sábado, 21 de novembro de 2020

Acima de Gregos e Troianos

 Nas últimas duas semanas, Portugal conheceu uma série de novas medidas de tentativa de controlo da Pandemia e, agora, a renovação do Estado de Emergência. Muito se tem escrito sobre as mesmas: há quem as ache excessivas, quem as considere tímidas face ao que se está a viver e depois há um terceiro grupo, os negacionistas, que simplesmente consideram que, como tudo é uma conspiração e uma cabala global, os “manda-chuva” querem é controlar a população (ou outros objectivos similares).

Quanto a este último grupo, não faço mais observações, pois se acho muito interessante todas as discussões (e por isso faço questão de responder a quem tem a paciência de ler as minhas crónicas, cheguem-me os comentários pela via que chegarem) acho que discutir com terraplanistas é uma perda de tempo. Dizer apenas que espero que se haja consequências, disciplinar, civil e criminalmente quando houver motivos que o justifiquem, quando quem nega o que está a acontecer e incentiva práticas que colocam em causa a saúde pública são pessoas particularmente responsáveis como, a título de exemplo, profissionais de saúde.

Mas se há algo que me revolta e que não consigo compreender é a surdina específica que a classe política continua a fazer sobre determinados assuntos, que preocupam verdadeiramente os cidadãos, como se não percebessem que é este um (talvez dos principais) motivos que leva tanta gente a afastar-se da política (daqueles incómodos que não se precisam de se servir dela mas, porventura, servi-la a ela e à comunidade) e se traduzem em níveis de descrédito brutal e que levam a índices de abstenção atrozes. Falo, por exemplo, do apelo de tantos professores, auxiliares, Pais, e outros membros da comunidade  educativa face ao que está a acontecer nas escolas! Se se compreende (ainda que eu não os aceite!) os motivos económicos pelos quais não se avançou pelo encerramento de todos os estabelecimentos de ensino, exige-se que esta situação seja alterada (nem que seja parcialmente) quando as circunstância também se alteraram dramaticamente.

Falo também das excepções abertas aos ajuntamentos, onde se é verdade que existem limitações legais a que se tomem medidas proibitivas de reuniões partidárias, é imoral e digno de ideologias ditatoriais (se dúvidas existissem) persistir nesses mesmos eventos. Falo, para dar apenas mais um exemplo, na falta de concretização de fiscalização nos locais de trabalho, bares e cafés, assim como do alargamento do teletrabalho quando as funções sejam compatíveis a todo o território nacional, já que não implica qualquer prejuízo económico e seria essencial para baixar um dos palcos onde o contágio tem sido mais elevado.

Uma palavra ainda aos agentes políticos, nomeadamente àqueles cuja posição, por extremismo partidário ou ideológico (ou até mesmo a estes já que em situações excepcionais se exige ainda mais bom-senso), nunca se limitou a ser “do contra” ou populista. É incompreensível que, enquanto a mancha de “vermelho covid” se alastra pelo país, na AR o apoio ao Estado de Emergência e à sua renovação se veja diminuído. Bem sei que abstenção não é voto contra, mas agora, mais do que nunca, exige-se clareza! E clareza é também assumir posições e, sobretudo, dar o voto em plenário em nome do que Portugal necessita.

Não estamos em fase de birras partidárias onde não se toma uma posição favorável por motivos menores. E se e quando os motivos forem relevantes, pois muito bem. Se é por falta de medidas concretas, por falta de conhecimento prévio dessas medidas que o deixem claro, exijam-no onde deve ser exigido, mas não deixem de ser agentes de saúde pública em altura pandémica, pois há tomadas de actitude políticas essenciais constitucionalmente como o é a renovação do Estado de Emergência até ao final do ano que tem e deve ser apoiado pelos partidos que não olhem apenas para o barómetro mas para o bem de Portugal. Nem que implique o sacrifício de um Natal em nome de todos aqueles, Covid e não Covid, que têm direito à saúde e precisam do Serviço Nacional de Saúde (ou até do Sistema Nacional de Saúde) para o garantir.

Opiniões há para todos os gostos e certo é que todos gostaríamos de dar conselhos ao Governo. Eu incluída. Mas também reconheço que estar ao comando e decidir numa circunstância desta não é fácil e há muito que gerir, controlar e contornar. Pode-se gostar mais ou menos do estilo de comunicação (eu abomino!), admirar ou estupidificar as principais personagens da DGS ou do Governo (eu estou claramente com o segundo verbo) ou até defender que muitos dos que agora se manifestam deviam era aumentar as vias de protesto ou defender que é uma má altura para sede de protagonismos televisivos e que é premente perceber que há sacrifícios que cabem a todos e que mais vale perder um mês para ganhar muitos outros. Mas acima de todas as opiniões, acima de gregos e troianos, há que defender o Direito Fundamental à saúde e a sua principal garantia em Portugal: o Sistema Nacional de Saúde!

Ana Soares

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