sexta-feira, 21 de julho de 2023

Os Jesuítas, primeiros habitantes do Seminário


...continuação

Como vimos, uma grande parte do actual Seminário já estava feita em 1545 com destino a freiras clarissas e provavelmente só se concluiu em 1561, ano em que tomaram posse dele os Jesuítas, cuja ordem fora introduzida em Portugal em 1540.
Cardoso relata, envolto em crédula lenda, o caso da seguinte maneira:
«Milagroso principio teve o Collegio de Jesus da cidade de Bragança. Foi o caso (segundo constante tradição) que os cidadãos, e mais nobres della, vendo que não tinham convento de Religiosas, onde podessem recolher suas filhas, escolhendo o melhor sitio, e o mais aprazivel, e alegre daquella cidade, o pozeram em effeito, não perdoando a gastos e dispendios, com que sahiu em breve perfeitissimo.
Neste comenos appareceu na dita cidade um clerigo, que mostrava ser homem de boa vida, o qual se recolhia no Hospital e delle saía a fazer doutrina, prégar a palavra divina, administrar os Sacramentos e tratar da salvação das almas, com grande edificação e proveito espiritual daquelle povo.
E sendo julgado de todos por padre da Companhia de algum dos Collegios de Braga, ou do Porto, que já neste tempo estavam fundados, acordaram entre si, que convinha admittir nella esta sagrada religião e dar-lhe o novo convento para sua morada. E communicado este negócio com elle respondeu: que a eleição lhe parecia mui acertada, mas que primeiro era necessario dar conta disto a S. Francisco de Borja (então Commissario Geral de Hespanha), que neste comenos se acha achava em Valhedolid. E que elle seria o mensageiro juntamente com alguma pessoa principal do governo.
O Senado escolheu então ao licenceado Manoel Gomez Corrêa, vereador mais velho. Postos ambos a caminho em Alcanizes, logar já de Castella, desappareceu o padre, com grande mágoa e sentimento do companheiro, mas como isso era obra do Ceu, não desistiu da jornada, chegou a Valhedolid, deu conta ao Santo Commissario de tudo quanto se havia passado: e admirado do successo, entendendo que devia ser algum anjo, em figura de padre da Companhia, recorreu á oração, para saber se Deus se servia desta offerta, levantado della respondeu: que não queria ir contra a Divina vontade, e assi que acceitava o Collegio e a fundação delle em nome do padre Santo Ignacio Geral da Companhia. Pelo que deu licença para que o provincial de Portugal mandasse logo religiosos para aquelle novo Collegio, os quaes tomaram delle posse com grande alegria de todos, anno de 1561, não deixando de interpôrem sua autoridade o bispo de Miranda D. Antonio Pinheiro, e o duque D. João, princepe de eximia piedade, dotando o de algumas egrejas e rendas bastantes, para sustento de dez ou doze religiosos, que aqui rezidem de ordinario, ensinando aos naturaes a lêr, escrever e contar e depois latinidade e theologia moral, para poderem ser sacerdotes»(678). Sempre mantiveram a regência destes estudos enquanto não foram expulsos.
Como indemnização pelo trabalho deste ensino, a câmara obrigou-se a dar anualmente aos padres deste colégio 100$000 réis (679).
Ao tratarmos dos bragançanos ilustres teremos ocasião de falar nos Jesuítas distintos desta casa.
Em 18 de Junho de 1565, fez o rei D. Sebastião mercê aos padres do colégio da Companhia de Jesus de Bragança de uma propriedade composta de moendas, pisão, horta e terras, no Sabor, termo de Bragança, que fora confiscada para a fazenda real a Jácome Luís à conta de dívidas de seu filho, Jerónimo Sarmento, de quem era fiador (680).
Esta propriedade ainda hoje tem o nome de Moinha dos Padres. É uma moenda magnífica, a melhor de quantas existem no Sabor, em terras de Bragança, e vale passante de dois contos de réis.
Também foi dos mesmos padres a quinta chamada da Rica Fé perto de Bragança, sem dúvida a melhor propriedade que há em terras bragançanas.
Foram os Jesuítas que a juntaram e cercaram do muro que hoje tem.
Em 20 de Julho de 1571 despachou D. Sebastião em Sintra favoravelmente um requerimento dos padres do colégio de Bragança, no qual pediam autorização para possuírem a quinta da Rica Fé, composta de propriedades por eles compradas, e entre outras uma à Misericórdia de Bragança. Alegavam como causa o poderem nela sustentar carneiros para seu gasto e alívio dos doentes (681).
É certo que no princípio da monarquia portuguesa (682) já havia propriedades no local dessa quinta conhecidas pelo nome de Rica Fé, mas os Jesuítas é que as valorizaram. No reinado de D. Sancho II passou uma
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(678) CARDOSO, Jorge – Agiologio Lusitano, ao dia 3 de Junho. Ver o capítulo sobre a igreja de Nossa Senhora do Loreto, p. 298.
(679) LOPO, Albino – Bragança e Benquerença, p. 27.
(680) Documentos existentes no arquivo da casa da Rica Fé.
(681) Ibidem.
(682) Inquirições de D. Afonso III, «Julgado de Bragança».
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dessas propriedades, metade por compra e outra metade a título de bens de alma, para os monges do mosteiro de Moreruela em terras de Leão(683).
Estes monges eram muito ricos e tinham largas fazendas na região bragançana, como se vê no tomo III desta obra.
Em 13 de Junho de 1743, despachou favoravelmente a Câmara de Bragança o requerimento do reitor e padres do colégio da Companhia de Jesus dessa cidade, que pretendiam construir um pontão no rio Sabor junto à moenda que ali tinham para passagem dos seus gados e da gente que lá ia fazer as farinhas sem ter de ir à ponte que ficava distante (684).
Este colégio dos Jesuítas em Bragança tinha também a quinta de Vilar do Monte, concelho de Macedo de Cavaleiros, doada por D. Filipa Mendes.
Supõe-se ser obra daqueles religiosos a capela do Espírito Santo no termo da povoação. Esta doação é de Fevereiro de 1562 (685).
Além destas doações, o mesmo rei D. Sebastião anexou a este colégio as rendas da igreja dos Cortiços; o duque D. Teodósio I, os terços de Penhas Juntas e as igrejas de Parâmio e Dine; D. Julião de Alva, bispo da diocese, oitenta mil réis de juro real e seu sucessor D. António Pinheiro, as de S. João de Paçó e Santa Maria Madalena de Grijó, confirmando Gregório XIII por bula de 1574 estas anexações in perpetuum(686).
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(683) Inquirições de D. Afonso III, «Julgado de Bragança».
(684) Arquivo Distrital de Bragança, Livro do Registo da Câmara de Bragança, fl. 122 v.
(685) BORGES – Descrição Topográfica… D. Filipa Mendes era de origem nobre, viúva de Gaspar Jorge Carneiro, filho do doutor Francisco Jorge, desembargador do Paço, instituidor de um morgadio com obrigação de seus administradores usarem sempre o apelido Jorge. Este morgadio passou depois ao alcaide-mor Lázaro de Figueiredo Sarmento.
(686) Ibidem.
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continua...

MEMÓRIAS ARQUEOLÓGICO-HISTÓRICAS DO DISTRITO DE BRAGANÇA

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