domingo, 28 de fevereiro de 2021

A Promessa

Por: Manuel Amaro Mendonça
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

Bruno conduzia a velha motorizada, em velocidade, a caminho de casa, na noite fria de inverno. O impulso que trazia era mais devido à inclinação da estrada do que propriamente pela potência do cansado motor. A ausência de receio nas curvas apertadas, essa, era devido aos copos de tinto que sorvera na tasca do Guedes, por entre as cartas da sueca e as anedotas porcas com amigos e colegas de trabalho. Na saca do almoço, presa na grelha traseira, seguiam duas garrafas de verde tinto, de beber e chorar por mais. Não seria a estrada serrana e as bermas compostas por penhascos de dezenas de metros, que haveriam de atrasar ainda mais o regresso ao covil onde habitava a sua Madalena. A adorada esposa, por estas horas, havia de estar a soprar fogo pelas ventas, com o retardo do marido, em dia de recebimento.

Cumpriram-se naquele dia quarenta e oito anos, que saíra do ventre prenhe de sua mãe, de onde haviam saído os outros sete irmãos em anos anteriores. Começara a trabalhar nas obras de construção civil aos onze. A família não podia manter quem não contribuía para o rendimento mensal, fortemente debilitado pelo consumo desregrado de tabaco e vinho do pater familias, também ele “mestre” trolha. Por isso, “deu com os lombos” a trabalhar nas construções, ao lado do pai, logo que terminou a escola primária. Estava-se nos últimos anos da ditadura não precisava de estudar mais. Não se pense por isso que o trabalho lhe fora facilitado, nunca esqueceu as “lambadas” que levava cada vez que se demorava a entregar o que lhe pediam, ou os dolorosos chutos nos fundilhos, que descarregavam a frustração do progenitor.

Agora, com estes agravos quase diluídos nos anos que se passaram, resolvera passar pela tasca, festejar e beber um copo com os amigos, depois de um dia muito longo. Bem sabia que prometera a Madalena não tornar a gastar na taberna o que lhes fazia tanta falta, mas que sabia ela das necessidades de um homem? "Reduzi aos cigarros e deixei de passar na tasca todos os dias, não deveria haver uma compensação de vez em quando? E afinal, para que servem as promessas, se não for para serem quebradas?" Argumentou para si próprio. "Se ela se puser com muita conversa, ainda vai enfardar uns tabefes."

Ruminava nestes pensamentos desde que saíra do estabelecimento, já noite, mais leve cinquenta euros, de cabeça pesada e ouvidos a zunir. O barulho irritante do motor da motorizada tornava-se quase hipnotizante, mesmo na estrada sinuosa e reluzente do gelo que se começava a formar nos pequenos fios de água que atravessavam o asfalto. O capacete parecia-lhe cada vez mais pesado e as pálpebras pareciam ficar coladas quando as fechava. Foi num ápice que sentiu o motociclo deslizar numa curva gelada e se viu, impotente, a rebolar para berma até se lançar no vazio.

Após uns segundos de incredulidade, tomou consciência da sua situação. Estava em cima de uma árvore seca, um velho castanheiro, debruçado sobre um barranco de mais de dez metros. Conseguia divisar a vegetação, no escuro, a acompanhar todo o declive até quase desaparecer de vista no fraguedo que o aguardava no fundo.

— Meu Deus! — Gemeu alto, aflito. A árvore estremeceu, ameaçando soltar-se e ele teve de agarrar-se com mais força.

Olhou o céu gélido, coberto de pequenos pontos luminosos, onde reinava o enorme disco prateado que parecia olhá-lo desdenhosamente, perfeitamente insensível ao seu drama. Olhou a toda a volta, em busca de uma solução para o seu problema, antes de se tornar a focar nas ominosas fragas que representavam, estragos muito dolorosos, se não mesmo a morte. O tronco onde se agarrava estremeceu de novo, avisando-o que tinha de arranjar uma solução urgentemente.

— Meu Deus! — Recomeçou, olhando o céu. — Minha Nossa Senhora de Fátima, pedi por mim a Nosso Senhor que perdoe as minhas faltas.

