sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

A Morte de uma ilusão

Por: Silvino dos Santos Potêncio
(colaborador do "Memórias...e outras coisas..")
Emigrante Transmontano em Natal/Brasil – desde 1979


O Poeta Guillaume Victor Émile Augier,  ele nos dizia lá da sua Bela Côte D’Azur… Sofre-se mais vezes pela morte de uma ilusão do que pela perda de uma realização!
Com base nesse pensamento eu acrescento: Falar é fácil, dificil é realizar!... são estas as palavras que muitas vezes escutamos de quem não consegue realizar algo de seu, ou para o qual tenha disso sido incumbido.
- Escrever é nada mais, nada menos, do que exteriorizar o que nos vai dentro do pensamento, apenas com a diferença de que os pensamentos feitos em palavras, essas leva-as o vento! 
Enquanto que os pensamentos escritos eles se perenizam, se divulgam e são aceitos ou recusados dependendo de cada leitor. 
Nós, os Emigrantes do tempo do "assalto à França",  à Alemanha, ao Luxemburgo, e mais tarde aos demais países que nos acolheram depois da crise dos anos "se senta" ( se senta aí,  aonde houvér lugar para isso, à espera dos anos "se tenta")  e se tenta arranjar emprego, onde for possível, nós acabámos por nos acostumar com a ideia da redescoberta das nossas tradições seculares; seguir o caminho dos nossos ancestrais caminhos do mar e escutar a voz do poeta porque "navegar é preciso"! 
Restabelecidas que foram as liberdades democráticas no velho "recto ângulo" da europa, lá onde o mar começa e a terra termina sempre em chamas de saudade, sejam elas alimentadas pelo sonho de um dia voltar, ou até mesmo pelos descasos administrativos onde só se previne o que já é,  e está irremediavelmente perdido, nós sofremos a mesma força da impotência no combate à estupidez dos homens que a natureza não perdoa. 
- Sabemos todos que as condições climáticas são novas, são diferentes, são mais inclementes do que nunca, todavia outros países as sofrem de igual forma, e nem por isso são castigados como o nosso velho torrão natal. 
- Eu até nem lhe chamaria mais por este nome, ao palmo de terra que lá deixei, mas sim um pequeno e minúsculo pedaço de carvão, depois de tantas vezes que a chama já lhe lambeu as berças.      
- Chegamos ao mês das "vacanças" e com isso trazemos na alma o temor da incerteza! Relatos de acidentes mortais, outros não menos prejudiciais ocupam as "pantallas" dos televisores, os écrans dos monitores e mais sofisticadamente - agora modernamente proliferados e pr'a frentex - são os visores dos telemóveis!
... estáaaaalá!!??? 
- Alá esteje cuntigo tumbém! ó pá, ou estou aqui na santa terrinha, pá... 
- tu vistes-me!?... e tu onde estás? 
- parece qu'és burro pá!,
-  aatão num estás a olhar p'ro monitor? 
- ou!?,... burro ou!?, hein...burro és tu caraaaaago. 
-  bem ou estou, estou cá sim!, pá, mas é que... épá, peraíiiii...
Ahhhhtchibum! Catrapum! shrrrrriiimmmm,.... pum, catrapum! e de repente o estálaaaaaaa por aí foi ladeira abaixo, até bater n'ua fraga de bico arrebitado! 
- Ai minha Nossa Senhora!, 
Ai mou Jasuis dos Passos, 
Ai Nossa Senhora da Assunção lá da aldeia de Vilas Boas... ai, ai, ai!...
- Nisto "xigou" o sô guarda,  que não toca na banda mas veste o modelo GNR. 
- Olhou, viu, e em primeiro lugar bateu a continência, enquanto o infractor continuava lá dentro da viatura toda escambalhada!... 
Oh que pena, era tão bonito, mesmo comprado na loja "d'occasion"! 
- Ai minha Nossa Senhora!,
-  Ai mou Jesus dos Passos, (deixa-me gemer mais um pouquinho a ver se o home esquece a missão de combate do próximo mês lá nos "balcãs".)
- Ai Nossa Senhora da Assunção!,... ajuda-me aqui. 
Oh minha Nossa Senhora do Amparo lá de Mirandela, valei-me aqui que eu nunca tinha tido um acidente, foi a primeira vez, acredite ó sô guarda!
- Tá bem, tá bem... voismecê tem dinheiro consigo?
Aatãon ó sô guarda!,... u qué qu'é  isso home de Dous!?... tou aqui todo cubrado da espinha e voismecê inda me pergunta se tenho dinheiro!?... peis é claro que tenho, mas purquê?! 
 - Tá no regulamento!
A "coima" paga à vista e no acto da infracção é mais barata, sabia?!  
Oh minha Nossa Senhora do Amparo!,... aatãon é isso é!? 
A estrada está mal construída… é o que éeeee! 
- Os "gajos" da Junta meteram a mão no orçamento e surripiaram uns trocados para irem de férias lá nas ilhas "sei... Cheles" e nós aqui é que pagamos essa tal de "coima"!?  
- u qué qu'é  isso home de Dous!? 
Olhe, "voismecê" tenha calma e vá lá mostre-me logo a carteira porque senão eu posso até  "en cu adrá-lo"  (uma forma do verbo "encuadrar" do português arcaico-douroiense) na infracção anterior que é muito mais grave, e ainda fica sem carta, sem email e até sem fax para avisar aos parentes.
- u qué qu'é  isso home de Dous!?  
"voismecê" vinha a falar ao telemóvel e quando olhou de novo p'ra estrada "voismecê" despencou pela ribanceira abaixo mais depressa do que se faz a troca de pneus da "ferrari" com a testa rosa como a sua! Voismecê quer pagar a coima, ou não!? 
- "voismecê" tá doido...  
- u qué qu'é  isso home de Dous!?... eu não falei nada no telemóvel. 
Eu só peguei nele para tirar uma fotografia a mostrar que eu estava aqui na santa terrinha, pô! 
 Diga-me cá;  "voismecê" já foi emigrante,  sabe cumé qui é home, né!? 
- Temos que dizer p'rós amigos por onde "andemos", etc e tal e coisa.
Olhe, "voismecê" tenha calma. 
Ou paga estas duas que já estão registradas aqui no meu PC (de bordo) ou quer que eu lhe aplique a "coima" anterior?! 
- u qué qu'é  isso home de Dous!? Aatãon qual é a coima anterior? 
- "voismecê" tá lembrado da velocidade que vinha antes de se despistar, ou seja antes de se "desestradar" ou melhor dizendo actualmente, antes de se "desitinerar" (entenda-se: aquele que sai do "Itinerário Preferencial")  aqui pola ribanceira abaixo? 
- e a conversa continuou enquanto a gasolina espalhada pela área foi se alastrando. 
Ó sô guarda!, qual a "coima" anterior à anterior? 
- Porquê? 
- Eu nunca fico a dever nada a ninguém, muito menos ao Estado lastimável em que estamos. 
- Aqui nos seus documentos consta que "voismecê" nasceu no dia primeiro de abril de mil novecentos e... olhe!, - eu acho que a sua "coima" anterior ela foi cometida mais ou menos uns nove meses antes desta data! - quer pagar ou não?  
Deixe isso p'ra lá.
 - Afinal nós já estamos mesmo no fundo poço, e acho até que estas chamas em volta de nós dois aqui a conversar elas devem ser alguma coisa parecida com aquilo que se pode chamar de inferno na terra. 
A benção minha Nossa Senhora da Assunção!
 - Pena que não posso te visitar lá na próxima semana... mas p'ro ano eu vou, se Deus quisér.  

