segunda-feira, 30 de novembro de 2020

O Natal que se aproxima

Por: António Orlando dos Santos (Bombadas)
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

Não deixa de ser uma ironia o facto de me ver confrontado com o receio de me poder vir a sentir triste e melancólico no Natal que se avizinha.
Durante sessenta anos o Natal era o tempo que menos me custava passar. A safra era tão absorvente que nos sonegava até o conceito de tempo, daquele que se mede em horas e dias e que fora do tempo de Natal se fazia ronceiro, demasiadamente vagaroso para o gosto da juventude que comigo se entregava de coração à confecção de Bolo-rei e outras especialidades relacionadas com época tão especial.
Mas o tempo futuro pode ser previsto, mas jamais com certeza, pois é unânime que esta Pandemia que nos inquieta, surgiu do nada que, como num golpe de mágica se tornou em pesadelo.
Cada família tem os seus rituais para que quando se fragmenta, seja por razões imperativas ou simplesmente porque os seus membros decidem afastar-se, no tempo próprio que a antiquíssima tradição cristã designa como a do nascimento de Jesus, vulgo, Natal, a tendência é para ser nesse tempo repetido que a casa principal se prepare para os receber.
Este Natal será previsivelmente pouco favorável a reuniões familiares e por isso é melhor precavermo-nos para não sermos apanhados desprevenidos.
Talvez não seja descabido relembrar o tempo passado e fazer uma resenha, mesmo que tosca, dos Natais a que me refiro atrás para dar um pouco de cor e luz a estas memórias que o confinamento nos traz. Esse era o tempo da "safra do Bolo Rei”.
Estive até aos quinze anos na Pastelaria Ribeiro e sempre nesse tempo se fez Bolo-rei. A qualidade era boa, pois o Snr Ribeiro tinha um receituário digno, que segundo ele era o da Confeitaria Cunha do Porto, onde foi interno desde pequeno até à idade adulta.
As quantidades produzidas não eram ainda muito grandes pois havia uma parte da clientela que estava habituada a comprar no Pousa, no Sousa, no Miranda Braga, no Chico Machado e até no Verbo, que o importavam do Porto. Era Bolo-Rei feito nas Confeitarias Costa Moreira, Paupério, Cunha, Brasileira e que era despachado atempadamente, o que lhe retirava alguma da sua frescura, sendo este pormenor a razão porque lentamente as pessoas passaram a preferir o Bolo Rei fresco da Pastelaria Ribeiro em vez do que vinha da Cidade invicta.
O processo de fabrico era ainda do tempo da Padeira de Aljubarrota pois as massas eram amassadas à mão e cozidas em forno de lenha, cuja lenha estava ao encargo de ser fornecida pelas mulheres que viviam na Boavista e que tinham nisso parte do seu ganha pão, pois queimavam-se umas toneladas de estevas e outros arbustos que eram armazenados até estarem suficientemente secos para serem queimados. Assim a Tia Carrachela, a Delovina, a Tia Gibóia e a Senhora Balbina eram as mais frequentes nesta tarefa, havendo algumas mais que não recordo ou tenho receio de incluir por não ser nítida a minha memória. Autênticas heroínas que deram aos filhos o pão húmido do seu suor, mas saboroso e dado com o amor maior do mundo, o que só as mães sabem dar!
Aqueles que hoje me lêem, eventualmente, não terão noção da diferença dos métodos de fabrico se compararmos esse tempo com o actual. As fábricas não estavam mecanizadas e o ambiente no seu interior variava conforme o forno estivesse quente ou frio. Este pormenor influía no levedar das massas muito particularmente quando se usava o método de misturar a fruta picada logo depois de amassar. A fruta era misturada fria, o que ia interferir com o processo de levedação.
Anos depois, ainda eu estava no Poças, uma equipa de pasteleiros vindos de Lisboa e representando a Fábrica de Fermentos e Leveduras, além de outras coisas ensinou-nos a deixar levedar a massa suficientemente e só depois misturar a fruta picada e as nozes, amêndoas, uvas passas e pinhão. Este método em termos de levedação veio acabar com a dificuldade até ali sentida e por consequência facilitar uma tarefa que era nos dias frios de Dezembro uma obstrução à rapidez de fabrico.
Até ao final de 1980 mantivemos este sistema que depois passamos a usar só quando o frio era muito e se tornava mais fácil levedar sem fruta. É verdade de que a fruta fica distribuída mais uniformemente processando-a no final da amassadura e deixando a massa levedar já com ela incorporada.
Quando vim da tropa, passei a trabalhar no Poças e aí e tomando em conta as facilidades relativas em relação ao uso de máquinas era já um avanço em termos de mecanização assinalável, passando o espaço para produção a ser exíguo para a safra do Bolo-Rei.
E aqui o Zé Poças que, tenho-o afirmado repetidas vezes, era homem de acção e inteligente, após conversar com o Snr Toneco conseguiu que utilizássemos a Padaria da casa do Dr. Conceição que naquele tempo estava parada pois haviam construído a fábrica nova onde hoje está o edifício da Farmácia Atlântico na Avenida Abade de Baçal. (Seria interessante fazer um registo histórico deste sector da Padaria/Pastelaria na Cidade).
Entenda-se esta descrição assumindo que em todos os anos a produção aumentava e vou mais longe, melhorava em termos de qualidade e aspecto.
Não me alongarei na apreciação do progresso conseguido com todo o esforço e capitais apostados por alguns na busca de melhoria da Pastelaria em Bragança mas devo mencionar aqueles que lhes dedicaram tempo e dinheiro e foram responsáveis pelo entusiasmo de outros que se lhes seguiram, foram: Zacarias Ribeiro, Zé Poças e Álvaro Carvalho Vaz.
Ao começar esta crónica passaram na minha mente uma miríade de imagens desses tempos de labuta, descoberta e de encantamento pois tudo parecia novo e esperando apenas pela minha geração, para mudar e se tornar mais generoso para connosco que saímos das entranhas do povo e foi-nos, por algum tempo, concedido vermos a luz da fraternidade que se pressentia no ar e nos fazia vivos, alegres e trabalhadores.
E esse tempo de advento para os crentes que rejubilavam com a Boa nova dos céus e nós outros, com as do céu e as da terra. Passava o Natal e a vida continuava sem retrocessos ou Pandemias.

(Amanhã contarei mais, S D Q.)



Bragança 28/11/2020
A. O. dos Santos
(Bombadas)

Autarcas e empresários unidos na necessidade de assegurar cobertura nacional digital

 Hernâni Dias, Presidente da Câmara Municipal de Bragança, nota a necessidade de criar mais oportunidades de negócios e de trabalho no interior, “e para isso a alavanca do digital é essencial. É imperioso dotarmos o nosso país de uma boa cobertura em todo o território nacional e não apenas as localidades com maior densidade populacional. Eu não consigo fazer uma viagem de Bragança ao Porto, se for ao telemóvel, sem perder rede meia dúzia de vezes. Isto não é possível acontecer nos dias de hoje”, diz o autarca.
A cobertura nacional de ligações móveis é essencial para assegurar a coesão do território nacional e vencer o combate à desertificação do interior do país. Esta é uma das premissas repetida por autarcas e empresários esta quarta-feira, na última sessão do Smart Cities Tour, acolhida pelo município de Campo Maior e dedicada ao tema da Coesão Territorial.

