sábado, 31 de março de 2018

Bragança captou €138 milhões de investimento

A cidade começa a emergir como destino de investimento a nível nacional mas também como região a visitar. Presidente da Câmara explica como conseguir atrair €138 milhões de investidores privados.
De Bragança a Lisboa são... 4 horas de distância, mais precisamente 4hl5, por automóvel e não as 9h que os Xutos & Pontapés cantavam em "Para ti Maria". Nesta canção de 1988, o grupo musical dizia ainda que "queria ter um avião para lá ir mais amiúde". Ora, 30 anos depois, a cidade está ligada por avião à região de Lisboa (a Tires, em Cascais, em lh40). São agora duas ligações por dia, ida e volta, na linha regional que leva pequenas aeronaves de Portimão a Bragança, com paragens em Tires, Viseu e Vila Real.
Bragança pode até estar distante do 'centro do poder' português, mas está a apenas lh45 do Porto e a 3hl5 de Madrid por automóvel. E a proximidade a Espanha foi um dos argumentos que permitiram captar o grande investimento da multinacional francesa Faurecia, reforçado recentemente com mais uma fábrica, no valor de €41,5 milhões (ver texto ao lado).
"Já pedi aos Xutos & Pontapés para mudarem essa música", graceja o presidente da Câmara de Bragança, Hernâni Dias. Mas se até agora não o conseguiu, 0 mesmo não se pode dizer do objetivo de dar mais visibilidade à cidade.
A cumprir um segundo mandato à frente deste que é um dos maiores municípios em área (com 1174 quilómetros quadrados), o autarca diz que está a conseguir vencer a batalha da afirmação do município a nível nacional. Parte disso fica a dever-se a uma aposta forte na comunicação. "Para mostrar o que aqui se faz, desde a cultura à gastronomia e turismo, com um foco muito especial na parte económica", afirma. Porque "ninguém vai à procura do que não conhece concretamente".
Os resultados começam a estar à vista: Bragança passou a ser recentemente o 24o município mais atrativo a nível nacional para investir, numa análise da Bloom Consulting, quando em 2017 estava em 29Q. No mesmo estudo da consultora espanhola, intitulado "Portugal City Brand Ranking" e que incide sobre os 308 municípios portugueses, surge como o nono município mais atrativo para visitar, investir e viver na região norte. A isto Hernâni Dias soma ainda outro dado: "Somos o 168 concelho mais exportador da região norte, exportámos à volta de €600 milhões em 2016, mais €35,51 milhões face a 2015".