Silvino dos Santos Potêncio, nascido a 04/11/1948, é natural da Aldeia de Caravelas no Concelho de Mirandela – Trás-Os-Montes - Portugal.
Este Autor tem centenas de crónicas, algumas já divulgadas sob o Título genérico de “Crônicas da Emigração”.  Algumas destas crónicas são memórias dos meus 57 anos na Emigração foram incluídas nos Blogs que todavia estão inacessíveis devido ao bloqueio do Portugalmail.pt, porém algumas foram já transcritas para a Página Literária. 
Presidente Fundador do Clube Português de Natal e Membro activo de várias páginas em jornais virtuais ligados ao Mundo da Lusofonia.
01 – POEMAS DE ANGOLA – “Eu, O Pensamento, A Rima!...”
02 – E-Book (Livro Electrônico): “UM CONVITE P’RA TOMAR CHÁ”
03 - CURRIÇAS DE CARAVELAS- TROVAS COMENTADAS é uma Antologia que contém  Trovas  e Textos Auto Biográficos da Aldeia Transmontana. 
        São livros da minha autoria já prontos para Edição e publicação brevemente. 
Actualmente mantenho uma página literária própria, como Emigrante Transmontano em Natal/Brasil, no Portal Recanto das Letras.   
O sitio do Escritor Silvino Potêncio  www.silvinopotencio.net  está aberto a visitas de todos os leitores de Língua Portuguesa.

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