terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Populismo e Democracia ou “gato por lebre”

 Por: César Urbino Rodrigues
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")


Quem se preocupa com as consequências do crescente populismo, não pode deixar de se questionar sobre as suas causas e como combatê-lo. Para o efeito, temos que vasculhar, na História, episódios semelhantes aos do populismo dos nossos dias. 

1 - Curiosamente, é na Grécia antiga que se encontram as raízes da democracia ocidental, mas também a primeira manifestação do populismo. Com efeito, os primeiros «populistas científicos» foram os sofistas, que negavam a possibilidade de se conhecer a verdade, pelo que a ciência política não consistiria em demonstrar a validade de qualquer modelo de governação da “polis”, mas apenas em convencer os demais cidadãos de que o modelo do orador era melhor do que todos os outros. O importante, por isso, não era o modelo de governação em si, mas a capacidade de persuadir a opinião pública, nem que para o efeito se vendesse «gato por lebre».
2 - «Vender gato por lebre» tem sido uma constante na política, até aos dias de hoje, como se pode ver nos seguintes casos:
2.1 – Em primeiro lugar, na Revolução Francesa, a burguesia, querendo aceder ao poder, que era um exclusivo da nobreza e do clero, acenou aos servos da gleba com a lebre da «Liberdade, Igualdade e Fraternidade», a que eles depressa aderiram. Infelizmente, porém, a «lebre» prometida transformou-se em «gato» raquítico, espremido até aos ossos nas fábricas da burguesia, onde o zé-povinho continuou a ser o mesmo burro de carga, só que agora ao serviço dos novos governantes.
2.2 - Já no séc. XIX, perante o fracasso da Revolução Francesa, apareceu Marx a prometer a lebre do «paraíso na terra», através do combate sem fronteiras contra o seu principal inimigo, identificado com a burguesia capitalista, proprietária dos meios de produção – terras e fábricas – e do capital, que faria, dos seus detentores, pessoas intrinsecamente egoístas. Só que o «paraíso marxista», se existiu, foi apenas para os seus líderes: Lenine e seus sucessores, Mao-Tsé-Tung e família, Kim-il-sun e família, Fidel Castro e família, e assim sucessivamente. Ao zé-povinho tiraram-lhe o pouco que tinha - e até o pio, proibindo-lhe toda e qualquer contestação, que passou a ser crime contra o Estado -, concentrando o poder económico e o poder judicial no único partido autorizado, que, por sua vez, dependia totalmente da paranoia do seu líder, como ainda acontece, nos dias de hoje, na Coreia do Norte.
2.3 – Neste contexto, apareceram, no polo oposto, outros profetas a venderem também «gato por lebre», prometendo, por um lado, a aniquilação do inimigo comunista (e, no caso alemão, do inimigo judeu), e, por outro, a preservação e a exaltação da identidade nacional, a par do desenvolvimento económico e da paz social assente na defesa da Autoridade. Hitler, Mussolini, Salazar e Franco, copiados depois em vários países da América Latina, foram os seus principais protagonistas. 
Curiosamente, algumas das medidas preconizadas por estes novos messias pareciam decalcadas das vigentes nos países sob regime marxista, seu inimigo nº 1: eliminar a oposição, subordinar o poder judicial ao poder político, proibir a liberdade de imprensa, fomentar o ódio e a violência contra o «inimigo» e criminalizar toda e qualquer contestação.
2.4 – Depois duma época de alguma acalmia, em que a democracia vingou na maior parte dos países europeus, eis que começa a surgir, um pouco por toda a Europa, estendendo-se igualmente aos EUA e a alguns países da América do Sul, uma nova onda de populismo da extrema-direita fascizante, em que os candidatos à governação voltam a vender «gato por lebre», como são os casos de Trump, Milei e Bolsonaro.  Curiosamente, estes novos líderes da extrema-direita são apoiantes de Putin na sua tentativa de reconstruir o «império czar», invadindo alguns países vizinhos, como aconteceu há 3 anos à Ucrânia.
3 – Todos estes casos da História mostram-nos algumas circunstâncias comuns a todos eles: a multiplicação dos imigrantes, vindos dos países mais pobres do Terceiro Mundo para os países mais desenvolvidos da Europa Ocidental, muitos deles carregando consigo a cultura do fanatismo muçulmano; a existência dum problema, resultante não da Democracia em si, mas da corrupção, do clientelismo e do compadrio dos aparelhos partidários, que têm a sua causa primeira no egocentrismo do ser humano; a diabolização da classe política reinante, apresentada como a causa de todos os males da governação, com o subsequente incitamento ao ódio e à violência contra os políticos e contra os defensores do «status quo»; o recurso às meias verdades ou até às mentiras descaradas, confundindo verdade com mentira e vice-versa, de acordo com as suas conveniências; a estratégia do «gato por lebre», prometendo o paraíso, sob um novo regime, que, todavia, se manifesta bem pior que o anterior em termos de corrupção, de compadrio e de ataque às liberdades individuais e aos direitos humanos.
4 – Como ficou subentendido, a verdade destes factos, não é um exclusivo dos partidos totalitários, sejam eles da esquerda marxista ou da extrema-direita fascizante, já que os partidos democráticos também resvalam frequentemente para a estratégia do «gato por lebre», prometendo ao eleitorado o que este gosta de ouvir e não o que eles pretendem ou deviam fazer. Mas essa análise ficará para outro texto.

César Rodrigues


César Urbino Rodrigues
, natural da aldeia de Peredo dos Castelhanos, concelho de Moncorvo, estudou 9 anos no Seminário de Macau, fez a licenciatura em Filosofia na Universidade do Porto, o Mestrado em Filosofia da Educação na Universidade do Minho, com uma tese sobre «As Coordenadas fundamentais da Educação no Estado Novo», e o doutoramento na Universidade de Valhadolid, em Teoria e História da Educação, com uma tese sobre a «Representação do Outro No Estado Novo. Foi professor no ensino secundário, na Escola do Magistério Primário de Bragança, no ISLA de Bragança, no Instituto Piaget de Mirandela e DAPP na Escola Superior de Educação de Bragança.

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