Diz-se, nas terras frias de Bragança, que junto à ribeira de Quintanilha corre um sopro de segredos antigos. Ali ergue-se a capela de Nossa Senhora da Ribeira, templo venerado, onde o tempo parece deter-se no murmúrio das pedras e no brilho tremeluzente das velas.
Mas antes de ser capela, o lugar era apenas um ermo, onde a água corria clara e os pastores guardavam os seus rebanhos. Era ali que uma pastorinha, muda desde o nascimento, costumava sentar-se à beira do rio, olhando o reflexo das nuvens. Ninguém a ouvira nunca pronunciar palavra alguma. Até ao dia em que, entre o sussurrar da corrente e o ressoar distante dos sinos, uma luz desceu sobre a água.
No meio desse clarão, a menina viu aparecer a figura serena da Virgem, tão luminosa que a própria ribeira pareceu deter o seu curso. E, como se a visão lhe abrisse a alma, a pastorinha ergueu a voz, clara e firme, para anunciar ao povo o milagre que presenciava.
A notícia correu como vento pela serra. Gente de toda a parte acorreu ao lugar, trazendo promessas, velas e esmolas. No ermo da aparição, levantou-se uma ermida singela, e não tardaram a multiplicar-se os milagres atribuídos à Senhora.
Passaram-se anos, e quando a rainha Santa Isabel entrou em Portugal, trazida pelas estradas de Castela, encontrou o povo em romaria, reunido junto àquela ermida da Ribeira. Admirada pelo fervor, quis ver com os próprios olhos o que ali movia tanta devoção. Ao entrar, a rainha ajoelhou-se diante da imagem. Conta a tradição que, nesse instante, a chama de uma candeia inclinou-se sozinha, como se saudasse a santa soberana.
Santa Isabel, tocada pela formosura da Virgem, prometeu erigir um templo maior. O rei D. Dinis, ao saber, não só consentiu como mandou levantar, no monte próximo, uma fortaleza para proteger o lugar. Assim nasceram, lado a lado, a capela e o castelo, e com eles a povoação que hoje se chama Outeiro.
Ainda hoje, dizem os antigos, nas noites em que a lua cheia banha a ribeira, ouvem-se na corrente os cânticos dos primeiros romeiros, misturados com a voz clara da pastorinha que nunca mais emudeceu. E quem entra no templo, se souber escutar o silêncio, sente no coração um estremecimento, como se a Virgem ainda ali se revelasse, guardando em segredo o destino das almas que a procuram.


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