Salvador Parente é o autor deste livro, o segundo volume relacionado com a cultura popular destas gentes trasmontanas - não é erro, é mesmo assim que prefere o autor designar os que por aqui moram, atrás dos montes.
As palavras e as expressões que compõem os textos desta obra formam espelhos que mostram imagens reais de uma cultura popular de raízes profundas, vivida e presenciada ao longo de muitos anos.
Repare-se no excerto que escolhemos apenas por estar mais à mão - o primeiro: A Floresta:
"Águas Santas é agora uma pequena aldeia trasmontana situada na vertente Sul da Falperra. Teve, aí pelos anos cinquenta, uns cento e tal fogos. Actualmente, andará à roda dos cinquenta, se tanto. É a povoação mais setentrional da freguesia de S. Tomé do Castelo e do concelho de Vila Real. Situa-se a uma altitude aproximada de 800 metros, a escorrer para Oeste numa encosta da Corvaceira.
É esta uma das ramificações mais agrestes e elevadas (1082m) da Padrela, constituída por um maciço granítico duma aspereza e tamanho invulgares, rasgada por fundas ravinas e sulcada por regatos caudalosos nos invernos de pluviosidade intensa, mas apenas com um fio de água nos verões de estiagem prolongada. Semeadas a granel, fontes de água cristalina fertilizam pequenos planaltos e vales, onde a erva fresca e tenra era antigamente o pão suficiente e exclusivo de rebanhos e manadas.
Há cerca de cinquenta anos, os Serviços Florestais invadiram toda a área de baldio - milhares e milhares de hectares - à força de ameaças e de multas aos lavradores dedicados à pastorícia; oferecendo magras geiras que mal pagavam as brochas dos socos; mas, naquele tempo em que a raposa andava por lá aos grilos, mesmo assim eram bastante exageradas, como recompensa do trabalho real efectuado.
- Tu num queres bir prà floresta, ó cousa?
- Bô, qui o meu pai num me deixa. E ò despois quem é que habia de ir prò monte co nosso gadinho?... E quem habia de gardar o meu menino?...
- Bem só um dia. Só pra ber... Aquilo é qui é ûa borga e ûa pândiga! Num se faz mesmo nadinha, e sempre de costa dreita. É comer e dromir. É andar debagarinho como quem pracura cos pés um penico no escuro e de braços cruzados, a dar de mamar às mãos. Espreita-se o guarda e os rondistas, e passa-se por lá o dia à ressa, atrás dûa fraga. (...)"
in:jornal.netbila.net
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