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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

QUARENTA NOITES - Fernando Calado

Por: Fernando Calado
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)

Amanhecia. A aldeia continuava silenciosamente estranha. A tia Jacinta embrulhou-se pesadamente no xaile de lã e arrastou os anos, com medo de morrer:
― Raios partam este bicho, que nos há de matar a todos! 
Cuspiu para o chão e, vagarosamente, olhou na direção do céu, lá para os lados da Senhora da Serra, como quem pede perdão. As lágrimas caíam-lhe dos olhos cinzentos. Apertou mais o xaile e arrastou a vida para dentro de casa.
O tio Alfredo nem reparou na vizinha, no deslumbramento da sua cerejeira tão florida, e sozinho, sentado à porta da sua casa, ia cismando nas coisas da vida. Ficara viúvo. Filhos ausentes em Espanha e na Alemanha. Tinha a esperança de que regressassem para o seu funeral. Agora é melhor que não venham, que fiquem por lá. Se calhar, também já estão doentes. Levantou-se a custo, olhou dolorosamente para a cerejeira e, em tom profético, murmurou, quase resignado:
― Este ano já não como as cerejas!
Um carro passou na estrada, riscando o silêncio. O altifalante magoava: 
― Fiquem em casa!… Fiquem em casa!

In: Quarenta noites

Fernando Calado
nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança. 
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.

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