O Smart Cities Tour, que se realizou pelo quinto ano consecutivo, é organizado pela Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e pelo NOVA Cidade – Urban Analytics Lab, da NOVA Information Management School (NOVA IMS). Uma iniciativa que junta autarcas, empresários, técnicos e membros da academia, na partilha de soluções para a criação de um território mais coeso, sustentável e inteligente.

O digital, aliado à necessidade de formação de profissionais qualificados no interior e de incentivos públicos à fixação de empresas e famílias nestes territórios, é um pilar fundamental para a criação de emprego nos municípios de baixa densidade populacional. “Quando falamos hoje dos grandes desafios da coesão territorial, a distância digital é tanto ou mais relevante que a distância física pois, conforme a pandemia bem demonstrou, a conectividade digital é vital para assegurar a inclusão e resiliência de todo o território nacional e fundamental para garantir igualdade de oportunidades de fixação de pessoas e de captação de investimento e criação de emprego em qualquer ponto do país”, nota Miguel de Castro Neto, Subdiretor da NOVA IMS e Coordenador do NOVA Cidade.

Assimetrias que a atual pandemia veio agravar. “Agravam-se ao nível dos instrumentos da Proteção Civil ou ao nível educativo quando falta a cobertura digital nos territórios de baixa densidade populacional para que os alunos possam ter aulas online”, destaca António Almeida Henriques, Presidente da Câmara Municipal de Viseu e Vice-Presidente da ANMP, para quem o atual momento é também uma oportunidade para encolher o tempo necessário para o salto tecnológico dos territórios e para alterar o paradigma de fixação das pessoas nestes territórios, desde logo, em consequência das oportunidades criadas pelo teletrabalho.

O responsável da ANMP traça a leitura do país em 2020: 70% da população residente está concentrada em 50km da faixa costeira; nos distritos do interior a densidade populacional baixou quase 11% nos últimos anos; e o poder de compra no interior, medido em índice base 100, atinge os 75% em contraponto com os 125% registados na Área Metropolitana de Lisboa. Assimetrias que se agravaram nos últimos 20 anos apesar do forte investimento proveniente de fundos europeus que, de acordo com António Almeida Henriques, somam 102 mil milhões de euros desde a adesão de Portugal à CEE. “É caso para perguntarmos como é que com tanto investimento, nomeadamente em infraestruturas, Portugal se tornou ainda mais assimétrico? Diria que talvez seja o próprio modelo de organização do país. Se calhar estamos a pagar hoje caro o facto de não termos feito a regionalização”, comenta o autarca.

Apesar das dificuldades, são vários os exemplos de casos de sucesso de territórios e autarquias que têm vencido os desafios da interioridade, como é o caso do Fundão, Viseu, Portalegre, Bragança ou Ponte de Sor, o concelho do País onde o número de empregados mais cresceu face há um ano. “Territórios onde, invariavelmente, encontramos, por um lado uma estratégia, e encontramos também a fixação de empresas”, nota Almeida Henriques.

O desenvolvimento dos territórios do interior está intimamente ligado à capacidade de atrair e fixar famílias e empresas, uma equação onde a cobertura digital tem um papel fundamental: “Foi tão importante, no pós-25 de abril, levar a eletricidade a todos os cantos do país, como é hoje levar a fibra ótica e a cobertura de redes móveis a todo o país. Hoje fala-se muito do 5G mas eu vou a muitos territórios do meu concelho e quem dera a estas pessoas terem acesso ao 3G. É necessário tornar o Portugal 100% Digital num desígnio nacional”, alerta o dirigente da ANMP.

“Investimento deve ser canalizado para o 5G”

Licínio Pina, Presidente do Grupo Crédito Agrícola, condidera que “se alguma coisa nos ensinou esta pandemia é que, de facto, é possível trabalhar para qualquer parte do mundo a partir de qualquer ponto do interior. Desde que para isso tenhamos, não uma autoestrada, mas sim uma ligação 4G. É com isso que se consegue criar descentralidade de trabalho e de oportunidades. O investimento público e privado no setor das telecomunicações é essencial”. O Grupo Crédito Agrícola dispõe hoje da maior rede bancária do país, nomeadamente em territórios de muito baixa densidade populacional, fruto da desmobilização de outras entidades bancárias. “No Crédito Agrícola temos vindo a manter as nossas agências, algumas com prejuízo. Mas temos noção que somos um banco privado com funções públicas.

 

Em algumas aldeias os nossos balcões são tão valorizados pela população quanto um posto médico”.

Para o responsável do grupo, “não há valorização do interior se não houver trabalho e para isso é necessário investimento. Esse investimento tem que ser, essencialmente, privado mas terá que ter sempre a âncora pública, criando condições para que os privados consigam investir no interior e criar trabalho. Para nós é essencial que o investimento ao nível das comunicações seja mais intensificado e distribuído por todo o interior”.

Também Hernâni Dias, Presidente da Câmara Municipal de Bragança, nota a necessidade de criar mais oportunidades de negócios e de trabalho no interior, “e para isso a alavanca do digital é essencial. É imperioso dotarmos o nosso país de uma boa cobertura em todo o território nacional e não apenas as localidades com maior densidade populacional. Eu não consigo fazer uma viagem de Bragança ao Porto, se for ao telemóvel, sem perder rede meia dúzia de vezes. Isto não é possível acontecer nos dias de hoje”, disse o autarca transmontano.

Apesar dos apelos de empresários e autarcas, Nuno Nunes, Chief Sales Officer da Altice Portugal, nota que “o investimento deve ser agora canalizado para o 5G” e alerta para o facto de o país estar a ficar atrasado em relação ao resto da Europa no que toca á implementação desta tecnologia. “O 5G urge mas não nas condições em que está a ser apresentado”, afirma o responsável da operadora que garante no entanto que a cobertura total por fibra ótica estará concluída em 2021, depois de um investimento de dois mil milhões de euros nos últimos quatro anos.

“Temos de fazer ainda um caminho no sentido de aumentar os benefícios fiscais”

Decisivos para atrair e fixar empresas e famílias no interior do país têm sido os benefícios fiscais. Isabel Ferreira, Secretária de Estado da Valorização do Interior, destaca os principais programas atualmente disponíveis. Com um pacote financeiro de 40 milhões de euros, o Programa Mais Coeso Conhecimento, tem apoiado a investigação científica, a contratação de recursos humanos altamente qualificados e a mobilidade de estudantes para o interior. De acordo com a responsável política, este ano foram atribuídas mais 18% de bolsas a alunos em instituições de ensino superior situados no interior, instituições que viram o seu número de alunos aumentar em 20% face ao ano letivo anterior. “São dinâmicas que é importante manter e, se possível, aumentar”, nota Isabel Ferreira.

Especialmente dirigidos às empresas, foram disponibilizados 250 milhões de euros, para apoiar a inovação e o empreendedorismo, aos quais se somam programas especificamente desenhados para apoiar o emprego e a proximidade nos territórios. A Secretária de Estado para a Valorização do Interior assume no entanto que “temos de fazer ainda um caminho no sentido de aumentar esses benefícios fiscais”. Para 2021, o Governo inscreveu na Proposta de Orçamento do Estado a possibilidade de dedução à coleta, em sede de IRC, de uma percentagem da despesa com a massa salarial em função dos postos de trabalho criados com conexão a territórios do interior.

