sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Arquivo Distrital de Bragança: Os utilizadores e o acesso à informação

Mas falar do contributo do arquivo Distrital na construção da identidade, além do património arquivístico, temos que falar da acção de quem ao longo dos tempos foi desenvolvendo um trabalho nas condições mais inóspitas, silenciosa e pacientemente, indispensável para a salvaguarda, a preservação, a organização e a transmissão de milhares de registos sobre o nosso passado colectivo. Damos relevo ao Abade Baçal. Reuniu e preservou um espólio que poucos arquivos distritais possuem. Tratou-o, divulgou-o como ninguém nas suas “Memórias”.



Seguiu-se-lhe o Dr. Belarmino Afonso, que cumpriu o caminho traçado.
Para além da antiguidade dos tesouros que guarda, para além das potencialidades da inovação tecnológica, será o factor humano que poderá garantir que o arquivo Distrital de Bragança continue a ser um traço de união entre o passado, o presente e o futuro, assim permanecendo como um elemento identitário fundamental. Este aspecto leva-nos a desenvolver todas as componentes técnicas, uma vez que são estas aquelas que facultam um acesso mais rápido, mais sistemático e mais eficaz aos documentos que se guardam nos arquivos.
Num arquivo é fundamental o papel do utilizador, só eles permitirão que o arquivo se torne um elemento motor da construção da identidade. Ao longo desta última década, não tem parado de crescer o número de utilizadores do Arquivo. Desde os historiadores consagrados aos jovens investigadores que preparam os seus trabalhos, passando pelos estudiosos de história local, pelos genealogistas, pelo cidadão que pretende fazer valer os seus direitos através da prova documental. A todos eles, os arquivistas e os serviços procuram responder, sabendo quão diversas são as motivações de quem se dirige ao Arquivo. De facto, o Arquivo está, aberto a todos os utilizadores, cuja filosofia orientadora é a de conjugar critérios de acesso o mais livre possível (dentro dos condicionalismos legais) com critérios de conservação das espécies.


