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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 8 de outubro de 2024

NO TEMPO DA MONARQUIA

 
Havia um rapaz que disse para a mãe:
- Minha mãe, vou moirar.
E a mãe diz-lhe assim:
- Vai, meu filho.
- Queres a minha bênção, ou metade de um pão?
E o rapaz diz para a mãe:
- Eu quero a sua santa bênção.
E o rapaz foi ter a casa de um rico. Quando bateu à porta, diz ele assim:
- Querem-me aqui para criado?
Estava lá um velhote e disse-lhe:
- Podes ficar, rapaz, que eu vou-me embora. Mas olha: Nesta bacia de água nunca mexas.
O teu trabalho é pouco. É só tratar de três cavalos. Estão ali àquele canto três aguilhadas. Nunca lhe toques, que eu estou aqui há bastante tempo, e ainda lhes não toquei. Se pensares em te enforcar, puxa por aquela corda, que está naquele telhado.
E o velho foi-se embora.
O rapaz esteve lá muito tempo, sem mexer na água. Um dia, o rapaz disse:
- Para que quero aqui esta água? Vou-me lavar nela. Ao mesmo tempo que deitou com as mãos a água pela cabeça, ficou-lhe o cabelo todo dourado. Em seguida deu um pontapé nas aguilhadas, dizendo:
- Quero ver o que daqui vai sair. Ao mesmo tempo que o fez, saem--lhe três gigantes.
- Agora, pelo pouco, vou-me enforcar. E puxou pela corda que estava presa à trave.
Encheu-se o chão de dinheiro.
Depois disseram--lhe os três gigantes:
- Rapaz, tens que te ir embora, porque nos desencantaste.
Um dos gigantes disse ao rapaz:
- Se um dia te vires aflito, basta-te dizer:
- Valha-me aqui o meu cavalinho de cobre.
O segundo diz-lhe também:
- Se precisares de mim, diz:
- Valha-me o meu cavalinho de prata.
Depois, o terceiro:
- Pede-me o que tu quiseres, que te atenderei, dizendo:
- Valha-me o meu cavalinho de ouro.
Depois, o rapaz foi-se embora. Seguia por um vale. Viu um carneiro morto. Abriu-o e tirou-lhe a bexiga, e pô-la na cabeça para que lhe não vissem o cabelo dourado.
Depois foi andando até que foi ter ao palácio do rei. Deu umas voltas em redor do palácio do rei, até que viu o jardineiro. Ofereceu-se para criado. O jardineiro aceitou o rapaz para ajudante.
O rapaz, quando lhe apetecia, tirava a bexiga da cabeça.
Até que um dia, a princesa mais nova o viu. Apaixonaram-se um pelo outro.
O rapaz mandava-lhe todos os dias um raminho de flores.
Um belo dia, o rei pensou em casar as suas filhas e fez umas cavalhadas.
O jardineiro, como era amigo do rapaz, disse-lhe assim:
- Amanhã são as cavalhadas da filha mais velha do rei. Não queres vir?
O rapaz respondeu-lhe:
- Antes quero ficar ao sol no jardim.
Assim que o velho saiu, o rapaz pediu ao seu encanto:
- Valha-me aqui o meu cavalinho de cobre.
E pediu um bom cavalo e roupa ao consoante, para conquistar a filha mais velha do rei. O rapaz, quando entrou nas cavalhadas, tudo ficou admirado e a princesa gostou dele.
Quando o velho chegou ao jardim, já o rapaz lá estava deitado ao sol, como tinha ficado. E o velho, entusiasmado, Pôs-se a contar ao rapaz tudo o que viu na festa e disse-lhe:
- Apareceu lá um príncipe com o cabelo de ouro.
E o rapaz respondeu desinteressado:
- A mim o que me importa?
Ao outro dia o rapaz disse para o velho:
- Eu era capaz de pôr no cimo do jardim um tanque com quatro bicas de água a
correr.
O velho foi levar a novidade ao rei. Que era capaz de pôr no cimo do jardim quatro bicas de água a correr. O rei respondeu-lhe:
- Pois com pena de morte tens que as pôr.
O velho foi ter com o rapaz. Aflito, contou-lhe o que tinha dito ao rei, e o rapaz respondeu-lhe:
- Não lhe foras dizer nada. A mim não me importa.
Disse o rapaz:
- Valha-me o meu cavalinho de prata. Quero aqui um tanque com quatro bicas a deitar água, amanhã de manhã.
O rei, quando se levantou e viu aquilo, elogiou o jardineiro.
Depois, o velho disse para o rapaz:
- Queres ir às cavalhadas da filha do meio? São amanhã!
O rapaz respondeu-lhe:
- Antes quero ficar aqui a dormir.
O rapaz quando se viu só, pediu ao seu cavalinho de prata. Quero aqui um cavalo e boa roupa, que quero conquistar a filha do rei.