Igualmente estruturante na fixação de jovens, profissionais e empresas no interior tem sido o papel dos Politécnicos. Pedro Dominguinhos, Presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos, cita um estudo da OCDE sobre a questão do desenvolvimento regional, que demonstra a existência de um elemento comum: “As regiões mais desenvolvidas são aquelas onde existe uma maior ligação entre as instituições de ensino superior e os diferentes atores do território, quer na produção de conhecimento quer na transferência e co-criação desse mesmo conhecimento. Portanto, este é um dado indesmentível que só beneficia se forem reforçadas essas mesmas relações entre os diferentes atores do território”, afirma o responsável.

O impacto dos Politécnicos nos territórios do interior é sentido ao nível da atração de talento e criação de massa crítica nos territórios, mas não só. De acordo com Pedro Dominguinhos, “em Bragança, o Politécnico representa 10% do PIB regional dos dois concelhos, em Portalegre representa cerca de 3%”. Números que resultam também dos vários projetos desenvolvidos em estreita ligação com as empresas, como é o caso do Programa 1.000 Ideias, cujo objetivo é juntar estudantes, professores e empresas, sobretudo PME, nos próximos 3 anos, para promover a inovação e desenvolver estratégias de co-criação de inovação nos territórios“.

O painel de encerramento do Smart Cities Tour contou ainda com as intervenções do Secretário de Estado do Planeamento, Ricardo Pinheiro, do Vice Presidente da Visabeira, José Luís Nogueira, e dos parceiros do Smart Cities Tour, CTT e EDP Distribuição.

O Tour passou este ano por seis cidades portuguesas para discutir os temas da Cidade Circular (Valongo), Mobilidade Inteligente (Covilhã), Turismo Inteligente (Monchique), Inovação Inteligente (Oeiras) e Redes Inteligentes (Évora).

Homem resgatado sem vida do rio Tua perto de Valverde da Gestosa (Mirandela)

 O corpo de um homem de 32 anos foi resgatado das águas do rio Tua, já sem vida, esta madrugada, próximo da aldeia de Valverde da Gestosa, em Mirandela, depois de várias horas de buscas das autoridades após ter sido dado o alerta de que algo lhe teria acontecido quando estava a pescar.
Ainda são desconhecidos os contornos da morte, estando a PJ está a investigar o caso, mas ganha força a hipótese de crime. Ao que apurámos, terá sido atingido na zona da cabeça com um tiro disparado por uma arma de grande porte, provavelmente uma caçadeira. Sabe-se que no local onde se encontrava a pescar, conhecido como a zona da "fraga velha", a mais de dois quilómetros da aldeia, havia "vestígios de sangue espalhado no chão, uma cana de pesca e uma mochila, pertencente ao homem", segundo fonte da GNR.

Passavam quinze minutos da meia-noite, quando uma equipa de mergulhadores dos Bombeiros Voluntários de Mirandela resgatou o corpo do homem das águas do rio Tua, na aldeia de Valverde da Gestosa, no concelho de Mirandela, próximo do local onde esteve à pesca, durante a tarde de domingo.

A tese de homicídio também está em aberto, pelo que a Polícia Judiciária já está a proceder à investigação.

Cerca das 19.20 horas, foi dado o alerta para o desaparecimento do homem. Para o local foram acionados 14 operacionais dos Bombeiros Voluntários de Mirandela, com o apoio de seis viaturas e ainda seis militares da GNR. Ainda chegaram a efetuar buscas nas margens do rio, durante cerca de duas horas, até perto das 22.30 horas, mas a chuva que se fazia sentir e a fraca visibilidade acabaram por ditar a suspensão das buscas.

Entretanto, uma equipa da GNR de Mirandela permaneceu no local para preservar os elementos de prova e, poucos minutos depois da suspensão das buscas, acabou por visualizar na água o que parecia ser uma peça de roupa. A equipa de mergulhadores dos bombeiros procedeu então ao resgate do corpo do agricultor de 32 anos, residente em Valverde da Gestosa.

O cadáver foi transportado para a morgue do hospital de Mirandela, onde será sujeito a autópsia, cujo resultado será fundamental para a investigação da PJ.

Escrito por Terra Quente (CIR)

Alfândega da Fé recebe Centro de Atendimento Consular para o Luxemburgo e Bélgica

 Alfândega da Fé tem já a funcionar um Centro de Atendimento Consular para o Luxemburgo e a Bélgica. Através deste serviço será assegurado atendimento através de telefone e email a utentes que necessitem de contactar e obter informações do consolado geral de Portugal no Luxemburgo e na Bélgica.
A secretária de Estado das comunidades portuguesas, Berta Nunes, explica que este centro foi instalado em Alfândega, com o objectivo de valorizar o interior do país e tendo em vista um processo de descentralização administrativa.

“Foi decidido que estarão sediados em Portugal, os primeiros, para o Reino Unido e Espanha, ficaram em Lisboa. A decisão que tomámos foi depois descentralizar. A câmara de Alfândega da Fé disponibilizou-se para fazer um investimento para criar um espaço que fosse adaptado a um Centro de Atendimento Consular. Assim conseguimos os dois objectivos, descentralizar estes centros, o que iremos continuar a fazer, porque acreditamos que é importante dar oportunidades às pessoas para se fixarem no interior e estes CAC estão a criar postos de trabalho”, destacou.

As linhas do CAC para o Luxemburgo e para a Bélgica são operadas em Alfândega da Fé por oito trabalhadores, que prestam atendimento nas línguas portuguesa e francesa, para agilizar o atendimento aos utentes da rede consular portuguesa:

“Vai dar apoio ao consulado e à comunidade portuguesa no Luxemburgo e também à Bélgica, que já começou a funcionar há algumas semanas. Fazem parte de um projecto que é o novo modelo de gestão consular que pretende melhorar o atendimento dos nossos consulados nomeadamente o atendimento de front-office, telefónico e por e-mail para pedidos de informações ou de agendamento. Há queixas de o atendimento por esta via e o objectivo é dar apoio aos consulados e melhorar o atendimento às nossas comunidades”, explicou a também ex-presidente da câmara de Alfândega.

Além da Bélgica e do Luxemburgo, o centro consular na vila transmontana deverá passar a prestar atendimento aos utentes de países de língua francesa com comunidades portuguesas, já que ali se vai concentrar o atendimento de front-office em francês, o que fará aumentar os postos de trabalho. O próximo deverá ser o de França.

A actual estrutura dos centros de atendimento consular de apoio a cinco países serve 640 mil cidadãos nacionais, cerca de 150 mil dos quais no Luxemburgo. Está a ser desenvolvida a sua extensão a França, Itália e Países Baixos, prevista para 2021. Concluída esta extensão, o CAC servirá mais de um milhão de cidadãos nacionais no estrangeiro. 

Escrito por Brigantia

domingo, 29 de novembro de 2020

“Enfardar Naturalmente – Transição para uma Agricultura Ecológica".

 A concepção de qualquer ideia nasce de um sonho, e os sonhos tendem a ser idílicos e talvez utópicos. É com a convicção genuína de que todos temos um papel fundamental na preservação do nosso Planeta, que hoje apresentamos o primeiro cartaz do projeto “Enfardar Naturalmente – Transição para uma Agricultura Ecológica".
Temos a consciência plena de que são as pequenas escolhas que fazemos no dia-a-dia que consolidam as mudanças que queremos ver no mundo. E, nesse sentido, queremos inspirar os agricultores do nosso país a mudar o mundo, um passinho de cada vez.
Junte-se a nós na adoção do fio de Sisal, 100% natural e biodegradável, na prática agrícola. Substitua o fio de polipropileno, normalmente de cor azul, pelo fio de sisal e acelere desde já a transição para uma agricultura mais sustentável.
"Enfardar Naturalmente – Transição para uma Agricultura Ecológica" é um projeto apoiado pelo Fundo Ambiental, no âmbito da Estratégia Nacional de Educação Ambiental 2020 – Produção e Consumo Sustentáveis.
Nos próximos dias vamos dar-lhe a conhecer um pouco mais sobre este projeto. Para já, convidamo-lo a visitar ESTE SITE.