A receita para o investimento
Estimativas do município apontam para um investimento privado de €138 milhões nos últimos quatro anos: €73 milhões na instalação de empresas, €10 milhões no turismo, €5 milhões no imobiliário e €50 milhões na nova zona industrial.
O autarca espera mais grandes investimentos para breve, assumindo estar a negociar alguns projetos relevantes, sem especificar. Refere apenas uma intenção de investimento de €8 milhões num projeto de exploração de água mineral, que poderá criar entre 70 a 80 postos de trabalho.
Que receita está a ser aplicada? "Em 2014 criámos aquilo a que chamamos uma via verde para o investimento. Quando um investidor nos aborda, todo o município se mobiliza para o acompanhar nas suas necessidades, incluindo eu próprio, se for necessário", explica.
Por outro lado, Bragança não aplica derrama às empresas, "independentemente do seu tamanho, tenham dois trabalhadores ou mais de 1000, como a Faurecia". Entre 2013 e 2017, estima, o município deixou de arrecadar €2,89 milhões deste imposto municipal. "Não recebemos esse dinheiro mas o tecido empresarial que aqui se instala cria emprego, o que acaba por compensar".
Além disso, explica também, "em 2014 reduzimos o valor do metro quadrado nos lotes empresariais para as empresas se poderem instalar no nosso concelho. Tivemos vários lotes a serem vendidos, nomeadamente numa zona industrial junto à autoestrada. Temos lá três empresas italianas e uma portuguesa".
De forma a complementar a oferta de espaços para empresas, foi inaugurado em agosto 2015 o Parque de Ciência e Tecnologia Brigantia Ecopark, destinado a empresas já consolidadas mas também em fase de incubação, nas áreas de ambiente, ecoconstrução e energia. Estão lá instaladas 14 empresas que empregam 70 pessoas e ainda há muito espaço disponível. "Estamos a analisar candidaturas de outras para se instalarem", diz Hernâni Dias. "Vamos também ter aqui o Espaço Empresa, uma parceria com o IAPMEI e o Aicep", explica, enquanto faz uma rápida visita guiada neste espaço que, além de escritórios, conta também com laboratórios básicos e partilhados e onde se prevê ainda espaços de coworking. Às empresas instaladas no Brigantia juntou-se recentemente a IT Sector, com cerca de 40 postos de trabalho. Também lá está a Roff.
Hernâni Dias destaca também o Instituto Politécnico de Bragança. "O facto de termos uma instituição de ensino superior valorizada a nível nacional e internacional permite-nos oferecer mão de obra qualificada para determinado tipo de projetos", diz. Aponta ainda fatores como "a segurança, a oferta cultural e a vertente patrimonial" como mais-valias do concelho. E a proximidade a Espanha é uma mais-valia, adianta. "Estamos a 30 km do TGV que vai passar aqui ao lado em Puebla de Sanábria e que já p.tssa por Zamora. Conseguimos estar em Madrid em duas horas e meia". A distância podia ser mais curta, afirma, se a ligação rodoviária a Puebla de Sanábria, que tem sido reclamada, tivesse sido feita. "São quase 40 km que demoram uma hora a fazer num serpenteado de estradas, podiam ser só 20 minutos com pouco investimento, o que facilitaria o transporte de mercadorias para os portos do norte de Espanha". Uma obra que não é feita por "falta de vontade política dos dois países", afirma. Mas tem também havido dúvidas ambientais por atravessar o Parque Natural de Montesinho, uma 'pérola' que ocupa 30% do espaço do concelho e que o autarca reconhece ter enorme potencial turístico. O museu da língua portuguesa, que se espera que abra portas no fim de 2020, deverá também tornar-se uma âncora para o turismo.
Na frente turística, embora os últimos indicadores sejam de 2016, revelam uma subida relevante do número de hóspedes (47-276 em 2014; 55-768 em 2015 e 63.670 em 2016) e de dormidas (62.375 em 2014; 75-654 em 2015 e 90.502 em 2016). Em janeiro, uma consulta feita às 26 unidades hoteleiras do concelho apontava para um aumento estimado de 15% no número de hóspedes em 2017 (passando para 73 mil) e de 25% no número de dormidas (ultrapassando as 110 mil), face a 2016. São crescimentos superiores aos da região norte e de todo o país. Os proveitos das unidades hoteleiras também cresceram: eram de €1,92 milhões em 2014, passaram para €2,4 milhões em 2015 e para €2,86 milhões em 2016. A volta de 60% dos turistas vêm do lado espanhol, "o que significa que a promoção em Espanha está a dar certo. Temos cerca de 1500 camas no concelho, restaurantes de qualidade, vários museus, turismo de natureza, de aldeias... o facto de Rio de Onor ter sido considerada uma aldeia-maravilha faz com que haja mais pessoas a visitar-nos", explica. Em 2017 foram concedidas 51 licenças para novos empreendimentos turísticos. No início deste ano abriu um hotel e arrancaram as obras para outro.
A agricultura e agropecuária são negócios também em destaque. Os frutos secos têm "grande potencial", em especial a castanha. "Bragança tem cerca de 7000 hectares plantados, em 2016 havia projetos para plantar mais 3 mil, por jovens agricultores". E "a amêndoa está a ter um crescimento brutal, está a render tanto como a castanha".

Faurecia, a joia da coroa
Investimento da Faurecia é uma referência para toda a região de Trás-os-Montes. Expectativa é que ajude a criar um cluster automóvel.

Falar de investimento estrangeiro em Bragança é o mesmo que falar da Faurecia: a nova fábrica da multinacional francesa, dedicada a sistemas de controlo de emissões e que representou um investimento de €41,5 milhões, foi inaugurada em julho de 2016. A empresa que é um dos maiores fabricantes mundiais de equipamentos automóveis (assentos; sistemas de interior, sistemas de escape e sistemas de exterior) fornece componentes para as marcas Jaguar, Land Rover, Nissan e Renault e tem sete fábricas em Portugal além de Bragança, estão em Nelas, Palmela, São João da Madeira e Vouzela. São mais 400 postos de trabalho ajuntar aos 850 da primeira fábrica do grupo em Bragança, inaugurada em 2001. Esta expansão levou nos últimos anos à atração de capitais estrangeiros com a fixação de quatro novas empresas ligadas ao sector automóvel, explica o presidente da Câmara de Bragança. A autarquia acredita que a médio e longo prazo será criado um verdadeiro cluster automóvel à boleia da Faurecia.
Hernâni Dias explica como surgiu este investimento mais recente: "Já havia a indicação de que a Faurecia queria colocar aqui um centro de desenvolvimento, que só não aconteceu antes porque implicava uma deslo- calização da índia. Percebi que havia vontade de crescerem em Portugal pelo que entrei em contacto, vieram cá altos responsáveis, pediram algumas garantias, definimos um plano de trabalho com o Instituto Politécnico de Bragança, com o Instituto do Emprego e Formação Profissional e com a Aicep de forma a ver como poderíamos responder ao que eles queriam, nomeadamente definindo cursos específicos para formar pessoas para irem para a Faurecia. Depois dessa conversa fui ter com o Governo e pedi ajuda para instalar a empresa em Bragança, explicando quais as condições que nos pediam. Tive desde a primeira hora a ajuda do Governo, fomos a Lisboa e decidiu-se o apoio e o financiamento para a instalação da fábrica. Demorou dois anos desde a negociação à inauguração. Foi um processo relativamente rápido e simples, houve um bom diálogo".
O autarca refere que o grupo francês "é um motor quer a nível de produção quer a nível de atração de outras empresas, nomeadamente na área metalomecânica. A partir daí vieram já empresas de Espanha, Itália e Alemanha que estão a trabalhar para a Faurecia mas também para outros mercados. Estamos a falar de 1000 e tal trabalhadores diretos mas há muitos indiretos que trabalham dire- tamente para a Faurecia. A fábrica é uma das mais competitivas do grupo, em que os trabalhadores melhor desempenho têm e são 60 fábricas a nível mundial."
"Uma das empresas italianas que vieram instalar-se em Bragança reconheceu que a localização da cidade é a melhor que podia ter escolhido", acrescenta Hernâni Dias.