As possibilidades de consulta, a sua efectivação resultam (dadas as exigências de eficiência e de celeridade na busca dos documentos) na elaboração e disponibilização de instrumentos de pesquisa, nomeadamente guias e inventários que dão a conhecer os fundos documentais e orientam os leitores numa perspectiva arquivística.
A difusão arquivista não se pode distanciar do utilizador, com base em preceitos rígidos de uma ciência em construção. O investigador carece de ajuda de quem conhece o acervo e as tipologias documentais, é necessário reactivar o diálogo com os historiadores.
A publicação de documentos, tão habituais no século XIX e início do XX e que praticamente desapareceram enquanto objectivo prioritário das instituições arquivísticas, possibilita várias leituras e investigações a partir das séries documentais que ficam expostas a um número muito maior de leitores – trata-se tão simplesmente de uma democratização da pesquisa.
Esses projectos editoriais que iriam, em nosso entender, constituir marcas importantes na construção da nossa identidade, contribuindo para a sociedade de informação na sua filosofia base – a democratização do direito à informação nas suas múltiplas facetas.
É necessário promover o acesso à documentação, assim como a sua diversificação.
Se existem documentos que são muito consultados, outros, a sua consulta, é praticamente inexistente.
Os arquivos distritais sempre foram na sua existência visitados pelos genealogistas. Referimo-nos, concretamente, aos registos paroquiais com mais de 100 anos, pois os livros mais recentes conservam-se ainda nas Conservatórias do Registo Civil. Os livros paroquiais são sem dúvida a primeira e melhor fonte documental para os genealogistas. Saliente-se que através dos assentos de baptismo e de casamento obtêm-se normalmente informações essenciais e rigorosas para o estudo de qualquer família, como sejam: duas ou até três gerações com os nomes das pessoas, datas, naturalidades, locais de residência, profissões e por vezes relações de parentesco com os padrinhos e as testemunhas.
Os registos notariais dos antigos tabeliães de notas, cujas escrituras públicas (instituições de vínculos, aforamentos, testamentos, perfilhações, dotes, compras e vendas de propriedades, etc.,) remontam em muitos casos ao séc. XVI e fornecem abundantes informações com interesse genealógico.
Encontram-se muitas outras fontes documentais com interesse directo para a genealogia, de entre as quais destacamos os seguintes núcleos: Câmara Eclesiástica, com as séries de habilitações de Genere (processos de limpeza de sangue para ordens menores e sacras), de Dispensas Matrimoniais, instituições de Morgados e Capelas.
Para a diversificação da consulta, podemos ainda referir no acervo documental: a Leitura Nova, fruto da acção política centralizadora do reinado de D. Manuel I, os códices constituem-se, pelas iluminuras e pela importância diplomática, uma das mais valiosos documentos; os forais; os tombos e demarcações.
As instituições dos morgados, desenvolveram-se sobretudo a partir do séc. XIII. Foi uma forma institucional e jurídica para defesa da base territorial da nobreza e perpetuação da linhagem. Os morgados constituíam um “vínculo” que não podia ser objecto de partilhas; era transmitido ao filho varão primogénito, no entanto, na falta deste poderia passar à linha feminina, enquanto não houvesse descendente varão. As capelas surgiam quando a afectação de domínios e seus rendimentos se destinavam a serviços religiosos por alma dos instituidores, normalmente a “aniversários” de missas.
Em relação aos arquivos privados, a designação reporta-se ao conjunto dos arquivos de família, arquivos pessoais, arquivos de empresas, de associações, comissões. Trata-se apenas de uma parcela da documentação de origem privada, ficando excluídos os arquivos eclesiásticos. Esta documentação, pela sua grande variedade e diversidade, dá-nos a outra dimensão da vida e do quotidiano.
Uma vez que a sua incorporação na rede nacional de arquivos não é obrigatória, mas que se trata de património relevante para a memória colectiva nacional, destaque-se o esforço que tem vindo a ser desenvolvido no sentido de proceder ao levantamento deste tipo de fundos, tendo em vista a sua protecção, conservação, tratamento, descrição e comunicação, independentemente de se manterem na posse dos respectivos produtores, ou de serem incorporados, de acordo com diferentes tipos de protocolo predefinidos a estabelecer entre as partes interessadas.
A documentação proveniente do bispado e resultante da sua estrutura institucional: os bispos, vigários gerais, vigários da vara, párocos, todos produtores de documentação. Os tribunais episcopais, as visitas diocesanas, os conflitos entre clero regular e secular ou no interior de cada grupo, os processos de género, as dispensas de casamento, os processos de separação. São exemplos de documentos cujo estudo contribuiria para a construção de identidade.
O acesso ao documentos implica a existência de instrumentos de descrição que permitam aos investigadores uma pesquisa fácil e eficaz. São estes estruturantes na comunicação do documento com o utilizador. A elaboração e disponibilização de instrumentos de pesquisa, nomeadamente guias e inventários que dão a conhecer os fundos documentais e orientam os leitores numa perspectiva arquivística, constituem uma outra face, também ela decisiva, no acesso à informação.
À excepção dos judiciais, em fase de inventariação, todos os outros fundos se encontram inventariados. Alguns desses inventários estão elaborados de acordo com a metodologia de descrição arquivística para tratamento automatizado de documentação histórica (Arqbase), outros com metodologias tradicionais.
Da Câmara Eclesiástica, as séries dos processos de genere e concursos paroquiais possuem catálogo. O fundo da Casa São Payo, único fundo microfilmado, também está catalogado. Dos registos paroquiais publicou-se Inventário colectivo dos registos paroquiais, ed. Arquivos Nacionais, Torre do Tombo, e Inventário do Património Cultural Móvel, Vol. 2 – Norte, Lisboa, 1994.



A integração das novas tecnologias, com as suas conquistas e potencialidades no âmbito dos Arquivos, será um factor decisivo na resolução positiva deste desafio. No entanto, para além dos recursos tecnológicos, o cerne da questão passará, uma vez mais, pelo trabalho dos técnicos de arquivo e pela sua capacidade para irem ao encontro das exigências dos novos tempos, afirmando a especificidade da Arquivística como uma componente essencial das ciências da informação. É essa missão – administrativa, científica, cultural, mas também social que os arquivos e os arquivistas são chamados a desempenhar no novo milénio. E são-no, nomeadamente, pela imposição da sua cada vez mais marcante e decisiva vertente de serviço público.
A preservação da informação implica também a conservação compreendendo as duas vertentes distintas: a conservação curativa e a conservação preventiva.
Preservar é uma atitude ampla que compreende vários tipos de procedimentos, nomeadamente o controlo do meio ambiente das áreas onde a documentação é armazenada ou exposta, o acondicionamento correcto, o seu manuseamento cuidadoso a sua limpeza e higienização. A transferência de suportes e a reprografia garantem a transferência da informação dos suportes originais para suportes alternativos, cumprindo paralelamente necessidades de preservação e acesso a imagens de qualidade.

Ana Maria Afonso

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