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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira..
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 18 de abril de 2022

O que resta das florestas primárias do mundo e onde se encontram?

 
O mundo perdeu um terço das suas florestas desde a última idade do gelo. A atividade humana tem vindo a alterar e a reduzir estes ecossistemas, reforçando a necessidade de proteger as florestas primárias e antigas que se mantêm sem perturbações. Conhecer as áreas que subsistem e onde se localizam as florestas antigas remanescentes é essencial para as proteger, mas esta é uma informação complexa.

No final do último período glacial (glaciação de Würms), há cerca de 10 mil de anos, o clima começou a aquecer, o que permitiu a expansão da vegetação e, também, da humanidade. Dessas florestas primárias pouco nos resta: perdemos cerca de um terço da área de floresta e metade – cerca de mil milhões de hectares – desapareceu no último século.

Florestas, prados e matos têm vindo a ser substituídos por áreas agrícolas e de pastagens, de tal forma que quase metade da área habitável do planeta está ocupada por agricultura: 77% por pastagens e culturas para alimentar gado e 23% por áreas agrícolas para alimentação humana, segundo o Our World in Data.

A conversão de terras florestais em áreas agrícolas é considerada a maior ameaça no que respeita à transformação dos ecossistemas a nível mundial. A instalação de pastagens para o gado, as plantações de palma para a produção de óleo, assim como de soja, cacau, borracha, café e árvores para fibra de madeira, em países tropicais, são responsáveis por mais de metade da desflorestação mundial.

Só a instalação de pastagens para o gado representou 36% da perda de coberto florestal para a agricultura, entre 2001 e 2015, e quase metade ocorreu no Brasil. As plantações de palma para produção de óleo foram responsáveis por 8,3% de desflorestação e a produção de soja por mais 6,5%. As restantes plantações (cacau, borracha, café e fibras de madeira) contribuíram conjuntamente para outros 6,4% de perda de área florestal – cerca de 2 milhões de hectares (Mha) cada uma.

A Global Forest Watch (GFW) é outra das organizações que disponibiliza informação sobre perdas e ganhos de área florestal a nível mundial. De acordo com os dados desta plataforma, entre 2001 e 2012, foram perdidos, a nível global, 190 milhões de hectares (Mha) de áreas cobertas por árvores (coberto arbóreo). Se considerarmos o período entre 2001 e 2020, a perda de coberto arbóreo ascende a 411 Mha, dos quais 69,5 Mha na Rússia e 59,8 Mha no Brasil. Estes valores referem-se à perda registada unicamente em áreas com mais de 30% de cobertura arbórea e não incluem o ganho de novas zonas arborizadas ou florestadas.

Para os ganhos, a mesma GFW considera áreas com mais de 50% de cobertura arbórea e os dados que disponibiliza revelam que, globalmente, entre 2001 e 2012, se ganharam 80,6 Mha, das quais 16,2 Mha na Rússia e 13,8 Mha nos Estados Unidos.

Mesmo sendo estatísticas diferentes, com áreas de ganhos e perdas não comparáveis, olhando para os valores reportados entre 2001 e 2012 (ganho de 80,6 Mha e perda de 190 Mha) é visível um balanço negativo. Embora a desflorestação seja uma realidade, é notório também que existem novas áreas florestais a surgir. Se é certo que elas não substituem as florestas maduras que se perderam, os ganhos não podem ser ignorados nas análises de dinâmicas florestais.

A FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura publica também, regularmente, relatórios, que contabilizam perdas e ganhos de áreas florestadas. Os mais recentes indicadores globais reportados por dois destes relatórios – o Global Forest Resources Assessments (FRA2020) e o The State of the World’s Forests (SOFO2020) – são unânimes quanto à diminuição da área global de floresta. Ambos indicam também que o ritmo de desflorestação tem vindo a abrandar e que a agricultura continua a ser a principal razão para a perda de florestas.

O que são florestas primárias? Definições e indicadores

No entanto, nem toda as áreas florestais que se têm perdido são florestas primárias.

