segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

Foral de Vila Flor - 4 de Maio de 1512

 «Dom Manuel per graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves d’aquem e d’alem maar em Africa senhor de Guynee e da conquista e navegaçam e comercio de Ethyopia, Arabia, Persia e da India etc.
A quantos esta nossa carta de foral viierem dado aa nossa villa de Villa Frol fazemos saber que per bem das diligencias, ysames e inquiriçooens que em nossos regnos e senhorios mandamos geeralmente fazer pera justificaçam e decraraçam dos foraaes delles e per alguas sentenças e determinaçooens que com os do nosso conselho e letrados passamos e fezemos acordamos visto o foral da dita villa dado por El Rey dom Deniz que as rendas e dreitos reaees se devem na dita villa pagar e recadar na maneyra e forma seguynte.

[Foro da terra]
Avemos primeiramente d’aver de todollos moradores da dita villa e termo em cada huum anno quatro alqueires de cevada desta medida ora corrente e seis reaes em dinheiro de seis ceptiis ho real os quaees alqueires e reaes se pagaram pellas duas octavas de cevada e pellos paeens e dinheiros que pello dito foral se mandava pagar a cada huum morador sem mais daquy adiante pellas ditas cousas pagarem outro foro nem tributo. O quall direito nan pagaram vyuvas nem orfãoos salvo se forem de quinze annos e dy avante estando em casa da may porque neste caso pagara a maay e os filhos todos huum foro soo.
E a moça orfãa emquanto non for casada de qualquer ydade nan pagara o dito foro nem pagaram o dito foro os que teverem cavallo de marca nem os que atee setenta annos foram escusos por elle posto que mais ho non tenham nem pagaram ho anno que lhe morrer seu
cavallo; nem pagaram estes taaes ho primeiro anno que casarem ou ho anno que vyuvarem; e as pessoas que ham de pagar o dito foro se entendam soomente aquellas que pessoalmente viverem e morarem nos lugares onde assy o dito direito se manda pagar porque se em alguum lugar pagarem o dito foro onde sam moradores e teverem beens em outros lugares posto que nos taaes lugares este tal direito de cevada e dinheiro na dita maneyra se mande pagar nam pagaram as taaes pessoas la mais outro direito pellos beens que la teverem onde assy nam sam moradores aquestes taaes que este tal direito ja pagaram por suas pessoas onde eram moradores salvo se nos outros lugares onde os ditos beens tevessem e non morasem ouvesse outra deferença de foro por onde craramente se mandasse pagar foro pellos beens que as pessoas hy tevesem posto que la non vivesem porque en tal caso se cumprira e fara o que per justiça per bem dos taaes foraaes for determinado.
E aalem das pessoas acima decraradas que per bem do dito foral antigo e nossas determinaçoens devem e ham de seer escusos do dito foro e tributo; todallas outras que forem moradores na dita villa e termo pagaram o dito foro segundo no principio deste foral fica asentado posto que as taaes pessoas hy nam tenham beens proprios e posto que vivam em casa d’aluguer sem embargo de n[e]hüa outra rezam nem privilegio que possam alegar.

[Decraraçam do foro]
Pollo qual foro e tributo o senhorio nan mandara derribar as portas nem as tirar fora do couce nem fazer sobr’isso n[e]hüa cousa semelhante mas mandara penhorar soomente pollo porteyro do concelho ou do almoxerifado se o hy ouver qual mais quiser e doutra maneyra nam.
E os roolles daram feitos os officiaaes da camara per todo ho mes de Setembro a cada hum dos porteiros a sua custa so’ pena de pagarem vinte cruzados a metade pera ho meirinho da comarqua e os outros pera ho senhorio dos ditos direitos pollos quaaes rolles seram requeridos os pagadores que paguem atee Natal de cada hum anno so’ pena de pagarem as ditas cousas aa mayor vallia com as custas.

Pena d’arma
A pena d’arma se levara per nossa ordenaçam convém a saber: duzentos reaes e arma perdida sem se mais levar outra cousa posto que atee ora a pena do sangue em moor contya se levasse os quaees se levaram com esta decraraçam convém a saber: que a dita pena se nam levara quando algüuas pessoas apunharem espada ou qualquer outra arma sem a tirar; nem pagaram a dita pena aquellas pessoas que sem proposito e em reyxa nova tomarem paao ou pedra posto que com elle façam mal; e posto que de proposito tomem o dito paao ou pedra se nan fezerem mal com elle nan pagaram a dita pena nem a pagara moço de quinze anos pera bayxo nem molher de qualquer ydade; nem pagaram a dita pena aquellas pessoas que castigando sua molher e filhos e escravos tirarem sangue; nem pagaram a dicta pena quem jugando punhadas sem armas tirar sangue com bofetada ou punhada e as dictas penas nem cada hüa dellas nan pagaram ysso mesmo quaesquer pessoas que em defendimento de seu corpo ou por apartar e estremar outras pessoas em arroydo tirarem armas posto que com ellas tirem sangue nem escravo de qualquer ydade que com paao ou pedra tirar sangue.