Como resposta, o castanheiro deu mais um sacão, soltando terra e algumas raízes, ameaçando colapsar a qualquer momento. Com uma lentidão exasperante, todo o tronco começou a inclinar-se para o vazio. Um verdadeiro réptil, Bruno rastejou sobre os ramos, procurando o corpo principal da árvore

— Eu prometo, Meu Deus! — Chorou, arrastando-se ao longo do tronco, tentando chegar às giestas que se eriçavam no declive. — Eu vou cumprir a promessa feita à minha Madalena. — Mais uns centímetros de inclinação, arrancaram a promessa final. — Eu deixo de beber, eu juro, eu prometo! Não volto a levar um copo aos lábios, Meu Deus, deixa-me voltar para a minha doce Madalena!

Ao invés de tombar de uma vez, o castanheiro encostou-se completamente ao declive, permitindo a Bruno agarrar-se com todas as suas forças à vegetação rasteira e iniciar a escalada para a salvação. Um enorme monte de terra saliente assinalava o local onde a raiz se libertara, deixando uma cratera. Na subida, teve de se esquivar das pedras e terra solta que parecia querer acompanhar a arvore na sua caminhada final.

— Obrigado Meu Deus! — As lágrimas, sangue e o muco do nariz, misturados com a terra, transformaram-no numa criatura de terror. Os cotovelos e os joelhos sangravam em manchas no vestuário. — Eu prometo, Meu Deus, eu prometo! — Arrastou-se, exausto, para a berma do asfalto e deitou-se no chão, a chorar desabridamente.

Cerca de um metro à sua frente, a pasta do almoço estava tombada e aberta, a marmita espalhara os restos do arroz misturando-os com o carmim de uma garrafa que se quebrara na queda. A outra, intacta, rebolara na sua direção.

Bruno sentou-se no chão e apanhou a vasilha, mirando-a com a saliva a formar-se na boca. Atrás e abaixo dele, o velho castanheiro devia estar a arrastar um pedaço da encosta, na sua agonia. Tirou a rolha, limpou o gargalo com a manga e deu dois grandes goles.

— Tendes de me perdoar Meu Deus. — Exclamou passando a língua nos lábios húmidos do néctar. — Preciso mesmo de uns goles… além do mais, eu prometi que não tornaria a levar um copo à boca, não uma garrafa.

Soltou uma gargalhada que ecoou no vale, mas foi a última, pois, no seu apego à terra onde nascera, o carvalho provocou uma enorme avalanche e metade da estrada foi arrastada, levando o perjuro para a sepultura, numa torrente de terra e pedras.

Manuel Amaro Mendonça
nasceu em Janeiro de 1965, na cidade de São Mamede de Infesta, concelho de Matosinhos, a "Terra de Horizonte e Mar".
É autor dos livros "Terras de Xisto e Outras Histórias" (Agosto 2015), "Lágrimas no Rio" (Abril 2016), "Daqueles Além Marão" (Abril 2017) e "Entre o Preto e o Branco" (2020), todos editados pela CreateSpace e distribuídos pela Amazon.
Foi reconhecido em quatro concursos de escrita e os seus textos já foram selecionados para duas dezenas de antologias de contos, de diversas editoras.
Outros trabalhos estão em projeto e sairão em breve. Siga as últimas novidades AQUI.

“Cultura para todos em Vinhais” envolve população em atividades artísticas

 O município de Vinhais, no distrito de Bragança, vai investir quase 226 mil euros do programa “Cultura para Todos” em atividades artísticas que envolvem a população na preparação e participação, divulgou hoje o município.


O projeto foi contemplado na totalidade com financiamento do programa “Cultura para Todos", no âmbito de uma candidatura apresentada pela Câmara em novembro de 2019, segundo a autarquia.

As atividades previstas, como explica em comunicado, focam-se “fundamentalmente na promoção de iniciativas de inclusão social através da dinamização de práticas artísticas e culturais com forte ênfase em ações de intergeracionalidade, bem como em ações de inclusão de grupos excluídos”.

