(Colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Irei principiar esta nova incursão por uma afirmação que poderá gerar polémica. Que me perdoem os meus amigos Mirandeses, antecipadamente me penitenciando, igualmente, perante os meus amigos Mirandelenses… Em simultâneo me desculpem os meus amigos Podentinos, neste caso particular porque até tenho, com muito orgulho, costelas de Podence.
Os Pauliteiros são tão de Miranda, como as alheiras são de Mirandela (ou o folar é de Valpaços, só para sair do âmbito geográfico bragançano). Ou, daqui por cinquenta ou cem anos, dado o patamar superior que atingiram os «meus» Caretos de Podence (e muito bem, que “munta proa” tenho nisso!), algum estudioso venha a tomar como exclusivas estas três acepções: os Pauliteiros são de Miranda, as Alheiras são de Mirandela, os Caretos são de Podence. O que não é bem verdade… Ou seja, os Pauliteiros são, efectivamente, de uma região, a que ocupada foi pelos Zelas, a antiga «Civitas Zoelarum», assim como os Caretos o são. Já quanto ao Folar ou às Alheiras, são de todos…
Não me irei deter no Marketing, nem nos acasos da História, nem nas campanhas que alguns municípios, «puxando a brasa à sua sardinha», tão bem souberam impor. Assim como imposto foi o nome de um idioma, parte fazendo de um «sistema» Ásturo-Leonês Ocidental, com a exclusiva designação de «Mirandés». Nada me move contra ele, antes pelo contrário, até fiz questão de o aprender, tendo uma especial afeição pelo «Mirandés». Mas também fiz questão de aprender o Asturianu, que por lá não há sectarismos, não havendo «Oviedês», ou «Gijonês» ou «Avilês», é uno, regulado pela «Academia de la Llingua Asturiana». Assim como na Galiza há uma língua una, o Galego, com variantes regionais, mas não havendo o «Corunhês», ou o «Ourensês», só para mencionar duas das sua províncias.
Quanto às variantes do Leonês, não estão reguladas… Ou seja, aprendi uma língua que já foi falada no meu concelho (e noutros), nos quais subsiste com variantes dialectais, que mais correctamente deveria ser designada através de um nome genérico, tal como acontece com o dito Asturianu. Até poderia ser «Trasmontanês Oriental». Porque, de facto, é tão «Mirandês», como poderia ser «Vinhaês», «Bragancês», «Vimiosês», «Mogadourês» ou «Macedês»… Quem dúvidas tiver, faça o favor… de se pronunciar em «queimarês pestanês»… Nota adicional, para que dúvidas não restem: “tengo muita proua ne l Mirandés”! “E tamém tânhu munta proa na faladura q’aprendi co a nh’ábó Maria”! E talvez o «Mirandês» tivesse outro protagonismo e outra visibilidade se olhado fosse como ele, efectiva e historicamente é: um idioma que foi falado numa região abrangente. Assim, parece não passar de uma curiosidade em vias de extinção (o que muito me custa!).
Mas regressemos aos Pauliteiros… Os quais, históricos registos, são tão de Miranda como de… Vinhais, Bragança, Vimioso, Mogadouro ou Macedo! Ou seja, da região que era abarcada pelos Zelas (os «Zoelae» da literatura clássica)! Por isso ainda subsistem, no meu concelho, os Pauliteiros de Salselas! Já tendo havido outros… Por isso, também, por Bragança, já houve os Pauliteiros de São Pedro dos Sarracenos! E já houve mais… «Pauliteiros» que é uma designação contemporânea, que nos documentais registos eram «apenas» Dançadores. “Ó depeis”, à custa dos paus, ou dos palitos ou paulitos, ficou mais engraçado adoptarem esse nome. Que por território espanhol correspondente ao antigo território Zela, não há «Paloteros» ou coisa do género, há, simplesmente, «danzadores» e «danzadoras» da… «danza do paloteo». Cujas características são «iguaizinhas», com algumas variantes, às dos nossos «Pauliteiros». Que o magnífico Marketing fez, exclusivamente, tal como o «Mirandés», de… Miranda. É bonito, mas é falacioso, e retira-nos o conceito de região.
Como escreve um ilustríssimo autor, corroborando observações de outro insigne autor Mirandês, apesar de, em Portugal, os Pauliteiros estarem associados a Miranda do Douro e ao seu concelho, eles subsistem como elemento da cultura popular noutras regiões do distrito de Bragança. Porque se trata disso mesmo, tal como os Caretos, um «elemento da cultura popular», da cultura de um Povo, não de uma região específica! Bastará, para os que dúvidas tiverem, consultar a extensa documentação existente desde a Idade Média. Sei que dá “muntu trabalhinhu’e”, mas vale bem a pena! E até se poderá recuar a mais ancestrais tempos, nos quais viveram aos nossos antepassados Zelas, mais os seus vizinhos «Vacceos», ambos indicados como tendo origem celta. De onde, com muita probabilidade, provirá a tal de «dança dos paus», que de uma «dança guerreira» parece tratar-se. E os ditos Zelas, não foram exclusivos de Miranda…
Como estas incursões têm tendência para se alongar, tanta é a informação que subsiste sobre a nossa região, já cá virei noutra ocasião com mais «polémica»… Esperando não ser excomungado ou crucificado, especialmente pelos meus amigos que dizem, e muito bem, “proua an ser Mirandés”...
(Foto: Pauliteiros de Salselas)
Rui Rendeiro Sousa – Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer.
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas.
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana.
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros.
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.

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