Expiação

Por: Manuel Amaro Mendonça
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

A extensa nave da igreja encontrava-se em semipenumbra. Apenas a luz do luar se coava preguiçosamente através da claraboia setecentista, muitos metros acima. Todo o espaço estava repleto de sombras e as imagens dos santos e mártires, imobilizadas no seu mutismo eterno, eram testemunhas e guardiões do silêncio.

O padre Ramiro, rondando os sessenta anos, assomou à porta que conduzia à sacristia, antes de se mostrar completamente. Envergava um pijama e roupão e calçava uma chinelas de tecido, surradas. Estava já deitado e dormia a sono solto, quando uma urgência, que não sabia bem explicar, o fez levantar-se, deixar a cama e vir até à igreja.
Na segunda fila de assentos, divisou o vulto ajoelhado, rosto escondido entre mãos implorantes. O silêncio intimidante, impunha-se pesadamente.
Após um minuto de hesitação, o sacerdote soprou uma pequena coluna de vapor e apertou mais o roupão, para se defender do ar gelado que repousava no templo. Arrastou as chinelas até junto do vulto e, com um profundo suspiro, ajoelhou a seu lado, imitando a pose implorante, frente ao altar.
O estranho levantou a cabeça ao perceber o recém-chegado. Aparentava uns trinta anos e tinha o cabelo comprido e desgrenhado e a barba negra e crescida, quase tapando o rosto pálido e macilento, onde brilhavam dois olhos pequenos, cor de carvão.
— Também tem pecados a expiar, padre? — Grasnou o homem, ecoando na nave.
Surpreendido, o sacerdote fitou o inusitado companheiro.
— Todos somos pecadores, meu filho. — Esclareceu-o ele. — Todos cometemos pecados, uns mais graves que outros. O importante, é a forma como lidamos com eles. — O estranho olhou-o pensativamente, avaliando-o e sopesando as suas palavras, enquanto o padre continuava. — Temos de reconhecer que erramos e devemos pedir perdão a Deus por eles. Teremos de prometer que tudo faremos para não voltar a pecar.
— E se o pecado não tiver perdão? — O outro insistiu.
— Todos os pecados têm perdão! — O sacerdote foi perentório. — Há pecados mortais, é certo, mas a misericórdia de Deus é infinita e até o mais vil dos pecadores, terá uma oportunidade, se se arrepender do fundo do coração.
— O meu pecado não pode nunca ser perdoado. — O homem fez um esgar amargo.
— Já disse, Filipe, que Deus pode perdoar todos os pecados. — O padre Ramiro reafirmou.
— Como sabe o meu nome? — O estranho estremeceu, muito sério.
— Conheço-te há muitos anos… — Uma lágrima refulgiu nos olhos do sacerdote. — Não me reconheces mesmo?
O chamado Filipe pareceu incomodado com a pergunta e levantou-se, dando uma volta sobre si mesmo, hesitante. Passou a mão pelo cabelo e cofiou a barba fitando o interlocutor com intensidade. Por uns segundos, um pesado manto de silêncio pesou entre os dois; um, em pé, recurvado e o outro de joelhos no suporte do banco da igreja.
— Devia reconhecê-lo? — A voz do estranho tremia, como que acometido do frio, que há muito mordia o padre.
— Não só a mim, como todo este templo, onde estiveste tantas vezes… — Acusou o ministro da igreja.
— Sim, venho aqui de vez em quando… pedir perdão pelos meus pecados… — Filipe arrastava a voz, puxando pela memória.
— E sabes quais foram os teus pecados? — Ramiro sentou-se, observando-o. — Recordas o que tanto precisas que te seja perdoado, que te não deixa descansar e te traz aqui amiúde? Tiveste sequer a noção de quantas vezes me ajoelhei, como hoje, ao teu lado a rezar? Em todas essas vezes nunca me falaste, porém, talvez não estivesses preparado.
O estranho parecia cada vez mais perturbado e acenava negativamente com a cabeça enquanto balbuciava: “Não me lembro…”
— Há quase quarenta anos, entraste nesta igreja com uma mulher sem vida nos braços. — Lembrou o sacerdote. — A mulher que nós amávamos!
— Armanda! — Filipe apertou as mãos contra a boca, o rosto retorcido numa máscara de dor. — Fui eu! Oh, meu amor, fui eu quem a matou! — Depois, num súbito reconhecimento, fitou padre nos olhos. — Ramiro? És tu, Ramiro? Estás tão velho!
— Passaram-se muitos anos, querido irmão. — As lágrimas assomaram com força aos olhos do ancião.
— Perdoa-me, meu irmão! — Implorou o outro atirando-se ao chão, quase junto aos pés do sacerdote.
— Eu é que te peço perdão, por ter permitido que ela se aproximasse de mim, depois de estar casada contigo. Peço perdão a Deus todos os dias, por ser o causador de toda desgraça que nos atingiu. — O padre enclavinhou as mãos numa oração. — Amaldiçoo-me eternamente por me ter deixado possuir por aqueles belos olhos, durante as férias do seminário em tua casa.
— Eu não podia suportar! — Gemeu Filipe, caminhando até ao meio da igreja, no espaço entre os bancos e ajoelhando no tabuado, em pranto. — Foi aqui que a deitei, depois de a ter estrangulado no carro! Eu não queria matá-la, mas não podia suportar que a mulher que eu mais amava no mundo me trocasse por outro homem… ainda que fosse o meu próprio irmão!
Com visível esforço, Ramiro aproximou-se e ajoelhou no chão, junto do outro, os olhos cheios de lágrimas: “Perdoa-me!”, gemeu.
Os dois, ajoelhados no soalho, não passavam de sombras na vastidão da nave do templo.
— Achas que Deus me perdoa? — Ao fim de uns segundos, Filipe estendeu as mãos para o padre. — Achas que ela me pode alguma vez perdoar? E tu, meu irmão, perdoas-me?
— Alguma vez Lhe deste essa possibilidade? A qualquer um de nós? — O sacerdote rouquejou. — A tua solução foi atirares-te ao rio e desaparecer para sempre. O teu espírito vagueou sempre por aqui, incapaz de assumir o mal que fizeste, escondido do julgamento, assim como de qualquer forma de perdão.
Aparentando agora ter mais quarenta anos às costas, Filipe ergueu-se a custo, com os olhos rasos de lágrimas fitos no chão onde em tempos repousou a mulher ambos amaram. Soluçou audivelmente e pousou a mão direita sobre o coração.
Ramiro chorava com ele, mas engoliu em seco e o seu rosto tornou-se uma máscara cheia de majestade e levantou-se apoiando-se nas costas do banco mais próximo. Ergueu os dedos indicador e médio da mão direita, numa autoridade que o seu cargo lhe permitia, enquanto sentenciava “Ego te absolvo, in nomine Patris, et Filii, et Spiritus Sancti. Amen”.
Filipe, atordoado, cambaleou na direção da porta que levava ao exterior da igreja e que abriu de par em par. Uma onda de luz imensa ofuscou todo o espaço, rebrilhando no ouro dos altares, iluminando os rostos tristes das imagens neles contidas, ressaltando nos cristais dos candelabros e nos vitrais das janelas, como uma onda de esperança que Ramiro, tombando de joelhos no meio do templo, recebeu de braços abertos.
Foi de manhã bem cedo, que a equipa de limpeza encontrou o velho abade da freguesia, tombado no soalho frente ao altar. Aparentemente, sofrera um ataque fulminante que lhe levara a vida, antes mesmo de se aperceber do que estava a acontecer, pois o seu rosto exibia um sorriso, sinal de que partira em paz.

