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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 13 de março de 2021

O que procurar na Primavera: a zelha

 Carine Azevedo apresenta-nos a zelha, uma das espécies da nossa floresta que mais lhe despertou curiosidade quando a viu pela primeira vez.

Foto: Schurdl/WikiCommons

Ao fim destes anos todos a trabalhar e a falar sobre florestas, percebi que a maioria das pessoas tem uma ideia errada sobre as florestas portuguesas.

Acham que são poucas as espécies que a constituem e que são principalmente espécies exóticas com objetivo de produção e pouco mais.

Na verdade, são inúmeras as espécies de árvores, arbustos e herbáceas que constituem a floresta nacional, e a sua grande maioria são espécies nativas, que transformam a nossa floresta num espaço de biodiversidade único, fazendo parte integrante de um dos ecossistemas mais ricos do mundo em diversidade vegetal.

A zelha (Acer monspessulanum), também conhecida como bordo-de-montepellier, é uma das espécies que compõem a floresta nacional e desconhecida de muitos. Foi uma das espécies que mais me despertou curiosidade quando a vi pela primeira vez.

Zelha. Foto: Zebulon/WikiCommons

E para que não tenham dúvidas sobre o significado de alguns termos usados, podem ver a sua explicação no final do texto.

A zelha

A zelha é um arbusto ou pequena árvore, que pertence à família Sapindaceae.

As folhas são caducas, simples, palmadas, relativamente mais pequenas que as das outras espécies do género Acer. Apresentam em geral 3 lóbulos – folhas trilobadas, margem inteira e um pecíolo longo, que pode chegar aos 7 centímetros. São ligeiramente coriáceas, verde-escuras e lustrosas na página superior e com uma leve pubescência nas axilas das nervuras, que as tornam glaucas na página inferior. No outono as folhas ficam com tonalidade amarelo, laranja ou vermelho. 

A floração ocorre entre março e abril e, tal como acontece com outras espécies do género Acer, a zelha é uma espécie polígama – planta que possui flores femininas, flores masculinas e flores hermafroditas no mesmo indivíduo. As flores são pequenas, verde-amareladas, dispostas em cachos pendentes. As flores surgem antes, ou simultaneamente com as folhas, e são muito melíferas. 

O fruto é seco – dupla sâmara, provido de asas membranosas, glabras e convergentes, de cor verde a avermelhada, quando jovem, e castanho-avermelhada após a maturação. O fruto mantém-se na árvore após a queda das folhas e as asas facilitam a diversão das sementes pelo vento.

Foto: Liné1/WikiCommons

A designação científica desta espécie está associada a algumas das suas características morfológicas. O nome do género Acer deriva da palavra latina ǎcěr, que significa “acerado”, ou seja, que corta, pontiagudo, afiado. Este termo refere-se à forma do ápice das folhas e também está associado à dureza da madeira da zelha, que terá sido utilizada pelos romanos para o fabrico de lanças. 

A designação monspessulanum refere-se à cidade de Montpellier, em França, local onde terão sido recolhidas as primeiras amostras desta espécie e onde foi descrita pela primeira vez para a Ciência. 

Resistência e longevidade 

A zelha é uma espécie de crescimento lento, que alcança uma grande longevidade, podendo atingir os 300 anos.

É uma espécie nativa da região mediterrânica. Em Portugal é espontânea a norte do rio Tejo, podendo encontra-se com maior frequência no centro e norte interiores, mas também na estremadura. É uma das duas espécies nativas do género Acer no território nacional.

Foto: Krzystof Ziarnek/WikiCommons

Ocorre em zonas de matos, baldios, bosques caducifólios ou mistos e em montes e montanhas baixas, muitas vezes em associação com outras espécies folhosas.

É uma árvore rústica, de plena luz que tolera mal o ensombramento, sendo uma das poucas espécies do género que aprecia a luz direta do sol, sobretudo na fase adulta. Prefere os solos calcários e secos, mas também cresce em solos ácidos. Suporta solos pobres e pedregosos, longos períodos de seca e possui uma grande resistência ao frio, suportando temperaturas até aos -23ºc.

