sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

Restaurar o Património, Preservar a Memória | Museu do Abade de Baçal

 No passado dia 4 de Fevereiro, o Museu do Abade de Baçal, em Bragança, inaugurou a sua mais recente exposição: Restaurar o Património, Preservar a Memória. Esta mostra, com curadoria de Jorge da Costa e Georgina Pessoa, dá luz a obras que se encontram normalmente nas reservas do Museu e que correm o risco de desaparecer devido ao seu estado de conservação.
O proximArte esteve presente no evento de inauguração e este artigo serve, então, para partilhar esta tão necessária iniciativa de angariação de fundos levada a cabo pela instituição brigantina.


Tendo chegado ao Museu do Abade de Baçal um pouco antes de se dar início à cerimónia de inauguração, consegui ver esta exposição com a sala vazia. Não interessa aqui avaliar a disposição das peças, mas sim ter tempo para parar e ouvir o que elas nos dizem – entender como as podemos ajudar a recuperar o brilho que outrora tiveram. Restaurar o Património, Preservar a Memória serve exactamente para isso: sensibilizar a população (particulares e empresas) a contribuir para a recuperação e salvaguarda deste património.

Quando entramos nesta sala, temos imediatamente oportunidade de consultar um dossier que nos mostra os condition reports de algumas das peças expostas. Estes relatórios/documentos falam de todos os pormenores das obras, do seu estado de conservação, qual o tipo de restauro que necessitam e qual o custo do procedimento a realizar – e deixo aqui uma pequena nota para realçar o facto de, neste valor, fazerem questão de incluir o tempo gasto pela pessoa que o irá realizar.

Estes dados são uma base para o visitante ter uma noção de qual a quantia necessária angariar não só por cada peça, mas também no conjunto. E há de tudo um pouco, entre peças que precisam de um investimento de 2.000€ e outras cujo valor do procedimento ultrapassa os 12.000€ – tudo depende do tipo de peça e da intervenção necessária para o seu restauro.




Autor desconhecido, Circuncisão, óleo sobre madeira, século XVI.

Deixo mais uma nota para dizer que é de louvar o facto da equipa do Museu do Abade de Baçal ter escolhido 25 peças tão variadas, que vão desde a Cerâmica, o Desenho, a Pintura sobre vários suportes, o Mobiliário e até Documentos. Cada uma delas nos mostra descaradamente porque precisa de ajuda: desenhos de Domingos Sequeira que quase já não se vêem devido a camadas de sujidade; espelhos em falta; pinturas com as tábuas de suporte partidas; telas craqueladas; peças de cerâmica e de alabastro com bocados partidos; peças de madeira policromadas quase já sem cor; entre outros. É-nos inevitável pensar quantas mais peças por todo o país se encontram na mesma situação e o quão triste para o património português seria que elas desaparecessem para sempre por falta de verbas para a sua melhor conservação e acções de restauro.

É propósito desta exposição sublinhar não apenas a incontestada importância histórica, artística e estética destes objectos, apresentados aqui com as suas múltiplas lacunas e vulnerabilidades, mas, sobretudo, alertar para a urgência da sua recuperação e valorização, assim como do seu estudo/investigação e divulgação.

– Museu do Abade de Baçal, website.

Esquerda: Autor desconhecido, São José, madeira dourada estofada e policromada, século XVII (?). // Autor desconhecido, Figura de Mulher, madeira dourada estofada e policromada, século XVI/XVII (?).

Caneca Antropomórfica, fabrico atribuível às Fábricas de Cerâmica do Porto ou Vila Nova de Gaia, faiança vidrada e policromada, século XIX.

A inauguração foi presidida pela Dr.ª Laura Castro, Directora Regional da Cultura Norte, e pelo Dr. Jorge da Costa, Director do Museu do Abade de Baçal e da Domus Municipalis de Bragança. Sabemos que, todos os anos, o orçamento do Estado atribuído à cultura é bastante reduzido e se pensarmos que o mesmo tem ainda que ser dividido por inúmeras vertentes e instituições, pouco sobra para que cada uma delas possa concretizar todos os projectos necessários para o seu melhor funcionamento. Posto isto, não surpreende que tanto o discurso da Dr.ª Laura Castro como o do Dr. Jorge da Costa tenham recaído essencialmente sobre a falta de verbas que os espaços museológicos, e aqui em particular o Museu do Abade de Baçal, têm para conseguir garantir o restauro de várias peças que integram as suas reservas. A exposição surge, então, como um caminho extra para conseguir meios monetários extra para concretizar as acções necessárias, sendo a primeira grande iniciativa proposta pelo que é o novo director do espaço.


Autor desconhecido, Nossa Senhora das Dores, óleo sobre tela, século XVII.


Há que saber elogiar uma instituição que arregaça as mangas para cuidar do que é seu, quando o Estado falha repetidamente nesse sentido. Que se sigam mais exemplos para evitarmos a perda de mais património nas nossas instituições museológicas e para impedirmos que obras permaneçam nas reservas durante décadas sem verem a luz do dia e sem se mostrarem a quem visita os espaços que as acolhem.

Estas obras até agora escondidas nas reservas tiveram finalmente a oportunidade de sair, de ser estudadas e de se mostrar à população ao mesmo tempo que pedem por ajuda. Quando visitarem o Museu do Abade de Baçal têm a oportunidade de contribuir para esta iniciativa através de uma caixa de doações; se não conseguem deslocar-se a Bragança, nada temam, pois brevemente o website do MAB terá um meio para receber doações online. Também por via informática terão a oportunidade de acompanhar todo o processo de crowdfunding.

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