Manuel Amaro Mendonça
nasceu em Janeiro de 1965, na cidade de São Mamede de Infesta, concelho de Matosinhos, a "Terra de Horizonte e Mar".
É autor dos livros "Terras de Xisto e Outras Histórias" (Agosto 2015), "Lágrimas no Rio" (Abril 2016) e "Daqueles Além Marão" (Abril 2017), todos editados pela CreateSpace e distribuídos pela Amazon.
Ganhou um 1º e um 3º prémio em dois concursos de escrita e os seus textos já foram seleccionados para mais de uma dezena de antologias de contos, de diversas editoras.
Outros trabalhos estão em projeto e saírão em breve, mantenha-se atento às novidades AQUI.

Incêndio destrói habitação e deixa sexagenário sem teto em Viduedo/Bragança

 Fogo destruiu na íntegra a casa e o único morador, um homem com cerca de 60 anos que não se encontrava em casa na altura do acidente.
Um incêndio destruiu totalmente uma habitação e provocou um desalojado, na noite deste sábado, na aldeia de Viduedo, em Bragança.

Segundo Paulo Ferro, Adjunto dos Bombeiros Voluntários de Bragança, "quando os operacionais chegaram ao local, a habitação já estava totalmente tomada pelas chamas. Ainda conseguimos controlar o fogo que se dirigia para um anexo da residência unifamiliar". 

O incêndio destruiu na íntegra a casa e o único morador, um homem com cerca de 60 anos que não se encontrava em casa na altura do acidente, ficou desalojado mas passou a noite com familiares, mas a Proteção Civil Municipal brigantina e a Segurança Social estão encarregues da situação. 

O alerta para o incêndio foi dado por vizinhos por volta das 19h53 e no local estiveram os bombeiros e militares da GNR de Bragança que investigam as causas do fogo.

Patrícia Moura Pinto

Presidente da CCDR-N é o primeiro orador da Agenda Estratégica Mirandela 2030

 Esta visita do Presidente da CCDR-N está inserida no âmbito da Agenda Estratégica Mirandela 2030, que culminará num Fórum Digital com o tema "O Desafio da Inovação - Um futuro para o interior norte", a realizar no Salão Nobre do Paço dos Távoras, pelas 18:30h do mesmo dia, com transmissão em direto na rede social do Facebook do Município de Mirandela.
A Câmara Municipal de Mirandela encontra-se a desenvolver um documento estratégico, denominado de Agenda Estratégica Mirandela 2030, “com vista a construir um melhor território para se viver, trabalhar, estudar e visitar“, anunciou o município.

António Cunha, Presidente Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), realizará no dia 2 de dezembro uma visita, com início às 16:30h, ao Complexo Agro Industrial do Cachão e às obras cofinanciadas do Programa Norte 2020, nomeadamente à Estação de Caminho de Ferro e à Estação de Camionagem de Mirandela.

Esta visita, inserida no âmbito da Agenda Estratégica Mirandela 2030, culminará num Fórum Digital com o tema “O Desafio da Inovação – Um futuro para o interior norte“, a realizar no Salão Nobre do Paço dos Távoras, pelas 18:30h do mesmo dia, com transmissão em direto AQUI  e onde o presidente em exercício na CCDR-N, António Cunha, fará uma intervenção no primeiro painel da Agenda Estratégica Mirandela 2030.

A par da realização de fóruns, que contam com a presença de especialistas em diversas áreas, a autarquia tem agendadas reuniões temáticas na área da cultura, educação, desporto, agricultura, economia, desenvolvimento económico, entre outras.

O Município optou também por integrar os munícipes na elaboração deste documento através de um questionário físico e online disponível AQUI.

A criação desta Agenda congrega um conjunto de orientações da União Europeia destinadas a todos países e territórios para que sejam definidas as estratégias locais, nacionais e europeias de atuação, com o intuito de criar um verdadeiro projeto de desenvolvimento sustentável europeu convergente com as realidades dos vários países e regiões.

sábado, 28 de novembro de 2020

Porque há árvores com folhas no Outono e Inverno?

 Rosa Pinho, curadora do Herbário (Departamento de Biologia da Universidade de Aveiro), explica as razões para que estas árvores não sejam já dominantes nos bosques portugueses.


Estamos naquela altura do ano em que as folhas rodopiam no ar, em tons dourados, castanhos ou avermelhados. Os ramos vão ficando despidos e as folhas acumulam-se debaixo dos nossos pés.

Choupos (Populus canescens). Foto: Paula Corte-Real

“A queda das folhas no outono é uma estratégia das plantas para se protegerem do frio, reduzindo ao máximo o seu gasto de energia”, explica Rosa Pinho. “Com menos luz solar, a primeira alteração é parar de produzir clorofila. Com a diminuição da clorofila, outros pigmentos já existentes tornam-se visíveis e as folhas ficam amareladas ou avermelhadas, acabando por cair.”

Mas nem todas as árvores perdem as suas folhas nesta estação do ano. Por exemplo, três quartos das árvores no Jardim Gulbenkian mantêm as suas folhas, como por exemplo, o sobreiro e a azinheira, o loureiro, o medronheiro, o azevinho e ainda o buxo, o azereiro e o pinheiro-manso, para falar apenas de algumas. Segundo Rosa Pinho, a explicação para que haja árvores que conservam sempre as suas folhas está na genética de cada espécie. “Essas árvores crescem o ano inteiro, ainda que no inverno esse crescimento seja muito lento.” 

Azinheira (Quercus ilex). Foto: Paula Corte-Real
Azevinho (Alex aquifolium). Foto: Paula Corte-Real
Pinheiro-manso (Pinus pinea). Foto: Paula Corte-Real

E não é pelo facto de ter folhas caducas ou persistentes que uma planta é mais ou menos resistente. “Por exemplo, em condições ótimas, um azevinho (folha persistente) pode atingir os 300 anos e o carvalho-alvarinho (folha caduca) pode atingir os 1500 anos”, sublinha a investigadora. No entanto, as folhas podem ter características diferentes. “As dos carvalhos caducifólios são mais finas e maiores, como é o caso do carvalho-alvarinho, do que as folhas dos carvalhos de folha persistente, que são mais coriáceas, como é o caso do sobreiro e da azinheira, devido ao desenvolvimento do esclerênquima que, neste caso, assegura a proteção destas espécies em condições de temperaturas elevadas no verão.” 

Carvalho-alvarinho (Quercus faginea). Foto: Paula Corte-Real

Já o tempo de vida das folhas nas árvores de folha persistente é muito variável. “Varia com as espécies e dentro da própria espécie. Por exemplo, nos pinheiros as agulhas adultas podem durar de 18 meses a 40 anos, dependendo das espécies.” 

Da Laurissilva ao eucalipto  
Em Portugal, a maioria das árvores nos bosques autóctones das regiões norte e centro litoral são de folha caduca, devido à influência Atlântica. No sul do país, onde há uma forte influência mediterrânica, predominam as espécies de folha persistente. Mas nem sempre foi assim. “Antes da última glaciação, que ocorreu no Quaternário, a floresta que existia em Portugal era designada de sempre-verde, isto é, árvores com folhas persistentes onde dominava a Família Lauraceae (Família do loureiro – Laurus nobilis), daí o nome da Floresta: Laurissilva”, explica Rosa Pinho.  

