terça-feira, 1 de novembro de 2022

“A MINHA APOSTA É FAZER DO MUSEU DO ABADE DE BAÇAL UM MUSEU DE ELITE PARA TODOS”

 Jorge da Costa é o novo director do Museu do Abade de Baçal e da Domus Municipalis


Tornar o Museu do Abade de Baçal acessível a toda a gente, mas proporcionar uma “experiência fantástica” a quem o visite, onde a qualidade seja o cartão de visita, é a grande missão de Jorge da Costa, que neste primeiro dia de Novembro se estreia no papel de director do emblemático espaço brigantino. Com 53 anos, esteve, nos últimos 15, à frente do Centro de Arte Contemporânea Graça Morais, também ele em Bragança. O papel de director também o assumiu no Centro de Fotografia Georges Dussaud, que fica, igualmente, nesta cidade. Jorge da Costa vai ser também agora o director da Domus Municipalis e, em entrevista ao Jornal Nordeste, revela que quer dinamizar este espaço, dando a conhecer a história que carrega a todos quantos o visitem. Jorge da Costa ganhou, com mais de 19 valores, o concurso público que o coloca à frente de dois espaços que, segundo promete, muito nos vai apetecer visitar.

Porque é que decidiu que queria partir para esta aventura? Que homem é este que agora chega à direcção do Museu do Abade de Baçal?

O que me fez aventurar neste concurso? Há várias razões! Estava à frente do centro de arte desde o início, 2007, ainda estava ele em obras. Eu tinha um projecto e senti que, 15 anos passados, o tinha cumprido. Estou muito feliz e muito satisfeito com as exposições que realizei, quer da pintora Graças Morais, quer dos artistas que convidei, quer das grandes colecções, quer, sobretudo, de colecções de instituições como a Gulbenkian, Serralves, Culturgest, que ali passaram. Também no Centro de Fotografia Georges Dussaud foram realizadas inúmeras exposições. Para além das exposições, ficam também duas fantásticas colecções, uma de arte contemporânea, no centro de arte, e outra grande colecção, no centro de fotografia, sobretudo das obras de Georges Dussaud. Foram publicados inúmeros livros e catálogos. Portanto, produziu-se muito conhecimento e isso é uma grande satisfação. Por outro lado, senti que era interessante agarrar num novo desafio: dar também o meu contributo ao Museu do Abade de Baçal, aproveitando a minha experiência. Gostava de levar agora um novo projecto ao museu da minha cidade e da minha região.

Antes de falarmos desse contributo... o centro de arte deu-lhe muita visibilidade, pelo menos, a nível nacional. É triste deixá-lo?

Não. Não é nada triste. Saio plenamente satisfeito. Foi um percurso difícil, de muita luta e trabalho e, felizmente, o centro de arte é hoje uma referência, pelo menos, a nível nacional. Não é por acaso que instituições de referência querem trabalhar com ele. Assim como muitos artistas nacionais e estrangeiros querem também ali expor. As pessoas acham que o meio artístico não está atento a Bragança, mas está e isso tem sido muito satisfatório. Há também algo que para mim é interessante. Para além de dizer que sinto que o meu projecto está concluído, a verdade é que defendo que os lugares não devem ser eternos. É necessário que venha gente nova, sangue novo. A pergunta que agora toda a gente me faz é quem vai dirigir o Centro de Arte Contemporânea Graça Morais, mas não estou preocupado com isso porque sou muito positivo e acredito que vem aí alguém com outras ideias, que pode levar o centro ainda mais além. O mais difícil já foi construído. Agora é só melhorar.

As pessoas começam a ter mais interesse em conhecer o que têm no território ou passa-nos muito ao lado? Que sentiu nestes 15 anos?

Creio que ainda há muito a fazer. O centro de arte investiu muito nessa questão e tentou dar resposta a essa diversidade de pessoas que podem visitar um centro de arte ou um museu. Os brigantinos têm respondido positivamente. A grande questão que se colocava, quando o centro abriu, era: como é que os brigantinos iriam reagir à arte contemporânea? E a verdade é que foi muito fácil. O centro teve esse sucesso imediato junto do público e fidelizou-o rapidamente. Há hoje em Bragança um público consumidor de arte. Acredito que, com as propostas que os museus podem apresentar, possam ser cada vez mais atractivos. Dou o exemplo do Museu do Abade de Baçal. Se calhar há muitos brigantinos que nunca o visitaram, mas também há muitos que nunca foram ao teatro ou ao centro de arte... mas há muita gente que conhece bem as colecções fantásticas que o Museu do Abade de Baçal tem. É, sobretudo, um museu com uma colecção permanente, mas é preciso tentar dar a volta a essa colecção, enriquece-la, trazer coisas novas.

