No tocante ao buitiêlo ora grafado butelo, ora botelo, ele conseguiu atingir notoriedade gastronómica para lá das fronteiras ancestrais transpondo com êxito o depreciativo pitéu queimoso dos mancebos das aldeias situadas na dita Lombada. Passando à categoria de enchido prestigiado e importa sublinhar os esforços nesse sentido de António Jorge Nunes e Hernâni Dias, pese a talento de quem os concebeu e concebe. Tal como noutros lugares do Portugal invejoso reiterando a validade do provérbio – nunca o invejoso medrou, nem quem ao pé dele morou – também na cidade bragançana a vaidade escorada na inveja não deixa os seus créditos por mãos alheias enfeitando roupas cheias de côdeas e muitas epidermes a pedirem sabão macaco (azul), e muita salsa bem mastigada por molares sem escova diária. A salsa tem o efeito de morigerar a halitose.
O Sr. António Sérgio apelidou de valente pedaço de asno o rei das guitarras deixadas em Alcácer Quibir, pois bem se ressuscitasse ficaria escandalizado ante os narizes de cera e penduricalhos inseridos nos cardápios curriculares de gente da restauração que não sabe fritar um ovo roto, arrimando-se às Mestras cozinheiras que dão notoriedade às casas de comida na esteira de singulares e magníficas artesãs da nossa cozinha tradicional.
Os butelos de agora deixaram de só serem ossos quebrados e pedaços do rabo do porco, ganharam carniça, a Câmara Municipal de Bragança ganhou um produto de nome estranho e sapidez eclatante, o Sr. António Sérgio não ressuscitou para bem dele, a Mestra Justa Nobre enche o seu restaurante quando a par da Autarquia do Braganção, leva a feito supimpas refeições cujo elemento primacial é o também leonês buitiêlo. Assim aconteceu, mais uma vez no dia 13 de Fevereiro do ano em curso.
Para lá do ágape é sempre um prazer rever velhos e admirados amigos, caso do Comandante Chiote, do Ezequiel Sequeira, do Paulo Amado, de Hirondino Isaías, da jovial deputada Isabel Lopes, de João Cameira, obviamente Hernâni Dias, o sempre atento Sr. Nobre (marido da Dona Justa) entre outros convivas. Para meu desgosto não compareceu uma das consciências da Pátria Portuguesa, refiro-me ao Professor Adriano Moreira retido em casa em virtude de ter partido um braço.
Sem pressas, a manducação marcada pela alacridade bem-disposta pautou-se pelo suavizar de saudades de outros produtos da temporada que também foram servidos ao modo de prefácio e notas finais. Realço enchidos de massa, de carne, não sendo esquecidas finas fatias de presunto de porco de raça bisara.
Nestes encontros reavive-se o escoar de anos, pessoas boas e biltres, as primeiras a contentar-nos, as segundas a levar-nos a pensar porque raio mereceram a nossa simpatia. O meu companheiro de Escola, o marinheiro de longo curso depois de ter cursado brilhantemente a Escola Naval, entenda-se o Chiote, nunca distraído chamou-me a atenção para o facto de nunca ter escrito acerca de um nosso conterrâneo, felizmente vivo, figura impecável no trato, de conduta exemplar, desportista e atleta pundonoroso do Desportivo, o meu vizinho durante algum tempo, o Senhor Francisco Ferreira, Xico Ferreira tão brioso quanto o seu homónimo lendário capitão do Benfica nos anos quarenta do século passado. Fez bem o filho da minha benfeitora Dra. Branca Chiote em me sugerir a falta de atenção por todas as razões e ainda as de o admirar desde que o vi jogar elegantemente no campo do Toural, ensinando boas práticas aos sarrafeiros, Tita, Macedo, Vinhas e Mário, o trio mirandelense.
Vejam os leitores: uma refeição salpicada de ressonâncias memoriais, escorada em saborosas vitualhas a honrarem o marroncho bísaro devido à pertinácia da Câmara, ao engenho de quem fez e de quem cozinhou os butelos ora em alta na área da gastronomia enquanto tal, ou seja, dentro do conspecto do notável escritor e gourmet Albino Forjaz Sampaio. Essa visão está plasmada no livro Volúpia, 1.ª edição em 1940.
Armando Fernandes
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