Nessa altura, o clima do nosso país era subtropical húmido; mas com os gelos glaciares, a maioria das espécies da Laurissilva desapareceu no continente. Hoje, restam apenas algumas relíquias, como o loureiro, o medronheiro, o folhado e o azereiro. “Nas ilhas (Madeira e Açores) a Laurissilva resistiu porque a água que as circunda é um termo-regulador e o frio glaciar não se fez sentir da mesma forma.”

Loureiro (Laurus nobilis). Foto: Paula Corte-Real
Azereiro (Prunus lusitanica). Foto: Paula Corte-Real

“Ao longo do tempo, o clima passou a temperado e a floresta que passou a dominar foi a Fagosilva – floresta das Fagaceae (Família dos carvalhos – Quercus). O clima ficou mais frio e muitas das espécies que se tornaram dominantes estavam adaptadas devido à estratégia de caducidade das suas folhas.” Isto explica a distribuição das árvores de folha persistente e caduca por Portugal. 

Rosa Pinho explica ainda que “A sul, onde o clima é mais quente, temos os carvalhos de folha persistente, como é o caso da azinheira (Quercus rotundifolia) e do sobreiro (Quercus suber) e a norte temos os carvalhos de folha caduca como é o caso do carvalho-alvarinho (Quercus robur).” Hoje, a floresta já não é sempre-verde mas mista, com espécies de folha caduca e espécies de folha persistente, grande parte delas relíquias da Laurissilva.  

Ao contrário das florestas húmidas tropicais, que não têm uma estação seca pronunciada e onde a temperatura não é um factor limitante, as florestas temperadas caducas ocorrem em regiões com as quatro estações bem marcadas. “Este tipo de floresta tem, na generalidade, um hábito caduco (implica uma fraca atividade metabólica), decorrendo da baixa disponibilidade hídrica durante o inverno, isto porque a temperatura do solo se encontra abaixo do ponto de congelação”, acrescenta Rosa Pinho.  

No Hemisfério Norte, estas florestas ocorrem em toda a Europa, “sob a forma de fragmentos dispersos, porque a ação humana as transformou em campos e prados”. Em Portugal, o que resta da Fagosilva são bosques de folhosas fragmentados. A floresta atual deriva, na maior parte dos casos, de florestação com monoculturas com uma função económica, relacionada com a produção de bens para a indústria. Os três sistemas florestais dominantes são o montado de sobro e azinho, o pinhal e o eucaliptal.  

A área ocupada por espécies exóticas invasoras também tem vindo a aumentar, nomeadamente com espécies do género Acacia, potenciadas pelo abandono dos terrenos e pelos incêndios.

O que procurar no Outono: o alecrim

 Numa das minhas pesquisas recentes sobre uma espécie muito comum e que se encontra atualmente em flor nas nossas florestas e jardins, fui surpreendida com uma nova classificação científica.

Foto: Carsten Niehaus/WikiCommons

O Alecrim, classificado anteriormente como Rosmarinus officinalis, é afinal um parente próximo das Sálvias e o seu nome científico atual é Salvia rosmarinus.

Esta nova classificação ocorreu devido aos resultados obtidos por um grupo de investigadores que, ao analisarem e ao compararem as sequências genéticas de ADN do género Rosmarinus com as do género Salvia, verificaram muitas semelhanças entre os dois géneros que não justificavam a separação.

Na classificação atual das espécies, o nome científico de uma determinada planta é composto por duas partes: o seu género e o restritivo específico. O género agrupa de uma forma clara os indivíduos que apresentam um conjunto de características morfológicas, funcionais e genéticas bem definidas e semelhantes. O restritivo específico é que permite classificar a espécie dentro do género. Este último deve acompanhar sempre o nome do género, pois isolado não tem qualquer significado. 

O alecrim
O alecrim já pertencia à mesma família das Sálvias, Lamiaceae, no entanto, a diferença que existia entre os estames das flores das duas plantas, fazia com que estivesse num género diferente. A evolução dos conhecimentos científicos permitiu comprovar que essa diferença não era o suficiente para as considerar plantas distintas, levando a classificá-lo como uma espécie do género Salvia. 

É uma planta arbustiva perene, muito ramificada e lenhosa, que pode atingir até 2 metros de altura. De folhagem persistente, as folhas são pequenas, finas, coriáceas e são verde-escuro e brilhante na página superior e verde-acinzentada na página inferior. As flores agrupam-se em espigas terminais e apresentam cor azulada, por vezes rosada ou branca. A floração ocorre ao longo de todo o ano, sendo mais intensa entre dezembro e maio.

Foto: KENPEI/WikiCommons

Toda a planta é aromática, exala um aroma balsâmico canforado, fresco, herbáceo e doce. E é devido a esta característica aromática e à cor das suas flores, que esta planta que crescia junto das praias do litoral, que os romanos a denominavam como rosmarinus, que em latim significa “orvalho do mar”. A cor azulada das suas flores e o agradável aroma fresco que a planta libertava estavam associadas ao orvalho que se formava junto do litoral.

Alecrim do monte
O alecrim é uma planta nativa da região mediterrânica e pode encontrar-se por todo o país, preferencialmente em zonas de matos, pinhais, azinhais e terrenos incultos. Cresce bem em solos secos e pobres, bem drenados e permeáveis, preferencialmente em terrenos calcários. Prefere locais com uma exposição solar plena, é tolerante ao frio do inverno, ao vento e às geadas. É bastante resistente a períodos prolongados de seca no verão.

Quem não se recorda da música tradicional portuguesa: “Alecrim, alecrim doirado que nasce no monte sem ser semeado…”, homenagem ao alecrim, pela sua resistência e capacidade de adaptação.

Curiosidades e utilizações
Com elevado interesse ornamental, o alecrim é muito comum em jardins mediterrânicos. É um tipo de arbusto de fácil cultivo, com grande tolerância à seca e muito resistente a pragas e doenças, não necessitando de cuidados frequentes.

Foto: Stickpen/WikiCommons

É uma planta aromática com múltiplas aplicações que passam pela culinária, medicina, aromaterapia, fitoterapia, cosmética, etc. As suas flores são ricas em pólen e néctar, o que a torna uma planta melífera muito procurada e apreciada pelas abelhas, que produzem um mel de elevada qualidade.

Os nomes comuns das plantas levam muitas vezes a algumas confusões. Os ingleses conhecem o alecrim como Rosemary. Em Portugal também é vulgarmente conhecido como rosmaninho e é muitas vezes confundido com outras espécies, nomeadamente o rosmaninho (Lavandula stoechas), que é um termo usado em algumas regiões do país para denominar a alfazema. No entanto, estas duas espécies são morfologicamente bem diferentes, em particular na forma e na coloração e inserção das flores.

A diversidade biológica impõe a necessidade de alguma organização para que se possam conhecer as diferentes espécies de plantas, animais, fungos, etc. Dentro de cada um destes grupos a organização torna-se ainda mais particular e específica. É necessário encontrar semelhanças genéticas, morfológicas, funcionais, entre outras, que permitam agrupar os indivíduos com características pelas quais se assemelham entre si, em pequenos grupos até à espécie, o que irá permitir distingui-los das restantes espécies. A espécie agrupa indivíduos muito semelhantes, capazes de se cruzarem entre si, de se reproduzirem e de gerarem descendência fértil. 

