Ora, se conversares com os moradores, não verás apenas a aldeia: poderás escutar o seu testemunho de vida numa aldeia comunitária, onde todos os habitantes partilhavam terrenos agrícolas, rebanhos e fornos, ajudando-se uns aos outros e honrando a palavra dada. Era isso que até há pouco tempo tornava Rio de Onor uma aldeia única, bem como o facto de se reger por um governo e leis próprias.
Foi isso que nos explicou o Sr. Mariano Augusto à sombra de uma árvore. Contou-nos que, até aos anos 60 do século passado, não chegava qualquer estrada à aldeia, apenas um caminho de terra que subia e descia serras – 20 e tal quilómetros a pé até Bragança. “De Bragança a Lisboa são 9 horas de distância” – lembras-te da música? Já podes imaginar como a aldeia de Rio de Onor ficava longe e os seus habitantes isolados.
As famílias trabalhavam nos campos, mais propriamente na “faceira”, um terreno composto por dezenas de quadrados equitativos de terra. Para decidir a ordem segundo a qual deviam ser lavrados, com vista a não estragar os retalhos dos vizinhos, tocava-se o sino e convocava-se uma reunião, do mesmo modo que as famílias se juntavam para decidir os castigos a aplicar a quem quebrasse as regras estabelecidas. Normalmente eram multas pagas em vinho: quanto maior o delito, maior a quantidade a dar aos outros. “Ficava tudo registado na Vara da Justiça” – continuou a explicar o Sr. Mariano, que fez questão de nos levar à adega de sua casa, para que víssemos uma dessas varas, oferecendo-nos um copo de vinho, pois claro.
Enquanto bebíamos, contou-nos que antigamente os homens costumavam beber todos pela mesma caneca. Um deles, mais cioso, bebia sempre pelo bico até que um dia lhe pregaram uma partida: esfregaram essa parte com malaguetas e foi vê-lo a ficar vermelho e aflito, para gargalhada de todos.
Ficámos também a saber que, em Rio de Onor, havia um rebanho comunitário e que as famílias tinham de se revezar para o acompanhar aos pastos. Hoje já não podemos ver as ovelhas a regressar ao final do dia encaminhando-se sozinhas para as casas dos respetivos donos.
Quanto à convivência com os vizinhos espanhóis, o Sr. Mariano só parece lamentar que, entre os anos 70 e 90, tivessem posto uma corrente na fronteira a separar as duas aldeias, porque “nós e os espanhóis somos todos família”.
Hoje em dia, pelas suas contas, há 53 portugueses e 10 espanhóis a viver nas duas aldeias. Entre os primeiros, o apelido mais frequente é “Preto” e, entre os segundos, “Prieto”. São quase todos idosos.
Os mais jovens partiram à procura de uma vida melhor, enquanto os visitantes chegam, por vezes, à procura do que perderam.
Guia Prático para visitar Rio de Onor
Localização
A aldeia de Rio de Onor fica a 26 km e a meia-hora de distância de Bragança, no Alto Nordeste transmontano, junto à fronteira com Espanha.
Faz parte da Terra Fria Transmontana, a zona climaticamente mais fria da Península Ibérica, e do Parque Natural de Montesinho, uma área de 75 mil hecatres caracterizada por uma simbiose entre o Homem e a natureza. Ao longo do parque, a paisagem muda muito, alternando entre áreas de pinheiro bravo, lameiros e hortas.
Além de ser uma das zonas com a maior biodiversidade de Portugal, é aí que vive a maior parte dos mamíferos silvestres da Europa, sendo esse o melhor indicador do bom estado do ecossistema. Na estrada entre Bragança e Rio de Onor, avistámos três veados e uma raposa, mas também há lobos e javalis.
Onde comer perto de Rio de Onor
Entre Bragança e Rio de Onor, também há um restaurante que recomendamos. Chama-se A Lombada e as suas especialidades são o cordeiro e as enormes Posta à Lombada e Costeleta de Vitela, todos confecionados na brasa. Por encomenda, também se pode provar o Galo no Pote, um prato tradicional quase em extinção nos restaurantes da região.
Este passeio foi realizado, em Maio de 2018, a convite da Associação Comercial, Industrial e Serviços de Bragança. Agradecemos também ao António Sá por nos ter acompanhado em Rio de Onor, proporcionando-nos uma experiência enriquecedora e levando-nos a refletir sobre o interior de Portugal.
Fotos: Paulo Azevedo
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