Além de inventariar a floresta mundial, com base em dados reportados pelos vários países, a FAO identifica no FRA2020 diferentes tipos de florestas, dividindo a área florestal global em floresta que se regenera naturalmente (sem intervenção humana) e floresta plantada.

Na floresta plantada incluiu as plantações florestais, normalmente para produção de madeira ou fibra, e as outras florestas plantadas, que resultam de florestação ou reflorestação humana, como é o caso da maior parte da área florestal portuguesa. Na floresta que se regenera naturalmente, quantifica ainda aquilo que designa por florestas primárias, constituídas por espécies autóctones e sem indícios de intervenção humana.

De acordo com a FAO, estas são florestas de espécies nativas, naturalmente regeneradas, sem sinais visíveis de atividades humanas e onde os processos ecológicos não se encontram significativamente perturbados.

De forma semelhante, um outro relatório – o State of Europe’s Forest (SoEF 2020) – divide a área florestal europeia em plantações florestais, estabelecidas artificialmente e intensivamente geridas, florestas seminaturais com algumas características de ecossistemas naturais e florestas não perturbadas por atividades humanas.

As florestas primárias mundiais ocupam entre 1,11 mil milhões de hectares e 1,28 mil milhões de hectares, de acordo com diferentes entidades. Estão localizadas principalmente no Norte do planeta e na África e América equatoriais: florestas boreais e florestas equatoriais das bacias hidrográficas dos rios Amazonas e Congo.

De acordo com diferentes organizações e estatísticas, temos, por isso, diferentes abordagens para identificar e quantificar as áreas de florestas primárias no mundo:

– Plataforma Our World in Data: dos 4 mil milhões de hectares de floresta contabilizados em 2017, 1,28 mil milhões de hectares (32%) eram florestas primárias (de acordo com a definição da FAO).

– Relatório global FRA2020: em 2020 existiam cerca de 1,11 mil milhões de hectares de florestas primárias (cerca de 34% da área florestal global). Mais de metade desta área (61%) encontra-se em 3 países: Federação Russa, Brasil e Canadá (só na Rússia existem 255 milhões de hectares, cerca de 23% da floresta primária global). Na Europa, excluindo a Rússia, estimaram-se 4,18 milhões de hectares de floresta primária, 3% da área florestal reportada e 0,4% das florestas primárias a nível global.

– Relatório europeu SoEF2020: (com dados reportados por apenas 33 países), estimou a área de florestas não perturbadas por atividades humanas (na Europa, excluindo a Rússia) em 4,684 milhões de hectares, o correspondente a 2,2% da floresta da região. De acordo com esta fonte, Portugal tem apenas 0,67% da sua floresta intocada, cerca de 22,24 mil hectares.

– Mapeamento Intact Forest landscapes: outra das iniciativas que mapeia áreas de florestas sem indícios de atividade humana, a nível global, é a Intact Forest Landscapes. O O mapa de paisagens florestais intactas resulta de um trabalho colaborativo e foi atualizado em 2020, ano em que contabilizou 11,3 milhões de quilómetros quadrados, ou seja, 1,13 mil milhões de hectares de florestas primárias. Estas áreas cobriam 9% da superfície terrestre liberta de gelo e incluíam 20% do coberto arbóreo global. As maiores áreas de floresta intacta encontravam-se nas bacias do rio Amazonas, rio Congo e nas florestas boreais no Norte do planeta.

Refira-se que a Intact Forest Landscapes define paisagens florestais intactas como uma extensão contínua de ecossistemas naturais (florestais e não florestais) integrados em áreas de floresta sem sinais de atividade humana significativa, que se prolonguem por uma área de pelo menos 50 mil hectares, com mais de 10 quilómetros de largura.

As florestas mais recônditas tendem a ser consideradas áreas naturais intactas. Contudo, estudos recentes têm vindo a mostrar que até a floresta Amazónica foi influenciada por atividades humanas no passado, tendo a domesticação de plantas um papel importante no que são hoje estes ecossistemas.

