terça-feira, 28 de dezembro de 2021

Duas aldeias de Bragança sem rede móvel nem para ligar o 112

 Estudo da Anacom aponta que nas aldeias de Guadramil e Petisqueira só há rede através do roaming de operadoras espanholas e nem sequer é possível ligar o 112.

© Octávio Passos/Global Imagens (arquivo)

Um estudo da Anacom sobre as comunicações no concelho de Bragança mostra que 17% das chamadas falham, ou seja, uma em cada 6 chamadas não foi estabelecida ou concluída com sucesso, e o serviço de internet também não é o desejável nas três operadoras.

O estudo aponta que nas aldeias de Guadramil e Petisqueira só há rede através do roaming de operadoras espanholas e nem sequer é possível ligar o 112. O presidente da Anacom diz ser urgente resolver este problema. "Foram feitas várias tentativas e não havia de todo rede e nesses casos que estamos a falar os operadores nacionais não conseguem ter rede utilizando a rede de Espanha. E como vimos em muitos outros locais ou não se consegue estabelecer chamadas ou a chamada vai abaixo. Isso é de facto muito preocupante", afirma João Cadete de Matos.

Maria Amélia, habitante de Petisqueira© DR

Em Petisqueira, aldeia que dista 30 quilómetros de Bragança, Maria Amélia é uma das 12 moradoras e confirma que a rede móvel utilizada é espanhola. "Aqui o que apanho é a Movistar e mesmo a televisão apanha melhor a espanhola do que a portuguesa", diz.

A solução passa pela utilização do telefone fixo, mas também este avaria com muita frequência. "Estivemos quase seis meses sem telefone, porque só vieram há oito dias a arranjar a avaria. E quando vem a chuva e a trovoada sem telefone fixo sentimo-nos isolados" conta.

Numa dessas situações, sem telefone fixo para poder ligar para o 112, Maria Amélia inventou uma solução: "Estava sozinha e tive de ligar para a Espanha para me mandarem vir uma ambulância portuguesa."

Dois quilómetros depois, fica Guadramil, uma aldeia com duas dezenas de habitantes, pertencente ao Parque Natural de Montesinho. Teresa Vargas, proprietária de um alojamento de turismo rural, traça o diagnóstico. "Para apanhar rede, vamos ao cimo do monte, na casa da floresta, ou lá em cima perto de Rio de Onor. Ou então utilizamos a internet, o WhatsApp, porque algumas pessoas têm internet, mas as pessoas de idade não podem ligar a não ser pelo fixo", revela.

Esforço, suor e lágrimas. É a expressão utilizada pelo marido de Teresa para transmitir o árduo trabalho que é necessário para conseguir realizar com sucesso, por exemplo, uma operação bancária. "Vou para o alto do monte, levo o telemóvel e entro na rede, comunico com a minha esposa em casa através da rede, vem o número identificador e envio para ela introduzir no sistema, se bem que às vezes ainda tenha de andar de um lado para o outro para ter melhor rede e com alguma chuva e frio pelo meio, e só depois é possível fazer a transação depois de muito esforço, suor e lágrimas", refere.

Para António Vargas, é de extrema gravidade que em muitas ocasiões não se tenha acesso sequer ao 112. "Se uma pessoa tiver um problema, por exemplo, um ataque cardíaco, não tem socorro possível. Não se poder acorrer ao 112 penso que é uma irregularidade grave", afirma.

Este casal conta mesmo que, quando começou o processo de vacinação contra a Covid-19, tiveram muita dificuldade porque com a falta de rede não recebiam as mensagens do Serviço Nacional de Saúde.

Fernando Pires

1 comentário:

  1. Uma situação deprimente, que deveria merecer mais atenção da parte dos governantes locais (Juntas de freguesia e CM) e que acentua as assimetrias entre o interior e o litoral! Como é que se pretende que haja fixação de pessoas no interior do País, se nem sequer se consegue resolver as questões básicas da comunicação e da mobilidade das populações? Aqui até será relativamente fácil de resolver, desde que se congreguem esforços com as operadoras de telecomunicações no sentido de atenuar essas mesmas assimetrias! Assim haja vontade de todos os agentes!

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