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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 27 de julho de 2021

Guerra Junqueiro: "O rico e o pobre"

 Martinho era um rapazito, que ganhava a sua vida a fazer recados; um dia, voltando de uma aldeia muito distante da sua, achou-se cansado e deitou-se de baixo de uma árvore, à porta de uma estalagem, junto da estrada. Estava comendo um bocado de pão que tinha trazido para jantar, quando chegou uma bela carruagem em que vinha um fidalguinho, com o seu preceptor. O estalajadeiro correu imediatamente e perguntou aos viajantes se queriam apear-se, mas responderam-lhe que não tinham tempo, e pediram-lhe que lhes trouxesse um frango assado e uma garrafa de vinho.

Martinho estava pasmado a olhar para eles; olhou depois para a sua côdea de pão, para a sua velha jaqueta, para o seu chapéu todo roto, e suspirando exclamou baixinho: Oh! se eu fosse aquele menino tão rico, em vez do desgraçado Martinho! que fortuna se ele estivesse aqui, e eu dentro daquela carruagem! O preceptor ouviu casualmente o que dizia Martinho e repetiu-o ao seu aluno, que, lançando a cabeça fora da carruagem, chamou Martinho com a mão.

- Ficarias muito contente, não é verdade, meu rapaz, podendo trocar a minha sorte pela tua? - Peço que me desculpe senhor, replicou Martinho corando, o que eu disse não foi por mal. - Não estou zangado contigo, replicou o fidalguinho, pelo contrário, desejo fazer a troca.

- Oh! está a divertir-se comigo! tornou Martinho, ninguém quereria estar no meu lugar, quanto mais um belo e rico menino como o senhor. Ando muitas léguas por dia, como pão seco e batatas, enquanto que o senhor anda numa carruagem, pode comer frangos e beber vinho. - Pois bem, volveu o fidalguinho, se me queres dar tudo aquilo que tens e que eu não tenho, dou-te em troca de boa vontade tudo o que possuo. Martinho ficou com os olhos espantados, sem saber o que havia de dizer; mas o preceptor continuou: “Aceitas a troca?”- Ora essa! exclamou Martinho, ainda me pergunta! Oh! como toda a gente da aldeia vai ficar assombrada de me ver entrar nesta bela carruagem! E Martinho desatou a rir com a ideia da entrada triunfante na sua aldeia.

O fidalguinho chamou os criados, que abriram a portinhola e o ajudaram a descer. Mas qual foi a surpresa de Martinho, vendo que ele tinha uma perna de pau e que a outra era tão fraca, que se via obrigado a andar em duas muletas: depois, olhando para ele de mais perto, Martinho observou que era muito pálido e que tinha cara de doente.

Sorriu para o rapazito com ar benévolo, e disse-lhe: - Então sempre desejas trocar? Querias porventura, se pudesses, deixar as tuas pernas valentes e as tuas faces coradas, pelo prazer de ter uma carruagem e andar bem vestido? - Oh! não, por coisa nenhuma! replicou Martinho. - Eu, disse o fidalguinho, de boa vontade seria pobre, se tivesse saúde. Mas, como Deus quis que fosse aleijado e doente, sofro os meus males com paciência e faço por ser alegre, dando graças a Deus pelos bens que me concedeu na sua infinita misericórdia.

Faze o mesmo, meu amiguinho, e lembra-te que, se és pobre e comes mal, tens força e saúde, coisas que valem mais que uma carruagem, e que não podem comprar-se com dinheiro.

Fonte:
Guerra Junqueiro: "Contos para a Infância", Publicado originalmente em 1877.

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