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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

O PERFUME

Por: Maria dos Reis Gomes
(colaboradora do Memórias...e outras coisas...)

Este título poderia sugerir falar do magnifico filme “Perfume de Mulher” ou do romance “O perfume - História de um assassino”, de Patrick Suskind. A prosa poderia desenvolver-se sempre com agrado. pois uma e outra obra são interessantíssimas e apelam aos sentidos. Apenas porque envolve “aromas”, liga-se de certa forma a uma das histórias de vida que marcaram o meu percurso profissional e hoje recordo.
As missões que, por vezes, se pretende atribuir à escola, para além das que tradicionalmente o seu estatuto lhes reserva, são múltiplas e variadas. Algumas, dir-se-á, estão a léguas das suas funções. Não lhe cabe, diz-se também, resolver problemas que compete às instituições de apoio à família resolver. É verdade, não compete. Não é sua obrigação. A menos que, por força do trabalho que desenvolve, se sinta obrigada a resolver. A história que trago aqui hoje é um destes casos.
O Duarte era um jovem de 15 anos, fisicamente desenvolvido, pacato e com pouca iniciativa. Procurava o contacto dos adultos (funcionários ou professores), pois os colegas “dispensavam-no” dos seus grupos, e dos seus jogos e brincadeiras, dizendo que ele cheirava mal.
De facto, o Duarte apresentava roupas descuidadas, o que, combinado com a enurese nocturna de que sofria, resultava um cheiro pouco convidativo a aproximações. Dado o desinteresse e completo alheamento da mãe, procuramos resolver a situação da enurese junto do médico de família. Deste preocupante desinteresse, decorre a decisão do Duarte, de levar para a escola toda a medicação que controlava a epilepsia de que sofria, porque tinha receio que a irmã de 2 anos a pudesse ingerir.
Para resolver o problema da higiene foi-lhe permitido que tomasse banho todos os dias nos balneários do ginásio. Simultaneamente, foi organizada, junto aos balneários, uma zona de “perdidos e achados”, com 3 caixotes: um para calçado, outro para roupas interiores, e outro ainda para vestuário diverso. Os jovens que assim o entendessem podiam recorrer a estes caixotes, que toda a escola se preocupava em reforçar com doações. 
Reunidas que estavam as condições, o Duarte começou a aparecer mais arranjado. Gostava que lhe dissessem isso e, um dia, por altura do Natal, uma “alma inspirada” deu-lhe um perfume que ele nunca mais largou. Deve ter sabido doseá-lo muito bem. 
O perfume é sedução, é auto-estima, é afirmação. O Duarte, se não o sabia já, ficou a conhecer empiricamente esse efeito.
A verdade é que este conjunto de modificações trouxeram mais segurança à vida deste jovem. Se, com isto, não passou a ser o primeiro a ser chamado para os grupos, pelo menos deixou de ser repelido. O que para ele foi de grande significado.
A escola era o lugar securizante onde ele permanecia muito para além do tempo que lhe era exigido.
Foram tempos bons. Com mais calma. Com mais tempo para reflectir e menos daquela carga burocrática que apenas serve para alimentar estatísticas.

Maria dos Reis Gomes – 07/12/2022

Maria dos Reis Gomes
, nascida e criada em Bragança.
Estudou na Escola do Magistério Primário em Bragança, no Instituto António Aurélio da Costa Ferreira em Lisboa e na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação no Porto, onde reside.
Sempre focada no ensino e na aprendizagem de crianças com NEE (Necessidades Educativas Específicas) leccionou no CEE (Centro de Educação Especial em Bragança). Já no Porto integrou o Departamento de Educação Especial da DREN trabalhando numa perspetiva de “ escola para todos, com todos na escola). Deu aulas na ESE Jean Piaget e ESE Paula Frassinetti no Porto.
A escola, a educação e a qualidade destas realidades, são os mundos que me fazem gravitar. Acredito que, tal como afirmou Epicteto “ Só a educação liberta”. Os meus escritos procuram reflectir esta ideia filosófica.

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