Dizima [das] sentenças
A dizima da enxecuçam das sentenças he nossa e recadar-se-a na dicta villa e termo por direito real; e nam se levara dizima polla dada das sentenças soomente quando se enxecutarem; e de tanta parte soomente se levara a dicta dizima de quanta se fezer a enxecuçam e mais nan posto que a sentença de moor cantidade seja nem se levara a dicta dizima na enxecuçam se jaa da tal sentença polla dada della se levou a dizima em nossa corte.

Vento
O gaado do vento he direito reall e se recadara pera nos segundo nossa ordenaçam com decraraçam que a pessoa a cuja maao ou poder for ter o dicto gaado o vaa escrever a dez dias primeiros seguintes sob pena de lhe ser demandado de furto.
E os montados e manynhos se usaram como atee quy fezeram sem n[e]hüua contradiçam nem ennovaçam. E assy a paga dos tabaliãae».

Determinaçooens jeraes pera a portagem; paam, vinho, sal, cal, linhaça; casa movida; pasagem; novidades dos beens pera fora; cargas em arrovas; linho, lãa, panos grossos; gaados; caça; coirama; calçadura; pelitaria; azeite, mel e semelhantes; marçaria e semelhantes; metaes, ferro grosso; pescado, marisco; fruyta seca, fruyta verde; bestas; escravos; barro, louça, malega; moos, pedra; cousas de paao; palma, esparto; como se arrecadara a portagem; pena do foral.
Todos estes capítulos são idênticos aos respectivos do foral de Miranda do Douro, p. 86 a 96.

Cousas de que se non paga portagem; panos finos
Estes dois capítulos são idênticos aos respectivos do foral de Mirandela, p. 172 e 174.

Saida per terra
Este capítulo é idêntico ao do foral de Miranda do Douro, p. 94, mas falta-lhe a parte que começa: «E das ditas manifestaçoens de fazer saber», etc., até ao fim do capítulo.

Privilegiados
Este capítulo é idêntico ao respectivo do foral de Miranda do Douro, p. 94, e inclui entre os privilegiados Miranda e Vila Real; não inclui Alfaiates e não faz restrições relativamente a Lavar.
Ainda no capítulo dos Privilegiados, sem capítulo à parte, vem incluído o que o foral de Miranda dá no da Vizinhança, mas só a parte que começa: «E as pessoas dos ditos lugares», etc., até ao fim da p. 96.

E termina: «Dada na nossa muy nobre e sempre leal cidade de Lixboa a quatro de Mayo anno do nacimento de Nosso Senhor Jhesus Christo de mil e quinhentos e doze; e eu Fernan de Pyna a fiz fazer e concertey e vay escripta em treze folhas. El Rey. Foral pera Villa Frol» (220).
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(220) O original autêntico deste foral conserva-se em livro, desencadernado (!), de pergaminho, no arquivo da Câmara Municipal de Vila Flor. Consta de 2 fólios inumerados no princípio com o índice dos capítulos, mais treze numerados de frente, seguidos de dois inumerados com os vistos dos corregedores. As letras capitais são iluminadas e o texto da primeira página incluído em mimosa cercadura iluminada.
Leva os fios da alma ver tão venerando códice que, como arte, como raridade bibliográfica, como documentação histórica vale algumas centenas de mil réis, exposto a inutilizar- se à míngua de encadernação condigna!!!
Aos membros da Câmara de Vila Flor imploramos olhos de ver para este assunto mesmo no interesse próprio, não diga o ciente visitante que se descuram jóias deste quilate por não lhe atentar no valor.
Igual súplica fazemos à Câmara Municipal de Alfândega da Fé. Já perdera a esperança de apresentar aqui este foral e o de Alfândega da Fé visto resultarem infrutíferas as tentativas de um amigo, se algo tentou, e as duas excursões que fiz a essas vilas onde me responderam com evasivas risíveis se não causassem dó pela triste compreensibilidade que inculcam, quando me lembrei de recorrer mais uma vez aos bons ofícios do erudito Francisco de Moura Coutinho, tantas vezes memorado com louvor nestas páginas, que logo mos obteve. A história das minhas peregrinações pelo distrito de Bragança — os meus amores — à cata de documentação arqueológica e histórica representa em sacrifícios morais e materiais, desalentos, alegrias, dramas, melodramas, sarcasmos, apreciações deprimentes, sorrisos compassivos de espíritos grandes, vasto panorama em que as notas da alacridade e da tristitia se enlaçam desferindo a gama toda.
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MEMÓRIAS ARQUEOLÓGICO-HISTÓRICAS DO DISTRITO DE BRAGANÇA

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