terça-feira, 22 de dezembro de 2020

RESISTIR É O QUE NOS RESTA

 Começou o Inverno, depois de longos meses de desgraças que nos secaram a confiança e nos deixaram de frente com a crueza da vida efémera, contingente, desamparada, apesar da ciência, da técnica, da economia sofisticada, da política que promete paraísos, do amor que nos tapa as misérias.
A serenidade fraqueja, a solidariedade fica-se pelas lágrimas e o desânimo toma-nos conta das ruas e das casas, das noites e dos dias, ficamos obtusos a olhar para os televisores, que tanto nos regam a esperança, com a chegada das vacinas, como nos arrepiam com novidades inesperadas de refinamento da agressividade da ameaça, falsária, mutante, traiçoeira como os predadores de emboscada.
Estamos cansados, certamente, mas feito o caminho até aqui haverá que recorrer às forças que restam, porque o remédio é resistir, mesmo que doa como nunca sentimos nos dias das nossas vidas.
Objectivamente as condições de que dispomos permitem encarar a situação com inteligência, o que passa por adoptar comportamentos ainda mais defensivos, cautelosos e exigentes connosco e com os outros, sem chicoespertismos ou oportunismos agarotados, que se revelarão, porventura, fontes de tragédias sem retorno.
Lamentamos o Natal áspero do distanciamento e o ano novo sem a volúpia da festa, mas pode ser que haja novos tempos de alegria, partilha, fraternidade e da liberdade que nos faz falta. Entretanto, como não estaremos para desistir vale a pena não perder as referências para o futuro, não descuidando os desígnios que a história de nós reclama.
As coisas não ficarão como estão, talvez nem como eram. Apesar de tudo, pode ser uma oportunidade para demonstrar aos que confundiram o horizonte com a ponta do seu nariz que, depois da devastação, é necessário repensar a construção do que há-de vir. Este é o tempo de procurar alternativas ao abandono do território, às omissões de direitos fundamentais, ao desprezo por quem fez uma longa jornada de desesperança e chega ao fim definitivamente desiludido.
Ao menos que as próximas gerações possam florir num país mais justo, igualitário e solidário, diferente do que nos trouxe a estes tempos de provação. Os níveis de envelhecimento populacional a que chegámos, agravados pelas soluções de armazenamento nas antecâmeras da morte, ajudam a perceber como nos tornámos estatisticamente infernais apesar dos ares puros e do espaço que não nos falta para respirar profundamente.
Daqui a uns meses os cidadãos destas terras serão chamados a decidir sobre as lideranças locais. Se não se elegerem protagonistas capazes de promover a unidade do distrito e da região  no combate político pela recuperação económica, demográfica e cultural do território, assistiremos, em breve, humilhados e ofendidos, ao estrondoso fechar das portas do futuro.

Teófilo Vaz

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