleitos velhos autarcas em processos eleitorais que continuam a ser, em muitos casos, deturpados pelas forças que detêm o poder.
Tanto assim é que o hábil exercício do poder autárquico conferia claramente aos seus detentores o condão de se fazerem reeleger até se fartarem, razão pela qual a limitação de mandatos veio pôr fim, justamente, à gesta heróica dos chamados autarcas dinossauros. O que ainda não acontece, lamentavelmente, com os deputados vitalícios.
A decisão de votar ou não votar, e em quem, não é linear para a maioria dos eleitores, portanto. Vários amigos meus, confrontados com este dilema, porque não se sentem devidamente informados e pensam, erradamente, que eu o estarei, ou porque nenhum candidato ou partido seja de seu agrado ou lhes inspire confiança, vêm ter comigo para, em privado, me fazerem esta pergunta embaraçosa: Diga-me lá em quem devo votar? Situação que, por certo, não só a mim é colocada.
Apetece-me dizer-lhes que também eu não sei e tenho as mesmas dúvidas, mas resisto à tentação de aconselhar que não votem, que se abstenham, porque entendo que devemos ir às urnas sejam quais forem as circunstâncias. Porque, mesmo se for inconciliável a aversão pelas forças partidárias e candidatos em presença sempre nos é dada a possibilidade de chegar à mesa de voto e escrever no boletim uma mensagem, politicamente correcta, do género “Viva a democracia” ou “ Abaixo a mediocridade”.
Também porque a lei em vigor e a inteligência política instalada olham os abstencionistas como cidadãos de segunda categoria e os tratam como comodistas, marginais, ausentes em parte incerta ou mesmo defuntos, não lhe reconhecendo a justa relevância política.
É por tudo isto que eu partilho a ideia de renomados estudiosos destas questões de representatividade que defendem, face ao peso esmagador da abstenção, que deveriam ser deixadas vagas nas Assembleias as cadeiras correspondentes aos abstencionistas.
De facto, se a abstenção não conta como voto, então, se não há votos não deve haver atribuição de mandatos, pelo que é abusivo os partidos elegerem deputados excluindo os abstencionistas. E o que se diz para a Assembleia da República diz-se para as Assembleias Municipais. Seria, além do mais, uma forma simples e espontânea das Assembleias mais fielmente espelharem o sentir da Nação e de reduzir o número de deputados e os gastos correlativos.
E mais! Entendo que os boletins de voto, da mesma forma que têm quadradinhos para colocar a cruzinha correspondente ao partido preferido, também deveriam ter um, de igual tamanho, com o dizer “ Abstenho-me”. Ou mesmo “Não voto em ninguém”.
Será pedir demais? Será que os portugueses, mesmo não gostando, são obrigados a engolir a caldeirada do regime e a render-se à lei do “come e cala-te”, apanágio da generalidade dos nossos políticos?
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.
Henrique Pedro
in:jornalnordeste.com
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