Florestas primárias na Europa: raras e fragmentadas

Nos últimos anos, a consciencialização sobre a necessidade de manter áreas naturais intocadas tem aumentado. Na Europa, onde estas áreas são escassas, têm sido várias as iniciativas de identificação e mapeamento de florestas primárias, antigas, naturais e/ou primitivas, com vista à sua proteção e restauro.

A Estratégia da Biodiversidade para 2030, da Comissão Europeia, estabeleceu como um dos seus objetivos proteger todas as áreas de floresta primária e antigas remanescentes na Europa. Neste sentido, e para ajudar a tomar decisões informadas para a implementação destas medidas, o EFI – European Forest Institute publicou um documento que define o que são florestas antigas e reúne evidências da sua existência na Europa, medidas para as proteger e manter, assim como benefícios e consequências da sua manutenção e desenvolvimento.

Com o mesmo objetivo, o JRC – Joint Research Centre publicou uma avaliação do conhecimento e dos dados espaciais existentes sobre florestas primárias e antigas na Europa.

Além das estatísticas oficiais da FAO e da Forest Europe, estes documentos mencionam um trabalho desenvolvido com base em vários dados espaciais existentes na Europa, o qual deu origem ao primeiro mapa conhecido da localização de todas as florestas primárias ao nível da Europa, a EPFD – European Primary Forest Database.

Esta base de dados resulta de um esforço voluntário conjunto de vários países europeus: cada país atribuiu um nível de “naturalidade” às suas florestas (de acordo com a classificação descrita por Buchwald, em 2005, que previa 14 níveis de naturalidade, sendo o nível mais elevado – n10 – as florestas primitivas intocadas e os níveis mais baixos – n1, p4, p3, p2 e p1 – as diferentes florestas plantadas). Foram consideradas para a EPFD as florestas que perfazem os cinco níveis de “maior naturalidade”: nível n10 – floresta primitiva; n9 – floresta virgem; n8 – floresta “fronteira”; n7 – floresta “quase-virgem”; n6 – floresta “idosa” e n5 – floresta não tocada há muito tempo (mais de 60-80 anos).

Na sua primeira versão, de 2018, este esforço de compilar e mapear as manchas de florestas primárias que subsistem numa Europa com uma intensa utilização do solo identificou 1,4 milhões de hectares de florestas primárias em 32 países europeia (embora com falta de dados de vários países), correspondentes a cerca de 0,7% da área florestal. Muitas das florestas identificadas estavam localizadas em “Áreas protegidas”, mas apenas 46% estavam classificadas (de acordo com as categorias da IUCN) como “Reservas naturais estritas” ou “Áreas silvestres”.

A maioria das florestas primárias identificadas localizam-se no Norte da Europa, nas regiões boreais e alpinas. A região Macaronésica (a que pertencem os arquipélagos dos Açores e Madeira) tem também uma elevada proporção de florestas primárias. A Floresta Laurissilva da Madeira contribui com 15,1 mil hectares, o equivalente a 1,5% do território desta região biogeográfica.

A versão da EPFD atualizada em 2021 mapeia 41,1 milhões de hectares de florestas primárias em 33 países (37,4 milhões de hectares na Rússia), destacando que as florestas primárias na Europa são raras e estão localizadas em áreas remotas, fragmentadas em pequenas parcelas, continuando a sofrer pressões diversas que levam à diminuição da sua área. A sua distribuição irregular vem reforçar a necessidade da proteção das florestas primárias na Europa.

Portugal tem, de acordo com a versão de 2021, cerca de 1,11 mil hectares de floresta primária no território continental (cerca de 0,034% da floresta nacional e 0,012% do território continental) e 14,64 mil hectares de floresta Laurissilva na Madeira (cerca de 45,5% da floresta e 18,25% deste arquipélago), totalizando 15,75 mil hectares de floresta primária.

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