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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 2 de abril de 2024

Reclusos de Bragança encontram segunda oportunidade a trabalhar

 Emiclau, DNMAT e Mecatérmica são três das empresas que dão ou já deram emprego a reclusos do estabelecimento prisional de Bragança


O dia tinha acabado de começar, mas estava na hora de levantar e aproveitar as segundas oportunidades. Abrem-se os portões do Estabelecimento Prisional de Bragança e a liberdade parece estar mais próxima. Para quem vive entre grades, poder sair para trabalhar é dar um passo para o regresso à normalidade. 
António Rodrigues cumpre pena há quase oito anos, mas a sua vida mudou nos últimos meses quando teve a oportunidade de trabalhar na empresa DNMAT. Se a felicidade tem um rosto, seria o deste recluso. Apesar de já ter trabalhado num estabelecimento comercial e no atendimento ao público, o trabalho que agora desempenha é outro. É um verdadeiro “polivalente”, desde trabalhar na serrilharia, no armazém ou até na parte mais logística. O importante é trazer a cabeça ocupada. “Quando andamos a trabaÂngela Pais lhar andamos sempre ocupados, não pensamos em certas coisas e passa-se melhor o tempo”, contou, salientando que “faz toda a diferença” poder trabalhar fora do estabelecimento prisional. A integração parece ter sido fácil e sem discriminações. “Estou a gostar muito”, disse com um sorriso nos lábios. Até já fez amizades. “Só tenho aqui amigos, acolherem-me bem, não senti diferença nenhuma", vincou, acrescentando que esta experiência “dá coragem para continuar”.
É a primeira vez que a empresa DNMAT, em Bragança, dá emprego a um recluso. A oportunidade surgiu devido à falta de mão-de-obra. Assim, decidiram “juntar o útil ao agradável” e dar uma segunda oportunidade a quem precisa. “Faz parte das empresas locais fazerem com que as pessoas se reintegrem. Toda a gente pode ter um percalço, mas estamos aqui para contribuir com a sociedade e no que podemos ajudar, ajudamos”, disse o proprietário Nuno Rodrigues. O empresário salientou que “ninguém mais do que as empresas”, que são quem cria postos de trabalhos”, terá que contribuir para a integração destas pessoas. E apesar de ser uma experiência recente, está satisfeito. “Está a portar-se bem, tem capacidade de trabalho, é humilde, está sempre pronto, não tenho nada apontar pela negativa”, frisou, acrescentando que dar uma segunda oportunidade a quem está privado da liberdade pode servir até de “alento” para que sejam “proactivos” e “produtivos” o que é uma “mais-valia” para a empresa. 
Embora reconheça que a sociedade está sempre de “pé atrás” com os reclusos ou ex-reclusos, a integração de António Rodrigues na DNMAT foi fácil e sem qualquer discriminação. “Não há discriminação nenhuma, até porque a pessoa em causa é educada, humilde e integrou-se na equipa, todos a respeitaram, assim como ela está a respeitar a equipa”, sublinhou. A empresa é ainda responsável por ir buscar e levar o recluso ao estabelecimento prisional.
Apesar de toda essa logística, Nuno Rodrigues não tem dúvidas de que “compensa” e está “satisfeito” com este novo funcionário. Carlos, nome fictício, é um ex-recluso que, tal como António Rodrigues, começou a trabalhar ainda estava no estabelecimento prisional de Bragança. Cumpriu pena durante quatro anos e pouco tempo antes de terminar começou a trabalhar na empresa Mecatérmica, em Bragança. “Desde que surgiu a oportunidade de poder sair e trabalhar fora foi muito bom, foi uma boa adaptação e o tempo passa de maneira diferente”, disse. Agora é já um ex-recluso, mas nem por isso deixou a empresa. “Está a correr muito bem. Já aprendi muitas coisas, é muito bom para a minha carreira profissional e acho que estou a desenvolver bem na empresa”, contou, acrescentando que não sentiu qualquer discriminação, porque a “equipa é boa” e foi “bem” acolhido pelos colegas e sem qualquer julgamento.
A Mecatérmica é uma empresa de climatização em Bragança. Carlos disse já ter alguma experiência na área, até porque o seu pai trabalhou na área e desde pequeno que o acompanhava. Ainda assim, tem aprendido coisas novas. O ex-recluso reconhece que o trabalho é um dos passos para poder voltar a integrar- -se na sociedade. “Uma pessoa que se queira adaptar e que não tenha medo ao trabalho, é uma boa maneira de se integrar”, vincou. Há cerca de seis anos que a Mecatérmica dá emprego a reclusos. Já fiz serviços no estabelecimento prisional e devido à “boa relação” que têm, a empresa decidiu contribuir para estas pessoas se reintegrem na sociedade. “Temos que fazer algo por alguém que errou para evitar que volte a errar novamente. Em termos de solidariedade eu prefiro integrar pessoas que falam a mesma língua que eu, que têm os mesmos costumes, do que pessoas que não têm nada disso. Prefiro dar essa oportunidade a estas pessoas”, salientou o empresário Francisco Almeida.