Assim que o rapaz lá chegou, ainda ficou maior espanto nas pessoas que da primeira vez.
E a filha do rei gostou dele.
Um dia, o rapaz e o jardineiro estavam conversando no jardim.
Diz o rapaz:
- Eu era capaz de pôr aqui, de hoje até amanhã de manhã, em cada canto do tanque uma laranjeira carregada de laranjas maduras.
O velho, ao ouvir aquilo, foi levar a novidade ao rei:
- Saiba Vossa Real Alteza que eu sou capaz de pôr em cada canto do tanque uma laranjeira carregada de laranjas maduras, de hoje para amanhã de manhã.
E o rei respondeu-lhe:
- Com pena de morte tens de as pôr.
O velho foi para ao pé do rapaz e disse-lhe:
- Eu disse ao rei que era capaz de pôr as quatro laranjeiras no tanque, carregadas de laranjas maduras. E ele disse-me, com pena de morte, que tinha de as pôr.
O rapaz disse-lhe:
- Então, se não és capaz, por que lhe foste tu dizer? Vou-te deixar morrer.
O velho foi-se deitar e o rapaz pediu ao seu encanto:
- Valha-me o meu cavalinho de ouro. Quero aqui em cada canto do tanque uma laranjeira carregada de laranjas maduras, mas que ninguém seja capaz de as cortar, a não ser eu e a princesa mais nova.
O rei convidou muitos reis e príncipes para ver aquilo. Mas as laranjas, só a princesa mais nova e o rapaz é que as colhiam.
Depois, o velhote disse para o rapaz:
- Queres ir às cavalhadas da filha mais nova do rei, que são amanhã?
Eu não quero falhar, – diz o velho.
E o rapaz respondeu-lhe: - A essa talvez vá, se encontrar quem me empreste um burro.
Desde que o velho saiu o rapaz arranjou um burro já velho e pôs-se a caminho.
Quando chegou a um atoleiro, o burro enterrou-se, e o rapaz começou-Ihe a puxar pelo rabo.
Quando passava um, dizia:
- Quando este lá chegar já os outros estão de volta. E outros riam--se, dizendo:
- Este tarde há-de chegar às cavalhadas.
Diz o rapaz:
- Valha-me o meu cavalinho de ouro. Quero aqui um cavalo e roupa ao consoante, para conquistar a filha do rei mais nova.
Quando lá chegou ainda foi mais admirado que das outras vezes, e a princesa também gostou dele.
Quando o rapaz saiu, vieram-lhe ao encontro dois príncipes.
- Tu conquistaste as três princesas mas não podes casar com elas três. Escolhe a que gostas mais e cede-nos as outras duas. O rapaz respondeu-lhes:
- Para mim quero a mais nova. Mas, antes que vos ceda as outras duas, tendes que me deixar selar as vossas nalgas com as patas do meu cavalo.
Quando o rapaz chegou ao palácio, vestiu-se com roupa simples e a bexiga na cabeça.
Deitou-se no jardim ao sol, e o velho foi ter com ele, e contou-lhe:
- Hoje ainda foi mais lindo do que das outras vezes.
O rei mandou chamar os dois príncipes e o rapaz apresentou-se com os três cavalos que tinha conquistado as princesas, mas em vez de ir vestido de príncipe, não foi. Ia de roupa simples e a bexiga na cabeça.
O rapaz disse para o rei:
- Saiba Vossa Real Alteza que fui eu quem conquistou as suas três filhas. Estes dois
príncipes vieram cá porque fui eu que lhas cedi. Para prova da verdade hão-de ter
as nalgas com as ferraduras escritas dos meus cavalos.
O rei respondeu-lhe:
- Eu não te dou a minha filha por bem empregue. Vai-te embora tu e ela. E assim se foram e casaram-se. O rapaz pediu ao seu encanto:
- Valha-me o meu cavalinho de ouro. Quero aqui um palácio muito superior ao do meu sogro, com quatro bicas de fogo no cimo do palácio.
O rei naquela manhã levantou-se tarde, porque a janela do seu quarto naquele dia não tinha a luz habitual. O rei veio à janela e viu aquele palácio superior ao seu.
Mandou perguntar quem lá estava.
De lá responderam-lhe:
- Se sua Real Alteza quer saber, venha cá pelo seu pé.
O rei mandou outra vez perguntar quem lá estava, se não que lhe declarava guerra.
- Se sua alteza quer saber, que venha cá pessoalmente.
O rei já cheio de medo pôs-se a caminho. Qual não foi o seu espanto, quando viu sua filha e o seu genro. Ficou muito satisfeito e mandaram fazer logo uma festa e assim acabaram todos felizes.

RECOLHA (1985) de Maria Celeste Fernandes, Pai-Torto, Mirandela.
Título: CANCIONEIRO TRANSMONTANO 2005

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