Lembrem-se, da próxima vez que se cruzarem com um alecrim, que o nome comum da planta permaneceu inalterado, mas que estão perante uma Salvia rosmarinus em vez de um Rosmarinus officinalis.

Censo de Inverno contou quase 20.000 cegonhas que ficaram em Portugal

 O último censo de cegonhas-brancas, realizado em Outubro, revelou que o número de invernantes continua a aumentar e que estas aves estão a ocupar novas áreas do país. A Wilder falou com Inês Catry, coordenadora do projecto “Birds on the Move”.


Não há dúvidas de que o número de cegonhas-brancas residentes em Portugal, que permanecem no país o ano todo, está a crescer. Basta olhar para os dados dos últimos censos de Inverno: em 1995 havia cerca de 1000 cegonhas nessa situação, em 2006 cerca de 8.000 e em 2015 foram contadas 14.434 cegonhas. Este ano, na primeira semana de Outubro, já eram 19.295.

“Há apenas umas décadas, todas ou quase todas as cegonhas migravam para África para passar o Inverno em locais mais quentes e com maior disponibilidade de alimento. Mas esse comportamento está a mudar e cada vez mais cegonhas decidem não migrar”, nota Inês Catry, coordenadora do projecto Birds on the Move, no âmbito do qual se realizou o censo de 2020.

No entanto, para a equipa confirmar se o peso de cegonhas residentes face à população total continua a subir, independentemente do crescimento do número de aves, faltava comparar os resultados agora obtidos com outros números. Calcular essa percentagem é possível “se soubermos o número total da população, dada pelos censos de Primavera, e o número de cegonhas que ficam cá e não migram”, explica a investigadora do CIBIO/InBIO, na Universidade de Lisboa.

Os censos de Primavera são censos internacionais, coordenados em Portugal pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, e realizam-se de 10 em 10 anos. O mais recente foi em 2014.

Cegonhas-brancas no Alvito, Alentejo. Foto: Inês Catry

Em 2015, foi pela comparação entre censos de Primavera e de Inverno que os investigadores perceberam que o peso de cegonhas residentes estava a aumentar: “A proporção de residentes em 1994/1995 era 18%, tendo subido para 51,6% em 2004/2006 e para 61,7% em 2014/2015”, descreve Inês Catry.

E apesar de não se contarem os casais reprodutores desde 2014, pelo que não é possível repetir agora essa avaliação, é “muito provável” que a tendência se mantenha. Pelo menos a avaliar pelas cegonhas que a equipa segue por GPS, no âmbito do “Birds on the move”.

Uma das cegonhas do projecto, com emissor GPS. Foto: Carlos Pacheco

Entre as cerca de 60 cegonhas adultas marcadas nos últimos dois anos, “77% são residentes e apenas 23% passam o estreito de Gibraltar.” Algumas ficam em Marrocos, mas outras “continuam até ao Sahel, passando o Inverno na Mauritânia, Mali, Senegal, ou até mesmo no Niger e Nigéria”, indica a bióloga, que adianta que algumas cegonhas passam o Inverno, ou parte dele, no sul de Espanha. 

Por onde andam as cegonhas?

Os censos ajudam também a saber onde ficam estas cegonhas no Inverno: cerca de metade residem nos arrozais do Tejo, Sorraia e Sado; segue-se o Barlavento algarvio, incluindo o aterro sanitário situado no concelho de Portimão. “Para se ter uma ideia da importância dos aterros, no aterro de Ermidas do Sado e no do Barlavento foram contadas cerca de 2000 cegonhas – em cada um! – em 2020”, sublinha a investigadora.

A importância dos aterros já tinha sido notada pela equipa em 2015, quando concluíram que as cegonhas-brancas em Portugal estão a render-se ao fast food.

Por outro lado, acrescenta Inês Catry, não só a população de cegonhas continua a aumentar como “também a área de distribuição se está a alargar para o interior e norte do país” – tal como mostram os mapas elaborados no âmbito do projecto:

Porquê no Outono

Cerca de 30 pessoas foram para o terreno neste último censo de Inverno, concentrado em cinco dias para evitar a duplicação de contagens. Aos voluntários e técnicos do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas e de outras instituições, juntaram-se outras 10 pessoas que enviaram observações pelas redes sociais e por mail.

As contagens fizeram-se por todo o país, com visitas aos locais onde se sabe que há mais cegonhas fora da época de reprodução, nas zonas de Viana do Castelo, Vila Real, Fundão, Aveiro, Baixo Mondego, Vieira de Leiria, Tejo e Sorraia, Sado, Santo André e Algarve. No Alentejo, os aterros sanitários de Beja, Évora e Ermidas são pontos de concentração importantes.

Cegonhas num aterro sanitário. Foto: Inês Catry

Mas porque decidiram realizar um censo de Inverno ainda no Outono? É que “nesta altura já todos os adultos e juvenis que migram para África abandonaram o país, e por isso sabemos que só estamos a contar aves que não migram”, nota Inês Catry. Por outro lado, não chegaram ainda muitas cegonhas invernantes do Norte da Europa, “pelo que estamos a contar as cegonhas portuguesas.”

A seguir estas aves desde 2012

O projecto “Birds on the Move” – que significa “Aves em Movimento” – é coordenado pelo CIBIO/InBIO, tem como parceiros a Universidade de East Anglia e a British Trust of Ornithology, do Reino Unido, e ainda a universidade espanhola de Castilla-La Mancha. Começou em 2018 e para já tem financiamento previsto até 2021.

Mas já há quase uma década, em 2012, Inês Catry e uma colega portuguesa, professora na Universidade de East Anglia, tinham iniciado “um pequeno projecto de marcação de cegonhas-brancas com aparelhos GPS, para seguir os seus movimentos ao longo do ciclo anual”.

Ao longo do tempo cresceram as parcerias e também a equipa, que hoje inclui “inúmeros investigadores, bolseiros, pós-docs e alunos de mestrado e doutoramento”. Foram também obtendo diferentes apoios, que lhes permitiram desenvolver a investigação.

No âmbito do “Birds on the Move”, o principal foco são as “questões relacionadas com as mudanças no comportamento migratório das cegonhas e tentar perceber quais as vantagens e desvantagens de migrar”, descreve Inês Catry, coordenadora.

Nesse contexto, os aterros têm sido um dos grandes pontos de atenção para o projecto, por serem “um dos factores mais importantes, senão o mais importante para as mudanças de comportamento observadas”, pois têm “alimento disponível todo o ano”. Os investigadores querem também perceber se o número de cegonhas residentes continua a aumentar – motivo para a realização do censo de Inverno.

O projecto inclui ainda uma componente de estudos genéticos, “em que tentamos perceber se há uma base genética que explique estas mudanças no comportamento migratório.” Outra parte é dedicada aos riscos de comer nos aterros – quer para a saúde das cegonhas quer dos humanos – e o papel destas aves como vectores de transmissão de doenças. 

Ferido grave depois de cair do telhado de um armazém

 Um homem, de 43 anos, sofreu ferimentos graves depois de ter caído de um telhado de um armazém em Freixo de Espada à Cinta.
Segundo o comandante dos bombeiros de Freixo de Espada à Cinta, Victor Rentes, quando chegaram ao local o homem "estava politraumatizado, foi considerado um ferido grave e teve de ser transportado de helicóptero para o hospital de Bragança”.

