Pudesse eu assim cantar meu fado
E dizer: "sou Engenheiro dos de certo!"
Que depressa um padrinho mais prendado
Me faria passar a efectivo
De uma Câmara pouco ou nada exigente...
E então também eu me passearia
Em carro mais ou menos reluzente,
Como vem fazendo aqui e agora
Muito homúnculo a que por bizarria
Damos desde há tempo o epíteto de "gente"!
Mas -ai de mim!- que não sou Sousa
Nem bacharel nem engenheiro...
Que não me inscrevi à pressa numa Independente
Universidade de trazer por casa...
Nada tenho e é pouca a cousa
Que faz de mim um cidadão honrado:
Como muitos pago imposto e sou roubado...
Quando era estudante fui chumbado
Por não dizer "amen" como o restante gado
E ter mantido o nariz bem empinado!
Agora aqui estou -pobre de Deus!-
Faço versos que dou aos meus amigos...
Bebo copos de vinho rasca e baptizado
Rio-me do mundo e deste povo esfarrapado
Que leva no toutiço e 'inda ri e bajula
O semp'eterno, escrevendo no caderno
Avé Marias cheias de graça e de dinheiro...
Esse bruto, cabeça oca, esse farsola que aceita
Ser governado por um pseudo-engenheiro,
Porque, ao que parece, já não há quem queira
A chave velha e ferrugenta do palheiro!
Veríssimo Ramos
(num dia em que, como Bocage, se achou mais pachorrento!)
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