A moura do castelo de Bemposta
Na vila de Bemposta [concelho de Mogadouro] houve em tempos uma mulher, casada, que tinha forno em casa onde todos os meses cozia o pão para sustento da sua família. Quando uma vez estava a começar a amassar, entra pela porta do forno uma mulher desconhecida, mas nova, bela e encantadora, ainda que no semblante se lhe denotava tristeza; sem dar palavra deitou-lhe água na masseira e retirou-se.
A mulher nada lhe disse, mas contou o sucedido ao marido e este respondeu-lhe que se tornasse a ver essa mulher lhe perguntasse o que queria. Dias depois, e à hora de começar a amassar, apareceu a dita mulher. Então a dona do forno pergunta-lhe:
– Quem sois vós, mulher?
– Uma moura, encantada no castelo da vila, e se fores capaz de me desencantar dar-te-ei enormes tesouros que tenho – respondeu ela.
Disse-lhe a outra que aceitava, mas era preciso que lhe dissesse o que ela tinha a fazer, para dar conhecimento ao marido. No rosto da moura raiou a alegria, a sua alma encheu-se de esperança, por lhe parecer chegada a hora de se ver livre de tão penoso cativeiro, e disse:
– Não precisas mais do que ter coragem; na noite de S. João, à meia noite em ponto, hás-de estar no largo do castelo, firme como uma estátua de mármore. Não tenhas medo, não fujas nem fales no teu Deus. O teu marido pode acompanhar-te, mas deve estar oculto. Então irá uma cobra ter contigo, assobiando e fazendo barulho; darte-á uma volta à cintura e um beijo na testa; depois, logo ali, a sua pele cairá despedaçada em bocados. Não tenhas medo que essa cobra sou eu, e ficarei logo desencantada e livre, e livre ficará toda a minha riqueza e toda será tua.
Assim ficou combinado, e ao bater no relógio as doze horas da noite de S. João lá estava a mulher no local designado, e o marido oculto, ali, noutro lugar, próximo.
Pouco depois ouvem-se assobios medonhos, um barulho estranho e a cobra aparece ao longe assobiando de instante a instante. Mas a mulher, apesar de resoluta, começou a apavorar-se, e quando a cobra ia chegando próximo dela, foge transida de medo,
gritando:
– Ai Jesus, quem me acode! Ai Jesus, quem me acode!...
Ao mesmo tempo a moura, que se julgava quase livre, rompe em doloridos e longos suspiros, exclamando:
– Ai que me dobraste o meu encanto, mulher! Ai que estou perdida para séculos!
E nas trevas da noite foram-se perdendo aqueles dolorosos e enternecidos ais da moura encantada, enquanto a mulher e o marido fugiam aterrados para casa.
Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, pp. 337-339.
O castelo dos mouros de Vilarinho dos Galegos
No castelo dos mouros, de Vilarinho dos Galegos [concelho de Mogadouro], segundo diz a lenda, estão encantados um mouro e uma moura. Os tesouros neste castelo são enormes – diz-se. Ali existem teares de ouro, baús e malas atestadinhos de moedas de ouro, barras de ouro e prata, aos montes. Este tesouro desencantado chegaria para enriquecer o país inteiro.
Conta-se que em tempos um homem destes sítios visitava amiudadas vezes o castelo. Um dia apareceram-lhe os mouros, mostraram-lhe aquela grandiosa riqueza e disseram-lhe:
– Se queres ser senhor de todos estes tesouros, hás-de desencantar-nos. Para isso basta que tenhas coragem. Estás aqui, neste local, na noite de S. João, à meia noite em ponto; aqui virá ter um toiro bravo, urrando e fazendo barulho, mas não tenhas medo, que o toiro sou eu; não hás-de fugir nem falar no teu Deus; logo que chegue a ti põe-lhe a mão na testa, e basta.
O homem aceitou. Na noite de S. João, à meia noite, lá estava no lugar marcado. Mas, eis que aparece o toiro, urrando e escavando no chão com as mãos e pés; e o homem, cheio de medo, vendo aproximar o toiro, foge gritando:
– Ai Jesus, quem me acode! Ai Jesus, quem me acode!
Tudo estava transtornado, é claro, e os mouros que se julgavam livres, desapareceram no meio de suspiros e dolorosos ais, e lá voltaram para o seu penoso cativeiro com o encanto dobrado.
Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, pp. 338-339.
O castelo do Mau Vizinho
Por baixo deste lugar [Algozinho, concelho de Mogadouro] se vê, e ainda fora da terra, em cinquenta palmos de altura, um castelo demolido, que dizem ser fabricado pelos mouros e, pelos vestígios que manifesta, fora bem fortalecido.
A povoação de Algosinho (...) assenta na encosta da ribeira de Algosinho, coisa de seiscentos metros acima do Castelo do Mau Vizinho, também chamado Castelo dos Mouros, ou simplesmente Castelo, que é um pequeno recinto de vinte metros de diâmetro, pouco mais ou menos, cercado de muros de mais de metro de grossura, por um fosso e por uma faixa de dez metros de largura cravada de pedras de mais de metro de altura com a ponta aguçada para cima, à laia de estrepes, a fim de dificultar os
ataques da cavalaria e infantaria.
Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, p. 107.
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