Todos os colégios de especialidade da Ordem dos Médicos estão a realizar estudos detalhados para verificar o impacto em todo o país da reorganização hospitalar anunciada pelo Governo.
Segundo vários profissionais, a portaria, publicada no passado dia 10 em Diário da República, levará a que as crianças passem apenas a ser operadas em Lisboa, Porto e Coimbra, obrigará ao encerramento de 25 maternidades e conduzirá ao fecho de dois dos maiores centros de cirurgia cardiotorácica do país: o do Hospital de Santa Cruz, em Lisboa, e o do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia.
Ao mesmo tempo, alertou já a Ordem, até a Faculdade de Medicina da Covilhã corre o risco de encerrar, uma vez que os hospitais que a suportam (Guarda, Covilhã e Castelo Branco) ficam sem várias especialidades.
“Além dos colégios de especialidade da Ordem, também os vários distritos médicos estão a analisar o documento para verificar as suas consequências práticas”, adiantou ao SOL o bastonário dos médicos, José Manuel Silva, considerando inaceitável que o ministro da Saúde tenha avançado com uma reorganização hospitalar tão profunda sem estar “minimamente fundamentada e estudada”.
Na próxima semana, também os sindicatos médicos prometem denunciar as “graves consequências” das medidas governamentais. “Vamos mostrar que o ministro está a liquidar o número de camas no país e comparar com o resto da Europa, para mostrar que somos dos piores”, revelou ao SOL Mário Jorge, da Federação Nacional dos Médicos, acrescentando que muitas regiões, principalmente do interior, vão ficar sem a assistência em várias especialidades médicas.
Maioria sem especialidades
A portaria publicada pelo Governo classifica os vários hospitais nacionais em grupos - do I ao IV -, define as especialidades que cada um terá (com base na população que serve) e prevê o encerramento de vários serviços, até Dezembro de 2015.
Segundo o documento, a maioria dos hospitais ou grupos hospitalares - 27, que atendem até meio milhão de portugueses - serão classificados no Grupo I. Não terão, assim, diversas especialidades - como genética, farmacologia clínica, imonualargolia, cardiologia pediátrica, cirurgia vascular, nerurocirurgia, cirurgia plástica, cirurgia cardiotorácica, cirurgia maxofacial, cirurgia pediátrica e neuroradiologia. Estas unidades podem também não ter oftalmologia, otorrinolaringologia, pneumologia e outras, estando isso dependente da elaboração de estudos sobre o número e tipo de utentes em cada região, a elaborar até Setembro pela Administração Central do Sistema em Saúde (ACSS).
Para terem acesso às referidas especialidades, os utentes terão de deslocar-se ou ser transferidos para os hospitais de nível II e III. Estes últimos são os que têm todas as especialidades, mas serão apenas cinco em todo o país: centros hospitalares de Coimbra, Lisboa central, Lisboa Norte, S. João e Porto.
Já as unidades do grupo II não vão ter, por exemplo, farmacologia clínica, genética médica, cardiologia pediátrica, cirurgia pediátrica e cirurgia cardiotorácica. Será o caso dos hospitais de Évora, Algarve, Tondela-Viseu, Lisboa ocidental, Garcia de Orta, Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Nova de Gaia e Braga.
Ou seja, só nos hospitais de grupo III, situados em Lisboa, Porto e Coimbra será permitida cirurgia pediátrica. “Uma criança de Faro terá de ser operada em Lisboa”, nota uma fonte médica. Por outro lado, nenhum dos 27 do grupo I terá maternidade - o que implicará fechar as actuais 25, pois só dois desses hospitais (Figueira da Foz e Santa Maria Maior.) não têm obstetrícia. Em risco de perder o bloco de partos estão os hospitais do Médio Tejo, Barreiro, Cova da Beira, Amadora-Sintra e o de Entre o Douro e Vouga.
Com a nova classificação de unidades e respectivas carteiras de serviços, os especialistas também já alertaram para o facto de Paulo Macedo se preparar para reduzir para metade os serviços de cirurgia cardiotorácica nos hospitais públicos.
Governo diz que são apenas 'indicações estratégicas'
Perante a polémica, o secretário de Estado da Saúde, Manuel Teixeira, já veio garantir que nada irá “fechar no imediato”, classificando as novas regras como meras “indicações estratégicas”. Segundo o SOL apurou, o ministro da Saúde admite mesmo fazer ajustes às medidas previstas na portaria. Isto depois de concluídas as redes de referenciação das 47 especialidades médicas - que indicarão de que forma e como devem ser encaminhados os doentes de uns hospitais para outros -, que neste momento estão a ser discutidas com a Ordem dos Médicos.
De fora da polémica estão, pelo menos para já, os três institutos de oncologia, os centros de medicina física e reabilitação e os hospitais psiquiátricos - que segundo esta nova organização integram o Grupo IV, sendo considerados especializados.
catarina.guerreiro@sol.pt
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