domingo, 22 de março de 2020

Saudade, tristeza... 2ª Parte

Por: António Orlando dos Santos (Bombadas)
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")



Tentarei passar para os que têm a paciência de me lerem, o que me entristece ao ver hoje a nossa cidade. 
Retomo o lugar e uso o i-pad e o apontador de borracha em substituição do caderno de papel e a caneta doutros tempos. É uma mudança que me satisfaz apenas porque como sofro da Doença de Parkinson a minha caligrafia já não tem a regularidade de outros tempos e deste modo, posso comunicar convosco diretamente. Voltando aos erros cometidos, autênticas decisões inconcebíveis que poderiam ter sido alteradas quando decorria a obra, se houvesse algum bom senso na cabeça dos responsáveis. Tome-se como exemplo mais gritante como a conceção de um parque de estacionamento resulta na supressão de um Mercado que cumpria cabalmente as suas funções para construírem algo que é pratico do ponto de vista do estacionamento recolhido, mas ao qual apenas se lhe atribui esse único ponto positivo. Obra de construção deficiente está longe de ser de conceção aceitável tanto do ponto de vista dos acessos e saídas como do ponto de vista do aproveitamento do espaço vazio, desértico pode dizer-se, da sua cobertura que é inestética, sem aproveitamento prático e rodeado por piso de materiais inadequados e iluminação deficiente, pois à noite é um perigo pela ausência de luz nas saídas onde as colunas de iluminação estão normalmente apagadas. As luminárias que colocaram no pavimento, para quê?, servem apenas para impedir que se veja com clareza e estão quase todas destruídas pelos camiões que carregam os materiais com que fazem os pavilhões do tira e põe dos eventos medianos ali realizados. A distribuição do tráfego rodoviário é o ponto mais evidente de conflito e desacordo que o cidadão comum mais contesta,
Porque carga de água se fechou ao tráfego a Rua Alexandre Herculano, que está quase exangue e se encaminhou o tráfico em fila indiana desde o acesso ao jardim, cobrindo toda a rua Dr. Teixeira, parte da Oróbio de Castro até à Escola Velha onde entra na Rua Direita, obrigando todos os que vêm à cidade, naturais e forasteiros a verem uma das ruas mais incaraterísticas da Cidade, a rodarem em pavimento lento, que ainda por cima tem um piso desde o fundo da Rua Direita até ao Museu na Abílio Beça que pretensamente é tradicional mas não é outra coisa senão um capricho de masoquismo de quem o escolheu para dignificar a praça do Monumento aos Mortos e para conforto da circulação viária. Não podia haver escolha mais absurda e prepotente na sua imposição como elemento de amenidade e fruição das vias públicas urbanas. Uma aberração!
Todo o tráfego viário está condenado a fluir em fila indiana, o que implica a paragem da coluna anterior sempre que pelas mais variadas razões um veículo interrompe a marcha. 
Da Praça da Sé nem valem mais argumentos. Está assim e paciência. Comparo-a com a D. Alegria que quanto mais bela queria parecer, mais bisonha me parecia! Mas assim como a praça, já havia sido realmente bela, não se conformando com a sua decadência como a praça não escolheu a melhor forma de se manter dentro do processo natural de envelhecimento e ao querer parecer o que não era tornou-se motivo de indiferença e condescendência que o povo lhe dispensava em honra do seu passado de esplendor.
Muito teria a gente que discordar do que foi feito ou omitido para que Bragança tivesse chegado a esta situação de quase morte anunciada e não será o meu lamento que ajudará à sua regeneração. O que eu poderia fazer por ela, fi-lo quando pude e desinteressadamente, hoje com a idade, saúde e cultura que possuo não seria viável tal intenção que fosse por mim acalentada, mas de novo repito que o meu amor e fidelidade é o mesmo de sempre, que foi constante desde o alvor da minha existência e se manterá até ao meu último suspiro.
Até agora serviu este meu desabafo apenas para apontar coisas más, decisões erradas, imposições prepotentes e hipocrisias evidentes. Quero no entanto deixar bem vincado que estou satisfeitíssimo com muita coisa que de bom se fez nesta minha terra.
A saber: A política cultural em toda a sua abrangência é uma realidade incontestável.  Bibliotecas, Escolas, Museus,Teatros, Edições de livros de Cultura popular, históricos e dos mais variados âmbitos de interesse púbico, são também fruto de uma visão clara de estratégia que está a produzir o seu resultado de conquista de uma mais desempoeirada ideia de educação das gentes.
