Professor catedrático em Engenharia Zootécnica, Carlos Sequeira é reitor da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) desde 2010. Não vai completar o mandato de quatro anos, porque acha que é tempo de entrar sangue novo numa instituição que tem de ser mais empreendedora. Deixa um rasto de polémicas. Aborda-as numa entrevista feita ao som de música clássica, um dos prazeres maiores do reitor.
Já disse que a UTAD está "no limite das suas capacidades", dado os cortes sofridos nas transferências do Estado. A situação é insustentável?
Creio que sim. De 2010 até 2012 tivemos de acomodar seis milhões de euros de cortes. Fomos obrigados a fazer cobranças coercivas, por via judicial, a alguns clientes da universidade, como autarquias, para obter receita. Não somos capazes de acomodar mais qualquer corte. "
Reduziu pessoal docente e não docente?
Quando me candidatei, disse uma coisa muito clara: saio se, por acaso, causar alguma tensão social numa instituição que pugna pela coesão territorial. Como tem havido muitas aposentações, optámos por não fazer qualquer renovação de quadros.
É reitor desde 2010 e está à beira de passar o testemunho. Sente-se cansado?
Disse sempre que este mandato seria de transição. Uma universidade tem de ser diversa e universal, para poder oferecer todas as áreas de conhecimento. E, para isso, temos de fazer uma inflexão para uma universidade mais empreendedora.
E já não se sente com forças para liderar esse projeto?
Temos tanta gente jovem e de valor, com sangue novo para agitar os programas......
Durante três anos e meio, colecionou polémicas. Uma delas foi com a Câmara de Chaves, onde a UTAD tem um polo. Se dependesse de si, já tinha fechado?
Não. Entendo que a coesão territorial também se baseia numa rede de ensino superior, logo seria contranatura defender o fecho do polo de Chaves.
Mas, então, por que motivo o presidente da Câmara de Chaves o acusa de querer encerrar o polo?
Isto é como a bolsa: sobe e desce. A UTAD está a fazer uma aposta naquilo a que chama o Campus de Água, trabalhando em torno desse recurso natural. O relacionamento com o polo de Chaves passará por aí.
Outra das controvérsias tem a ver com a integração do Instituto Politécnico de Bragança (IPB) com a UTAD. O senhor defende-a, o presidente do IPB recusa-a. Ela é inevitável?
É inevitável, para ganhar escala e cortar custos. Há valências do IPB que complementariam valências da UTAD e vice-versa. Hoje temos uma proliferação de formações que considero suicida, porque vão sendo esvaziadas de alunos. Dou o exemplo da própria UTAD: a massa científica que está aqui ancorada em torno das ciências florestais recebe apenas um, dois ou três alunos. Isto é insustentável e especialmente grave nos territórios de baixa densidade. Corremos o risco de termos universidades à míngua no Interior.
Em outubro do ano passado, 5 dos 6 membros cooptados do Conselho Geral (CG) da UTAD demitiram--se acusando a instituição de "inércia interna altamente lesiva dos superiores interesses da universidade".
Nem eu nem a academia nos revemos nessas acusações. Basta ter o Google ativado e estar atento aos jornais para ver o que a UTAD faz. Interpretei o comunicado sob duas perspetivas. Ele tem subjacente um alerta para o que está a passar-se na rede de Ensino Superior, no que diz respeito aos cortes. Por outro lado, poderá traduzir alguma divergência de opinião.
Quer especificar?
Defendo uma universidade aberta a todas as áreas de conhecimento, potenciando, inclusivamente, áreas de interface com a Saúde.
Essa aposta em Medicina foi vetada pelo CG?
Foi. O mandato do conselho acabava em fevereiro. Há várias maneiras de sair. Uma delas é um grito de impotência, como eu próprio sinto quando se diz que temos médicos a mais......
O CG também aludiu à "proteção de alguns interesses específicos que parecem dominar a UTAD". O que é que isto quer dizer?
Não faço ideia. A polémica foi esta: discordamos que se abram concursos para as Humanidades quando a nossa matriz identitária são as ciências agrárias e há uma grande faixa agrícola vazia entre Bragança e Castelo Branco. Eu defendo uma universidade eclética, ao contrário do que defendia o CG.
A indução do desenvolvimento regional é o principal papel da UTAD?
É uma grande componente da nossa missão, sem dúvida. Mas, para fazer só isso, bastaria apenas um politécnico. As universidades devem ser um repositório de conhecimento.
Mas a UTAD não deve adequar os cursos que ministra à realidade regional?
Veria essa componente mais no politécnico. Defendo um ecletismo trabalhado em rede. Se assim não for, corremos o risco de funcionar muito em defesa da capelinha.
in:jn.pt
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