A zelha exibe uma coloração interessante das folhas, durante o outono. Ficam amarelas, laranjas ou vermelhas, o que a torna uma espécie muito atrativa do ponto de vista ornamental. É comum como árvore ornamental, em parques e jardins, em alinhamentos de árvores de avenidas e alamedas, bem como em sebes. Pode ser plantado de forma isolada ou em grupo, formando pequenos tufos.  

É uma espécie muito apreciada entre os entusiastas do bonsai. As folhas pequenas e o hábito arbustivo respondem bem às técnicas para estimular a redução e ramificação dos ramos e das folhas.

Tem um papel ecológico muito importante. É uma árvore útil na estabilização de taludes e no combate à erosão dos solos, devido às suas raízes profundas. As suas flores atraem inúmeros insectos, em particular as abelhas, devido à abundância de néctar.

A madeira é dura, clara, densa e de boa qualidade, muito utilizada em trabalhos de marcenaria, carpintaria, torneamento e no fabrico de instrumentos musicais. 

Os áceres e as lendas

Alguns registos antigos referem que devido à sua dureza e resistência, a madeira de zelha terá sido utilizada na construção do famoso Cavalo de Tróia, protagonista na derrota dos troianos, uma das histórias narradas por Homero na Ilíada.

Na mitologia grega e romana, a zelha, bem como outras espécies do género, eram consideradas “árvores fatais” devido à particularidade das suas folhas se tornarem vermelhas, “cor de sangue” no outono. Os gregos dedicavam esta árvore a Fobos, deus do medo, que juntamente com o seu irmão Deimos, deus do terror, apoiaram o seu pai Ares, deus da guerra, em todas as batalhas.

Também para os celtas, os áceres eram árvores sagradas.

Atualmente podemos ver a folha de ácer na bandeira do Canadá. Desde o século XVIII, o ácer é considerado um símbolo do Canadá. Isto deve-se à predominância deste género nas florestas canadenses, tendo sido declarada como o “rei” das florestas e símbolo do povo.

Os áceres nativos

Para além da zelha, também o padreiro ou falso-plátano (Acer pseudoplatanus) é uma espécie do género Acer nativa em território nacional.

O falso-plátano é uma árvore de grande porte, que pode atingir os 30 metros de altura. De folha caduca, crescimento rápido e longa longevidade, pode viver entre 300 a 400 anos.

É uma espécie nativa do sul e centro da Europa e Ásia Menor. Em Portugal, surge espontaneamente a norte do rio Tejo, tendo preferência por regiões montanhosas.

É uma excelente árvore de sombra, devido à sua copa frondosa e densa. Tal como a zelha, também tem um papel fundamental do ponto de vista estético e paisagístico, sendo comum em parques e jardins, alinhamento em avenidas e alamedas. As suas folhas no outono criam um efeito visual bastante interessante além de ser uma espécie resistente à poluição urbana.

A zelha ocupa um lugar de destaque na minha lista de espécies nativas. Adoro as suas flores verde-amareladas, as suas folhas estreladas, bastante coloridas no outono e em particular os seus frutos que me lembram a minha infância. Recordo de os apanhar do chão, de os lançar ao ar e de os ver voar ao vento como se fossem pequenos helicópteros. Já alguma vez o fizeram? Se não, têm de experimentar.

Dicionário informal do mundo vegetal: 

Palmada – As nervuras da folha surgem da base foliar, junto à inserção do pecíolo, radiando em direção às margens, assemelhando-se, no aspeto geral, à mão com os dedos abertos. 
Lóbulo – Partes da folha com recorte pouco acentuado.
Folha trilobada – Que tem três lobos ou lóbulos
Pecíolo – pé da folha que liga o limbo ao caule.
Limbo – Parte larga de uma folha normal.

Carine Azevedo

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