O acidente aconteceu às 11h51, tendo sido mobilizados para o local 10 operacionais, apoiados por três viaturas, entre os quais os bombeiros de Freixo de Espada à Cinta, uma ambulância de Suporte Imediato de Vida (SIV) de Mogadouro e o helicóptero do IMEM estacionado em Macedo de Cavaleiros.

A GNR também foi chamada ao local e está a investigar as causas desta queda.

Câmara de Macedo reforça em 60 mil euros a comparticipação para as freguesias

 O critério adotado na distribuição da verba assenta na dimensão e população recenseada de cada freguesia. No total, a autarquia terá de transferir 60 mil euros, que variam entre os 877,48 euros para a freguesia de Carrapatas e os 4181,13 euros para Morais ou os 4072,63 euros para a União de Freguesias de Espadanedo, Edroso, Murçós e Soutelo Mourisco.
O Município de Macedo de Cavaleiros vai transferir 60 mil euros para as freguesias do concelho a título de comparticipação face à transferência de competências da Câmara Municipal. O critério adotado na distribuição da verba assenta na dimensão e população recenseada de cada freguesia, tendo como referência os últimos censos.

“Esta verba corresponde à comparticipação referente a competências da câmara e que as juntas de freguesia assumiram”, explica o presidente da Câmara Municipal. Benjamim Rodrigues adianta que este procedimento formal é necessário dado que a legislação que Lei n.º 50/2018, que concretiza a transferência de competências dos municípios para os órgãos de freguesia, não tornou automática a assunção dessa transferência.

No total, a autarquia terá de transferir 60 mil euros, que variam entre os 877,48 euros para a freguesia de Carrapatas e os 4181,13 euros para Morais ou os 4072,63 euros para a União de Freguesias de Espadanedo, Edroso, Murçós e Soutelo Mourisco.

Em causa está, entre outras, a transferência de competências como a gestão e manutenção de espaços verdes, a limpeza das vias e espaços públicos, sarjetas e sumidouros, a autorização da atividade de exploração de máquinas de diversão ou a autorização da realização de espetáculos desportivos e divertimentos na via pública, entre outros.

Benjamim Rodrigues esclarece que a verba a entregar a cada freguesia foi definida em função da disponibilidade financeira, da área de cada freguesia e da população ali recenseada aquando dos Censos de 2011. “No caso da freguesia de Macedo de Cavaleiros, sede do concelho, a verba definida considera apenas as aldeias anexas, dado que as competências exercidas por este órgão de freguesia terão sido maioritariamente nessas aldeias, uma vez que as restantes foram assumidas pela câmara municipal”, sublinha o presidente da autarquia macedense.

Sebastião Alba - Poeta insubmisso

 Quem é este poeta que tanto me apaixona?
Poderia começar por debitar o que, facilmente, ireis encontrar vertido por todo o lado em páginas públicas na Internet. Deixo-vos esse gozo da descoberta.
Resta-me, então, falar do que não está escrito, da emoção que sinto quando toco neste nome maior: Sebastião Alba, pseudónimo do Dinis Albano Carneiro Gonçalves (Braga 1940-2000).
Estareis neste momento a questionar - o que é que me liga a ele?
Quando há dias escrevi o poema NASCI EM TERRA DE POETAS estava a pensar no Nuno Nozelos, no Sebastião Alba, no Ernesto Rodrigues e na Ana Bárbara de Santo António e, no aconchego de berço que Torre de Dona Chama tem.
Para quando um Parque dos Poetas na nossa Torre?
Dir-me-eis: mas o Nuno Nozelos e o Sebastião Alba não nasceram, propriamente, em Torre de Dona Chama.
E estais cobertos de razão. Ser da Torre não advém da condição de nascimento, mas do amor que se tem pela terra. É preciso sentir o fervor crescente do encanto quando se chega à Torre, o cheiro que a natureza emana, o colorido da paisagem, o silêncio, o sossego, a ausência do bulício da cidade. É o reflorescer de emoções despoletadas a cada regresso. É a magia de sentir tudo fresco e novo como se fosse candura divina. É o impensável e indescritível a percorrer as veias mantendo a alma em resplendor. É ser-se genuíno e simples abraçando os seus com clamor.
Tanto o Nuno como o Sebastião, a seu pedido, jazem no cemitério da Torre. Quereis prova maior!?
Hoje, quero centrar-me no Sebastião Alba, o nosso Dinis, filho de gente da Torre.
Quanto mais procuro saber sobre ele, mais cresce a vontade de abraçar a alma deste Grande Poeta e Homem. Não é apenas a obra que nos deixou e que me traz em desassossego, é o facto de eu sentir que tenho de ir ao encontro do Homem, conhecê-lo nas diversas faces e camadas para o compreender, para me aproximar, para saber a cada dia um pouco mais, para lhe tocar na aura e descer à essência.
Descobri um homem sensível, inteligente, cultíssimo, de uma memória extraordinária, um ser inebriante, um nómada que tinha por casa a mortalha, insubmisso aos homens, às leis, às regras, à sociedade, um anarca.
Estareis por esta altura a levantar a ponta do dedo para me lembrar de que este homem vivia como um sem-abrigo, era um ser errante despojado de bens, quando até tinha família; dormia ao relento; andava sempre acompanhado de um rádio sintonizado na Antena 2; trazia no bolso a harmónica de beiços que tocava divinamente; uma garrafa de vinho escondida dentro de um saco de plástico; trazia a roupa do corpo e nada mais; passava fome e algumas pessoas davam-lhe de comer; escrevia divinamente, o que a mente lhe ditava, em qualquer pedaço de papel; deixava pequenos escritos como bilhetes, aqui e acolá, pelas pessoas a quem queria bem. Alguns que se aproximavam, sentiam repulsa pelo cheiro e o modo rude como ele às vezes os tratava. Só os verdadeiros amigos ficavam. Então, o que há nisto tudo de fascinante e arrebatador?
Ah, se pudesse voltar no tempo, ao tempo em que ele deambulava por Torre de Dona Chama, aquando das visitas à terra, à família e aos amigos! Tentaria aproximar-me dele, pouco a pouco, para o ir conhecendo, matando a minha sede na sua imensa sapiência, humanismo e sensibilidade. Quem sabe, não nos entenderíamos e trocaríamos papeizinhos escritos com algum poema, quem sabe!?
Descobri alguns pontos comuns que nos teriam aproximado, julgo eu. Ambos amamos a liberdade, os pássaros e seu canto, o voo livre, o ser humano enquanto frágil, por exemplo: as crianças e os idosos, a música, a literatura, a poesia, o amor romântico, o mar.
Estudei sempre fora e por longe fiquei a trabalhar. No pouco tempo que passei na Torre, nunca tive a sorte de me cruzar com ele.
Dinis viveu além do limite humano e excedeu-se na poesia. Poeta de extraordinária qualidade; Ser Humano a estudar no seu todo.

Deixo-vos, para deleite, com uma poesia sua...

Na sua primordial existência…

Na sua primordial existência
a poesia deixar-me-á da ternura
só o que é defensável

e à margem do papel em que escrevi
as cidades e os campos
através dos quais me acenou

apartará do meu paladar
o sabor do sagrado
com que ainda a nomeie

já não buscarei nos ensaios que cerco lhe moviam!
e nos ideais por que alheada
roçagou
que da janela eu não deslinde
de um cão em paz
a visagem ancestral
e a minha emoção seja enfim sedentária

e recém-chegada a noite finde
sem dar acordo de si.

Sebastião Alba
 
Teresa A. Ferreira, 28-11-2020