É muito acarinhado na cidade, sobretudo, por causa deste mundo das artes. Portanto, o que é que pode dar de novo ao museu? Falava de sangue novo, que acredita que quem chegue agora ao centro de arte trará novas ideias... então também as tem para o museu. Quais são essas ideias?

Esta decisão foi muito pensada. Por isso, apresentei um projecto muito detalhado daquilo que pretendo fazer. O museu precisa, sobretudo, que a colecção seja enriquecida. Precisa também, por exemplo, que seja dada mais atenção à figura do Abade de Baçal porque, para além de alguns retratos e bustos, não temos muito o que nos mostre quem era exactamente. A sala do Abade de Baçal vai ser o meu primeiro contributo. Pretendo que quem entre no museu fique logo a perceber quem foi esta figura extraordinária. Pretendo também criar relações com museus, sobretudo nacionais, como o Museu Soares dos Reis, que tem uma colecção fantástica do naturalismo, que o Museu do Abade de Baçal também tem. Muitas vezes, estes museus nacionais têm obras nas reservas que, por falta de espaço, não são mostradas. Porque é que não podem ser mostradas em Bragança, se há uma relacção com essa mesma colecção? Isto é uma forma de trazer novas obras mantendo os núcleos muito importantes que aqui existem. O mesmo acontece com as obra do Almada Negreiros. Porque é que não podem existir obras novas, que sejam emprestadas por outros museus? A minha aposta também vai ser muito forte no que toca à divulgação do museu. Muitas vezes, as coisas ficam fechadas dentro dos espaços museológicos. É preciso trazê-las para fora. Sabemos que a comunicação social está muito atenta ao que se passa em Lisboa e no Porto e, se calhar, menospreza um bocadinho o que se passa no resto do país. Isto é um trabalho de fundo mas que pode ser feito e que pode, realmente, acontecer.

É possível atrair os jovens? Parece que se interessam mais por espaços como o centro de arte...

O Museu do Abade de Baçal tem um número de visitantes penso que, quando comparado com o Centro de Arte Contemporânea, não seja muito diferente. Aliás, o museu tem uma estratégia de serviço educativo e esta relação com as escolas é muito activa. É preciso torná-la ainda mais. Temos que nos socorrer de um conjunto de estratégias para continuar a levar os brigantinos ao museu. Também a Domus Municipalis será uma grande aposta, pois precisa de alguma dinâmica. É preciso mostrá-la. Na Primavera/Verão, haverá uma exposição sobre ela, dentro da própria Domus. Muitas vezes, quem chega e quem visita o monumento desconhece que existe uma cisterna e até a própria história da reconstrução daquele monumento. Há muitas coisas, nomeadamente fotografias do Abade de Baçal no monumento, antes de este ser reabilitado. Há muito a mostrar. Isto pode resultar também numa estratégia canalizadora de visitantes da Domus para o museu. A minha aposta é fazer do museu, parafraseando uma expressão do director do Teatro de São João, mas alterando-a um bocadinho, “um museu de elite para todos”. Quero que seja acessível a toda a gente. Falarmos de elitismo é falar de qualidade. O público procura a qualidade e não podemos dar-lhe qualquer coisa. Isso é muito importante. Quero que quem lá vá saiba que vai gostar da visita. Quero que as pessoas saiam do museu e sintam que a visita valeu a pena. Quero que quem entre no museu tenha uma experiência extraordinária.

Esta vontade de dar o seu contributo ao Museu do Abade de Baçal já estava planeada há algum tempo ou foi algo que surgiu recentemente?

Já ia sendo pensada há algum tempo. Não foi uma coisa momentânea.

Já falou do que pretende dar àquele espaço, mas o que acha que o museu lhe pode dar a si? 

Estou muito feliz, mas sobretudo muito motivado. Aquilo que tenho em projecto só será possível com a colaboração da equipa do museu. Quero partilhar estas ideias todas e motivar a equipa. Valorizo muito as relações pessoais e quando há uma boa relação e há empatia tudo corre melhor. A tal ideia que, vulgarmente, chamamos de ‘vestir a camisola’... eu quero que a equipa vista a camisola porque eu já a vesti. Acredito que a equipa a vai vestir comigo. Isso é a grande expectativa que tenho para o começo do meu trabalho no Museu do Abade de Baçal.

Jornalista: Carina Alves

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