sexta-feira, 28 de junho de 2019

O Ensino Superior no Interior em modo de sobrevivência

Soube-se esta semana os resultados tão aguardados relativos à avaliação, por painéis de peritos internacionais, dos Centros de Investigação. Se dissermos que na Universidade de Lisboa, 27 Unidades de Investigação receberam mais de 1,5 milhões de euros cada, enquanto que no Porto foram 17 Unidades e em Coimbra 7, enquanto que, em todo interior, de Trás-os-Montes ao Algarve (bem sei que não é interior) foram apenas 5 Unidades a atingir esse montante (das quais 1 na UTAD e outra no Inst. Politécnico de Bragança) tal mostra bem a disparidade entre os meios disponíveis para alavancar investigação competitiva e de nível internacional.

Vem isto também a propósito do Relatório sobre o acesso ao Ensino Superior, divulgado igualmente esta semana, que resultou dum grupo de trabalho nomeado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (MCTES). Nas reflexões finais (o que é sempre a parte mais sumarenta de qualquer relatório…) afirma-se que a capacidade de atração de candidatos, depende, entre outros aspetos, da qualidade da oferta e do grau de projeção pública das instituições.

Salienta-se aí que as instituições do interior do país, de pequena dimensão, devem procurar especializar-se, isto é, deveriam concentrar os seus esforços de I&D e de pós-graduação num quadro estável de áreas temáticas, transformando-as em eixos de afirmação de excelência, com base em investigação científica voltada para a dinamização do seu contexto regional.

Fácil de teorizar, mas como concluímos, pelas assimetrias de financiamento da investigação não caminhamos na direção apontada…

E este aspeto tem a ver com algo que é absolutamente trágico para este país desigual. Existem nada menos do que 263 cursos a nível nacional com menos de 10 candidatos por curso, valor a partir do qual, se tal se verificar 2 anos seguidos (e estão 187 cursos nestas condições…) o curso deixa de ser financiado pelo Ministério, não podendo cada instituição criar exceções a não ser que demonstre o interesse estratégico. Ora 99% destes cursos estão, adivinhem … pois é, no interior! Houve assim, no ano letivo passado cerca de 9000 vagas a mais, na sua quase totalidade fornecidas pelas instituições das regiões de baixa densidade. Há consequentemente uma grande disparidade entre a proporção de candidatos em primeira opção e o número de vagas, variando essa diferenciação entre um mínimo de 21% e um máximo de 168%, neste último caso em Lisboa/ Porto onde a procura transcende largamente a oferta.

Ora o despacho que regula os termos de fixação de vagas para o Concurso Nacional de Acesso ao Ensino Superior (CNA) para o próximo ano letivo considera explicitamente “a exigência do aumento de vagas em ciclos de estudos com elevado número de candidatos em primeira opção no concurso nacional de acesso 2018 com nota superior a 17 valores”, o que vai levar a uma subida de estudantes universitários no litoral, em detrimento das zonas desfavorecidas.

Desculpem tanto número mas só queria salientar que isto é uma completa inversão ao que foi imposto no ano anterior onde as vagas em Lisboa e Porto eram diminuídas de 5%. Os lobbies falam mais alto…
Recorde-se foi também divulgada esta semana a seleção social aos cursos de maior procura. Razão pela qual a maior % de bolseiros, provenientes de famílias com maior dificuldades, se concentra precisamente nos Politécnicos do interior e…na UTAD…

Um país desigual onde a fragilidade do ensino superior no interior se transmite a toda a sociedade e não contribui para alavancar o desenvolvimento. E com a diminuição global do número de candidatos, resultado do deserto demográfico que se avizinha, posso afirmar que os objetivos das instituições do ensino superior nestas regiões deixaram de se afirmar como pólos de desenvolvimento e lutam meramente pela sobrevivência, isto é, pela não extinção dos cursos.

in:interiordoavesso.pt

Sem comentários:

Enviar um comentário