O desempenho do sector da Saúde (SNS) que tão criticado é injustamente, pode considerar-se em Bragança de excelente. Há falta de médicos em algumas especialidades e pode pensar-se que seria fácil fixá-los, mas esse é um problema que tem que ver única e exclusivamente com o Estado Central, não está nas mãos dos poderes locais, agora quanto à forma como funcionam os vários departamentos da Saúde, o profissionalismo dos seus agentes, o brio que se pressente nas atitudes a gentileza no trato com as pessoas e a dedicação à causa de Médicos (a) Enfermeiros(a) e pessoal administrativo e auxiliar está a anos-luz do tempo que eu menciono como exemplo do que a cidade foi.
Claro que não é perfeito, mas é quase. Di-lo quem tem experiência de outros contactos com os Serviços de Saúde que são considerados melhores e que a minha opinião não desdoura mas aos quais falta o humanismo a doçura e a compreensão que os nossos profissionais nos demonstram em cada ato que praticam para nos servirem. Bem hajam os poderes púbicos que souberam criar Serviços de excelência e preparam gente que não deixa a simpatia em casa quando vai trabalhar.
Há também que mencionar que é hoje mais agradável tratar de assuntos nas Repartições Públicas embora se continuem a notar alguns, poucos casos de presunção em alguns agentes que desdouram o trabalho civilizado de uma maioria que tem hoje uma postura mais consentânea com os tempos actuais. De mencionar como positiva a forma como se planeia o futuro se abraçam causas que por mexerem com formas anquilosadas de pensar, nos dão esperança que possamos corrigir o rumo e entrar num tempo em que a solidariedade seja o paradigma da nossa gente. A limpeza urbana que melhorou significativamente é outro ponto que é justo realçar, embora continue a haver um certo desleixo na manutenção dos equipamentos e infra estruturas.
Os atavismos que a administração local conservou ao longo dos anos particularmente a partir da 1ª República não foram ainda superados, mas partindo da análise ao desempenho das instituições, é ainda curto o avanço das ideias de igualdade dos cidadãos perante, não digo a lei mas os seus agentes. Tem que haver uma mudança nas mentalidades que zelam pela segurança e justiça igual à que se concretizou na Saúde. 
Acredito que os quadros que a Administração Local hoje possui são mais cultos e menos presunçosos, mas há ainda uma longa estrada a percorrer mesmo que já não seja tanto como o percorrido.
Deixo aqui a minha opinião, desencanto e frustração à obra que foi concretizada anos atrás no centro da cidade e que como digo destruiu o que de mais central, valioso e economicamente viável a cidade possuía. É evidente o desacordo de quase toda a população, mas não seria justo que não elogiasse os progressos alcançados noutros âmbitos de interesse público dos quais devemos sentirmo-nos gratos.
Feitas todas as considerações não resisto a contar-vos uma história passada nos Campos de concentração no tempo da 2ª Grande Guerra: - Havia milhares de judeus que eram tratados da pior forma que se possa imaginar e da qual todos temos um pouco de conhecimento. Havia entre eles um grupo de Rabinos que conforme é da sua lei tinham obrigação de cuidar do povo de Deus e zelarem pelo seu bem-estar e manter viva a fé no Senhor Javé, sua Rocha e seu amparo. Ora se Javé era tudo isso como se explicava que os tivesse abandonado e os tivesse votado a tal destino de morte, miséria, sangue, suor e lágrimas. Reuniram -se os Rabinos e ponderando todos os elementos possíveis para a atribuição de culpas à entidade mais responsável por tudo o que estava acontecendo ao povo de tão Excelso Criador e Rei de Israel. Depois de acalorado debate, concluíram que a culpa era tão só e unicamente de Javé, pois só Ele era todo-poderoso para o haver evitado e após haver acontecido fazê-lo terminar. Ficou assim decidido que a culpa era d'Ele. Posto isto, um dos Rabinos perguntou: -Que fazemos agora? Entreolharam-se os anciãos e o mais velho e venerando calmamente respondeu: -Continuemos a adorá-Lo como é nosso dever e nossa salvação.
É o que me resta a mim no sentido que se possa enquadrar nesta metáfora que hoje comparto convosco. 

Que Deus dê lucidez e sapiência aos que nos governam. 

Por Bragança,hip-urra!!!




Bragança 09/03/2020
A. O. dos Santos
(Bombadas)

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