terça-feira, 1 de agosto de 2023

Barreiras, obstáculos e precipícios de Bragança dificultam a vida aos cegos

 Andar pela rua, por vezes, é uma aventura para os cegos


Francisco Alves, de 72 anos, residente em Varge, no concelho de Bragança, começou a ter problemas de visão aos 14. Depois perdeu-a completamente. Andar pela cidade, por vezes, é uma aventura. O ex-professor de Filosofia diz que nunca sofreu acidentes graves mas há algumas barreiras muito perigosas, nomeadamente junto à Casa do Professor, no teatro municipal e numa parte do passeio da Rua da República.

As barreiras são muitas e o que está a faltar é que quem as pode corrigir as veja. “Tem havido alguma preocupação, não muita, dos autarcas, para resolver alguns problemas, nomeadamente o rampeamento dos passeios, que para uma pessoa com carro de bebé é muito importante, por exemplo. Mas, por exemplo, há autarquias com um trabalho mais aprofundado, como a de Viseu, mas é um tema novo, não chegou ainda a todas as autarquias”.

Francisco Alves, que tem dedicado bastante tempo a recolher informações sobre o que pode representar perigo, para, depois, apresentar à câmara, de forma a haver correcção, receia que um dia um acidente grave possa acontecer. “Um amigo meu ia a andar, em Coimbra, e desorientou-se. Havia um precipício, numa rua normal, de mais de 5 metros. Ele caiu de cabeça e morreu. Acho que se aqui houvesse uma desgraça dessas, numa destas barreiras, as pessoas iam ficar muito tristes”.

Passeios danificados, acesso às passadeiras com lancil elevado, não marcação das passadeiras, vegetação alta: são alguns dos obstáculos de que Nuno Rodrigues se queixa em Bragança, onde vive. É cego desde 2018 e admite que há zonas da cidade que são verdadeiros obstáculos. “Há uma rua que desce junto às estufas, no passeio da direita, está totalmente danificado e as árvores têm ramos muito baixos. É esse caminho que estou a aprender a fazer. Tenho o passeio danificado e os ramos das árvores a tocarem-me sempre na cara”.

As passadeiras são outro dilema. São poucas as que estão sinalizadas e adaptadas para pessoas com deficiência. “Fora da Avenida Sá Carneiro não há passadeiras com marcação. É difícil saber onde está a passadeira. Nesses casos têm que haver a aprendizagem do caminho, o que nem sempre é fácil, porque basta um pequeno desavio do ponto de referência para se ficar baralhado”.

Há dois anos a Câmara de Bragança aderiu ao projecto “Cultura para Todos”. O objectivo seria tornar os equipamentos culturais municipais mais acessíveis. O IPB fez um estudo, que mostra que há museus em Bragança que não são claramente acessíveis para todos, diz a coordenadora, Cláudia Martins. “Definitivamente, quando as pessoas dizem que a cultura é para todos não sabem do que estão a falar. Há espaços que são impossíveis de visitar por pessoas com cadeiras de rodas. Para além das questões físicas, há uma série de falhas para pessoas com deficiência visual ou auditiva. Creio que uma das grandes responsabilidades do município é dar formação aos funcionários para que estejam aptos, pelo menos, para o mínimo”.

Apesar do diagnóstico e do projecto até já ter terminado, o município ainda não implementou soluções para tornar os espaços acessíveis. Ainda assim, foram criados textos com audiodescrição, textos em linguagem simples, vídeos em língua gestual portuguesa, maquetes e plantas tácteis e textos em braile.

O Plano de Acção de Mobilidade Urbana Sustentável, que compõe o Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano, apresentado em 2017, previa definir várias acções por forma a que a mobilidade dentro da cidade fosse “facilitada”. Tentámos chegar à fala com o presidente da câmara de Bragança, Hernâni Dias, para perceber como se está a implementar o plano e quais as justificações para as barreiras que existem. Até ao momento não conseguimos declarações do autarca.

Escrito por Brigantia
Jornalista: Carina Alves / Ângela Pais

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