"IRC devia baixar para zero"
Definir um estatuto que confira determinados direitos aos territórios do interior é um dos objetivos do presidente da Câmara de Bragança.

O combate à desertificação do interior é um tema recorrente em Portugal mas voltou a estar em força na ordem do dia após os graves incêndios do ano passado. O presidente da Câmara de Bragança quer aproveitar a onda. Aliás, foi nesta cidade que o Movimento pelo Interior , iniciativa que junta políticos, gestores e empresários com o objetivo de definir medidas públicas para, em 12 anos, se reverter a situação que se vive nos territórios do interior , começou a fazer as conferências regionais para debater o tema, no início de fevereiro.
Hernâni Dias é taxativo: "O Governo, querendo valorizar o interior, tem de tomar medidas que sejam consentâneas com a necessidade de olhar para este território de outra forma, sob pena de isto não passar de mera retórica e nada acontecer". "O interior não tem de ser sinónimo de atraso nem de pobreza", acrescenta o presidente da câmara, explicando que o seu município se envolveu proativamente, há alguns anos, nessa discussão. "Temos um protocolo de colaboração com a Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa no sentido de trabalharmos a temática do interior", no âmbito do qual foram criados cursos e pós-graduações subordinados à temática da interioridade, incluindo um mestrado e está em aberto a hipótese de haver um doutoramento. Objetivo: "Conseguir pela via legislativa definir um estatuto que confira determinados direitos aos territórios do interior, nomeadamente um IRS mais baixo às pessoas que ali moram e IRC zero para as empresas que se instalem nestes territórios. E defendemos que os preços da energia, pelo menos da eletricidade e do gás já não falo dos combustíveis, porque se calhar seria utópico , sejam equiparados aos de Espanha", acrescenta.
A criação em Bragança de um centro de inovação jurídica também está em cima da mesa "já abrimos as propostas e já está adjudicado, vai ficar no centro histórico, num edifício que vamos reabilitar". Tal como o Observatório da Interioridade, um projeto já com alguns anos. O objetivo é levar a Bragança "muita gente ligada ao sector jurídico e académico, até a nível internacional".
O autarca especifica o tema do IRC zero: "A ideia não é que todas as empresas que se instalem no interior fiquem com IRC zero para o resto da vida, mas sim que possa haver um incentivo que nos primeiros cinco anos possa ser zero e depois se vá ajustando mediante a evolução da empresa. Ao nível dos fundos comunitários também terá de haver esta preocupação. O Governo deve encaminhar para o interior as empresas que se queiram instalar em Portugal. Só há uma forma de fixar as pessoas, é arranjando-lhes emprego. Acredito que no quadro comunitário pós-2020 se há de olhar muito para esta matéria. Acho que a maioria das pessoas reconhece a necessidade de um desenvolvimento mais homogéneo em Portugal. O país não consegue ser competitivo se estiver dividido".

INDICADORES
55,4% (ou 1082 pessoas) foi quanto desceu o número de desempregados no concelho entre 2013 e 2017, segundo dados do Instituto de Emprego e Formação Profissional 4,1 milhões de euros foi o superavit registado na balança comercial em 2016 50% foi a dimensão da redução inicial do preço dos lotes para instalação de empresas na região, que estava nos €19,75. Aplicando outros benefícios, o lote pode ficar apenas em 1 euro por metro quadrado

Pedro Lima
Semanário Expresso

Sem comentários:

Enviar um comentário