A palavra remisquedo significa-me curvas sinuosas, apertadas, perigosas, traiçoeiras nos dias de geada, originárias de desastres graves e ligeiros, ligadas através de uma ponte, parando junto ao fontenário do Fontismo.
A mesma palavra vem das brumas da memória (qual hino) a soltar-se em partículas a acalmarem-nos tal como a afamada água nos levava a sustermos a pressa, independentemente das estações do calendário, primacialmente nos dias estivais, dias de cigarras estrídulas, embebidas, bêbadas por aspirarem multiplicados perfumes, ficando sonâmbulas, como refrescado ficava após sorver a benéfica água vinda do cimo da serra pejada de castanheiros úberes, carvalhos e outras espécies vegetais.
Agora, o progresso fixo e o progresso móvel desviam-me do remisquedo, rememoro o encanto do lugar quando ouço os trapezistas do tempo anunciarem temperaturas exaltadas não aconselháveis a idosos (o Séneca tinha razão), os quais devem dedicar os dias e as noites a cuidarem da alma, por o corpo é alvo de constantes experimentações médicas e medicamentosas a gastarem as horas e os minutos no cumprimento de minucioso cardápio dos ingredientes e condimentos das receitas passadas pelo facultativo da nossa confiança, longe das pílulas milagreiras da Televisão, todavia utilizando os benefícios da botica ancestral (caseira) para nosso gáudio tão bem registada no tempo medieval pelo instruído Pedro Hispano (ninguém o estuda e enaltece), cujo nome é falado na região de Matosinhos porque um hospital ostenta o seu nome na fachada.
Para lá das significações de remisquedo acima esboçadas, desperta-me o caminho-de-ferro reduzido a escombros, o apeadeiro, a senhora de corneta e bandeira (viva a Maria da Fonte) a deslaçar as correntes da passagem de nível depois da passagem do comboio a arfar à maneira do inveterado fumador a dar as primeiras fumaças em nutrido paivante capaz de criar inveja ao Sr. Poças que entrou no Casino da Póvoa ostentando nota de mil escudos-ouro presa no peito a significar gravata comprada no chinês. Os gravateiros chineses exilaram-se nos pavilhões de tudo, o Senhor Poças morreu há muitos anos.
A parafernália dos comboios desapareceu, a curva na estrada (leiam o livro de Ferreira de Castro) permanece, a comunidade do culto cultiva-se nas plataformas, por assim ser é uma estultícia aconselhar a leitura do livro do autor de Terra Fria, no seu tempo, comparativamente, vendeu muito mais que Saramago no seu auge; a estultícia escora-se no facto do autor não suscitar interesse ao exemplo de outros, a Escola molda os espíritos à vontade dos donos do poder. Acham que o ministro Tiago leu o autor de Instinto Supremo?
A pluralidade de significações, dá origem a questões sociais de bom e mau entendimento, Musil no imprescindível O Homem sem Qualidades explica através de palavras cristalinas tais questões, do Remisquedo ao Mundo vai a nossa vontade de desenvolver as oportunidades para tal. Por acaso no Fórum da Caixa falou-se de Cultura e Civilização? Falou-se de oportunidades. Oportunidades sem filamentos culturais e civilizacionais? Pois, o sistema bancário ocupa-se de lucros, muitos lucros. E de imparidades. Também!
PS. Nas férias devemos ler. O texto faz sugestões.
Armando Fernandes
in:mdb.pt
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