quarta-feira, 25 de outubro de 2023

TRIBUNAL DECLARA NULO CONCURSO PARA CHEFE DE DIVISÃO NA CÂMARA DE MIRANDELA

 FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO JÚRI NAS NOTAS DOS CANDIDATOS NAS ENTREVISTAS ESTÁ NA BASE DA DECISÃO DO TRIBUNAL. MUNICÍPIO NÃO CONCORDA E VAI RECORRER.


O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Mirandela declarou nulo o despacho da presidente da Câmara de Mirandela, assinado em julho de 2020 e em que designou a nova chefe de divisão de Administração Geral, após proposta do júri do concurso para pessoal dirigente intermédio de segundo grau.

O TAF entende “ter sido afetada a transparência do procedimento concursal”, alegando que houve falta de fundamentação do júri para compreender as razões que presidiram à avaliação atribuída aos candidatos, no contexto da entrevista pública, “limitando-se a atribuir as pontuações que entendeu por bem dar a cada um dos candidatos, mas sem qualquer justificação ou motivação da sua decisão”, lê-se na sentença, a que tivemos acesso, datada de 16 de outubro. 

Perante esta decisão, o executivo municipal liderado por Júlia Rodrigues tem agora 90 dias para executar a sentença, anulando o despacho e iniciando novo procedimento concursal, mas também poderá recorrer para o Tribunal Central Administrativo do Norte. Confrontado com a sentença, o Município respondeu, através do advogado Paulo Veiga e Moura, para dizer apenas que o executivo “não concorda, de todo, com esta decisão” e, por isso, vai preparar recurso. 

Diga-se que, mesmo depois da decisão do tribunal de segunda instância, ainda há a possibilidade de um novo recurso para o Supremo Tribunal Administrativo. 

CASO REMONTA A 2020

A decisão do TAF de Mirandela é o resultado de uma ação administrativa contra o Município de Mirandela intentada por João Paulo Fraga, um dos candidatos do concurso para o cargo de Chefe de Divisão de Administração Geral da Câmara Municipal de Mirandela, cujo processo se iniciou em 19 de setembro de 2019 e terminou a 31 de julho de 2020, quando a presidente do Município, Júlia Rodrigues assinou o despacho que designou Elisabete Silva para o cargo, sob proposta do júri do referido concurso. 

Entre os vários pedidos feitos por João Paulo Fraga ao TAF de Mirandela, foi atendida a sua pretensão de anular o despacho de nomeação, por considerar que “não está clara a fundamentação das pontuações atribuídas pelo júri na entrevista pública”. O tribunal reconhece que não foi feito “um resumo conciso, mas objetivo, de cada uma das entrevistas feitas, e das razões pelas quais foram atribuídas distintas classificações a cada um dos candidatos, com a explicitação do melhor ou pior desempenho de cada um deles, permitindo assim compreender as razões pelas quais ambos foram avaliados de forma distinta”. 

A título de exemplo, o TAF de Mirandela considera que não é possível entender quais foram as razões que levaram o júri do procedimento a concluir “por que razão Elisabete Silva teve um desempenho merecedor da nota máxima de 20 valores, ao passo que o desempenho dos demais candidatos se terá mostrado compatível com notas iguais ou inferiores a 14,40 valores”. 

Entende por isso, que foi “afetada a transparência do procedimento concursal, posto que não resultou claro, perante todos os candidatos, nem diante o Tribunal, qual foi o raciocínio lógico prosseguido pelo júri para avaliar a entrevista pública de cada um dos candidatos da forma como os avaliou”. 

Ainda assim o tribunal deixa claro que não significa isto que as notas atribuídas padeçam de erro. “Significa antes que o Tribunal ficou impossibilitado de apreciar se houve, nessa avaliação, algum erro grosseiro, uma vez que não existe qualquer fundamentação das notas atribuídas pelo júri, no fator da entrevista pública, a cada um dos candidatos ao procedimento concursal”. 

O Tribunal conclui então que o despacho de nomeação exarado por Júlia Rodrigues “está eivado de vícios substanciais e formais, e que o aproveitamento do seu conteúdo se vê inviabilizado, devendo o mesmo ser anulado, com a expurgação dos seus efeitos da ordem jurídica”. 

SEGUNDO CASO NA AUTARQUIA 

Recorde-se que uma situação semelhante já aconteceu com um concurso para preenchimento de 22 vagas de técnicos superiores, realizado em 2009, quando o executivo Municipal era presidido pelo social-democrata José Silvano. 

Nesse caso, o tribunal também declarou nulo o procedimento concursal, alegando que houve falta de adequação da prova de conhecimentos ao exercício da atividade. Vários candidatos foram afastados do concurso sem serem avaliados com uma única pergunta respeitante à sua área de formação académica e profissional, concluiu o tribunal. 

De recurso em recurso, o caso chegou até ao Supremo Tribunal Administrativo, que mandou repetir o concurso. O que veio a acontecer em 2022, treze anos depois do primeiro.

Artigo escrito por Fernando Pires (jornalista)

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