Carlos é o terceiro recluso a quem a empresa dá trabalho. Mas neste caso, mais do que trabalho, dá também alojamento, sem qualquer custo, sendo mais um ponto a favor da sua integração. “Foi uma pessoa que teve uma integração bastante boa, porque saiu do estabelecimento prisional e tem local onde dorme, junto com os colegas”, contou. Ainda assim, admite que tem “sérias dúvidas” de que a sociedade esteja preparada para receber estas pessoas. Por isso, acredita que dando emprego é também uma forma de “desmistificar o receio” que as pessoas possam ter sobre um recluso. “Nota-se que existe sempre algum receio. O primeiro impacto é sempre custoso, mas depois de algumas semanas, ao longo de algumas cervejas bebidas em conjunto, cria-se alguma empatia e esses receios acabam por desaparecer”, referiu. Além disso, esta é também uma forma de resolver outro problema: a falta de mão-de- -obra. “Também as empresas precisam de mão-de-obra. Digamos que é bom para eles, para sociedade e para nós”, acrescentou. Carlos é o único ex-recluso que ainda se mantém na empresa.
Segundo Francisco Almeida, os outros já tiveram a oportunidade de “voar” e aí significa que está cumprida a missão. “Já nos aconteceu alguns casos em que ajudamos bastante, desde o ir recolher ao estabelecimento, levá-los, meses a fio, contribuir para a liberdade condicional e depois disso, estando já com asas, voaram. Isso quer dizer que é bom. Se tem asas para voar, já está integrado”, concluiu.
Outra das empresas em Bragança que também dá emprego a reclusos é a Emiclau. Embora neste momento não tenha nenhum, desde 2010 que o faz e até já perdeu a conta a quantos já empregou. O empresário Claúdio Martins disse ter sido, até agora, uma experiência “agradável”, com “bom gente”, embora a integração dependa de pessoa para pessoa. “Alguns mais fácil de integrar do que outros. Na nossa empresa não há olhar de lado, são bem integrados, bem acolhidos e não são discriminados”, frisou, acrescentando que “toda a gente merece uma segunda oportunidade”. Mas há um ex-recluso que ainda se mantém na empresa e que tem surpreendido de dia para o dia o empresário. “Um deles ainda continua a trabalhar connosco. Significa que se integrou na empresa, gostou e ficou”, contou.
O proprietário da empresa de construção civil não tem dúvidas de que dar a oportunidade de emprego a estas pessoas é o caminho para a integração. “Para essas pessoas faz muita diferença, porque é uma maneira de se integrarem mais facilmente na sociedade quando saem”. Cerca de 10% dos reclusos do estabelecimento prisional de Bragança trabalham em regime exterior.
De acordo com o director da prisão, Nuno Pires, este número é “muito bom”, uma vez que grande parte dos reclusos deste estabelecimento prisional estão em regime de prisão preventiva, o que significa que não podem trabalhar fora. “Só podem trabalhar lá fora pessoas que já tenham a situação jurídica definida e que já reúnam condições para poder ir a casa”, explicou. Esta parceria entre o estabelecimento prisional e as entidades dura já há alguns anos e já envolveu “mais de 50 empresas”, mas também Câmara Municipal e Juntas de Freguesia. “Conseguimos fazer uma ligação harmoniosa e de receptividade bilateral no sentido de proporcionarmos mão-de-obra e as empresas aceitarem mesmo sendo recursos e é preciso valorizar essa componente de reinserção social, porque o trabalho é um elemento importantíssimo na recuperação de pessoas que passaram por regimes privativos de liberdade”, destacou Nuno Pires.
Actualmente, há oito empresas em Bragança que dão emprego a reclusos desta prisão. “Incluídos ou integrados em empresas, funcionam exactamente como sendo um trabalhador normal. Ninguém sabe se são reclusos e é isso que nos interessa, que sejam cidadãos de perfeita harmonia, sem qualquer restrição ou desvantagem em relação aos outros”, vincou.
O estabelecimento prisional de Bragança tem 80 reclusos.

Jornalista: 
Ângela Pais

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