sábado, 22 de novembro de 2025

E mais Zelas e Romanos… E o 25 de Dezembro como data do nascimento de Jesus Cristo…

Por: Rui Rendeiro Sousa
(Colaborador do "Memórias...e outras coisas...")


 Uma minha conterrânea, e muito bem, deixava um comentário na publicação anterior, associando a data do Natal ao Solstício de Inverno. E não só, mas também… O problema, nestas incursões, é tentar ser sintético, o que fácil não é. Que a nossa História colectiva, como já por aqui o mencionei, dá «pano para mangas». Mas regressemos ao Solstício de Inverno. O período que marca a «nova luz», ou o que corresponde à passagem para um novo tempo, no qual os dias começam a aumentar. Desde tempos muito remotos que este período era festejado, de diversas formas. Ou assinalado, inclusive, através de monumentos megalíticos. Tudo tem uma explicação, os nossos antepassados “num se dabum ó trabalhinhu’e de butare uns calhaus impinadus’e, só pur’u que sim’e”…

Depois, há relatos de inúmeras manifestações relacionadas com celebrações que em muito antecederam o Natal. Quem dúvidas tiver, poderá pesquisar lendas relacionadas com o renascimento do urso, ou outras. Ou ainda procurar uma festa que toma o nome de Yule ou Jól… Da qual provêm muitas das nossas tradições natalícias, como o pinheiro (ou o cedro), as decorações da árvore, o azevinho, as pinhas, o tronco de Natal, seja na versão literal ou na versão bolo, os frutos secos, as cores… Outras podendo procurar… Sabendo-se que os nossos antepassados Zelas, como já por aqui trouxe, tinham um especial fascínio pelos astros, tal como o tinham muitos dos povos de substrato pré-romano. Aliás, o nome «Zoelae» derivará de «sol» ou, por estudos baseados no indo-europeu, de «pequeno deus celeste». Assim como o deus que adoravam esses «nossos avós» seria a «estrela da manhã». Sempre a luz e os astros presentes, numa milenar tradição. 

Quando os Romanos aqui aportaram, que à actual Itália tinham previamente chegado provindos da Europa Central, trouxeram os seus ancestrais cultos, assimilando-os com os pré-existentes. Tendo, igualmente, imposto outros mais tardios. Nos quais passaria a incluir-se o «Natalis Solis Invictus», ou seja, o «o nascimento do deus sol invicto», prática instituída a partir do século III. Que se institucionalizaria no dia 25 de Dezembro, porque no Calendário Juliano era esse o dia do Solstício de Inverno! Conjuntamente com as pomposas celebrações das Saturnálias, em honra do deus Saturno, nas quais, por entre muito pagode, se trocavam… presentes! E ainda, particularmente com os soldados romanos, o culto a Mitra, o «génio da luz celeste», nessa mesma data. Festas estas que atingiram elevados patamares, mesmo junto daqueles que se convertiam ao Cristianismo, mas se recusavam a abandonar as suas velhas festividades, misturando crenças cristãs com costumes pagãos. 

E porquê o Natal a 25 de Dezembro? Há duas versões para a escolha desta data. Uma, vinda da velha tradição dos patriarcas que faziam coincidir a data da morte com a data da concepção. Isto é, era tradição que Jesus Cristo teria morrido na cruz a 25 de Março. Seguindo esta tradição, teria sido concebido nessa data, que ainda hoje celebramos. Como a gravidez dura nove meses… Jesus nasceria a 25 de Dezembro! Opinião pessoal, esta versão parece-me um pouco rebuscada… A segunda versão, até pelos diversos escritos que nos foram deixados, é a de que a Igreja transferiria os grandes festejos inicialmente celebrados a 6 de Janeiro, com a Epifania, que já haviam sido influenciados por festas pagãs, para o dia 25 de Dezembro, transformando-o no dia da Natividade. Tudo porque não conseguiu impedir que os cristãos celebrassem rijamente o aniversário do sol ou, até, que participassem nos festejos a Mitra… Alguns dos chamados «doutores da Igreja», em oposição às festas pagãs, afirmavam que Jesus é que era o verdadeiro sol, como é bom exemplo o conhecido Santo Ambrósio, que escrevia «este é o nosso novo sol». 

A partir de Roma, esta nova data para o nascimento de Cristo, irradiaria para todo o Ocidente, acabando, com maior ou menor dificuldade, por se impor. Que por estas terras, ainda no século VI o paganismo imperava… Hoje em dia, alguns estudos mais apurados, apontam até para a possibilidade de que Jesus Cristo poderá ter nascido uns anos antes da data apontada. Por outro lado, há um dado paralelo curiosíssimo, por isso o trago aqui. Em finais de Dezembro, as temperaturas médias nocturnas em Belém oscilam entre os 3 e os 7 graus. Ora, com essas temperaturas, não há pastores a circular com os seus rebanhos. Estão a ver onde quero chegar? Pois, por essa descrição dos pastores e seus rebanhos, bem como por outros dados paralelos, tudo aponta para que Jesus Cristo, de facto, tenha nascido na Primavera, provavelmente no mês de Abril… Por isso, o dia 25 de Dezembro, não é a data de aniversário de Jesus Cristo. Mas sim o dia em que Ele passou, pelos motivos explanados, a representar a «nova luz». Curiosidades… 

Assim como curiosidade é, resquícios das anteriormente aludidas Saturnálias, onde o pagode envolvia que os homens se trajassem de mulheres, e vice-versa, ou que os servos fossem servidos pelos senhores, numa completa inversão de papéis, encontrarmos hoje resquícios no pagode dos «Caretos» e das célebres «Festas dos Rapazes», em pleno período natalício… Mas essas já cá as trarei um dia destes… Temos tanto, “or sim’e”?…

Por este e outros motivos, aqui trouxe, há uns dias, o nosso insigne conterrâneo Frei Francolino Gonçalves, um dos maiores exegetas bíblicos, com o qual tive o privilégio de discutir este tema da Natividade, bem como muitos outros, por horas e horas a fio. Esta também é uma forma de o homenagear, uma vez mais. Porque, para lá dos destacados cargos que ocupou, era um trasmontano dos sete costados! Mais houvesse…

(Foto: A Natividade - El Greco)


Rui Rendeiro Sousa
– Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer. 
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas. 
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana. 
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros. 
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.

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