“No desenvolvimento deste projeto todos são chamados a participar e todos terão um contributo importante na coprodução das várias atividades”, enfatiza.

A autarquia transmontana entende que, “com esta candidatura, o concelho de Vinhais terá uma oportunidade única para a preservação dos principais traços identitários da sua cultura”.

“Este território apresenta um vasto património histórico e cultural, nomeadamente o património inerente às Artes e Ofícios, Música e Danças, que urge ser preservado. O “Cultura para Todos em Vinhais” constituirá uma alavanca para que se perpetue, através de novas abordagens e de uma visão holística, a herança cultural”, acrescenta.

A operação prevê “a realização de um total de 206 iniciativas, desde oficinas temáticas, workshops, espetáculos e exposições, através do desenvolvimento de projetos artísticos de inclusão social a partir de três eixos principais: Teatro e Artes Performativas; Música e Dança; Artes e Ofícios”.

As ações serão desenvolvidas “em parcerias com entidades cuja atividade é fundamental para a partilha de saberes e tradições”, como as associações culturais e recreativas, as Instituições Particulares de Solidariedade Social, as juntas de freguesia e outros organismos locais com relevância na área da inclusão social.

Ao projeto “Cultura para Todos em Vinhais” junta-se o projeto “Festival Simbiose” aprovado recentemente, inserido no Programa Património Cultural - Programação Cultural em Rede - Imaterial e que tem como objetivo valorizar o património cultural e natural, através da organização e promoção de eventos culturais com impacto na projeção da imagem da região e do incremento de fluxos turísticos.

Este último projeto funciona em rede com os municípios de Macedo de Cavaleiros e Miranda do Douro e tem como base a coprodução e itinerância de espetáculos focados em elementos identitários de Trás-os-Montes.

Foto: AP

DEIXEM EÇA EM PAZ, JUNTA DA FILHA MARIA

Por: Humberto Pinho da Silva 
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

Por proposta de ilustre deputado, Eça de Queirós, vai ser transladado do jazigo de família, para o Panteão Nacional. Honra merecidíssima, que só peca por tardia.
Agora pergunto: se o romancista pudesse ser consultado, o que diria? Ele, que sempre foi tão avesso à sociedade lisboeta, e severo critico dos políticos de seu tempo.
 A transladação irá efectuar-se após 120 anos da sua morte. Porquê?
Talvez a explicação seja pelo facto dos filhos e esposa, do romancista, terem professado ideologia diferente ao regime da sua época.
Para exemplificar o que disse, lembro, que no dia seguinte ao nascimento de Dona Maria das Dores – neta de Eça, – seu tio, dirigiu-se ao registo Civil, de chapéu.
Lembraram-lhe que devia descobrir-se, em respeito à estátua da República, que existia na sala.
Respondeu com sobranceria: “ Não conheço essa senhora!”
Foi expulso da repartição, e a menina só foi registada, a 19 de Julho de 1918. Por essa e outras atitudes semelhantes, dos filhos, principalmente do José Maria, Dona Emília, mulher de Eça, foi avisada: se a família não quisesse servir o regime, o Estado seria obrigado a retirar-lhe a pensão, que tinha direito, como viúva de diplomata.
A família não gostou da advertência, e expatriou-se, juntamente com outros membros da família do Conde de Resende.
Seria essa a razão, do romancista, não ter ido, até agora, para o Panteão?
Não sei. Certo é que 120 anos depois da sua morte, ser-lhe-á feito justiça.
Presentemente repousa junto de “Serra”, que imortalizou, no romance: “A Cidade e as Serras”, que Fidelino de Figueiredo admirava e Dona Maria das Dores – Marquesa de Ficalho, – conheceu quando leu as obras do avô.
Os livros de Eça, admiráveis no estilo, encontram-se salpicados de passagens de mau gosto moral. Talvez porque assim queriam os editores.
Sua neta, a Marquesa de Ficalho confessa: que não teve coragem de terminar “ O Crime de Padre Amaro”, e acrescenta na entrevista concedida ao: “Jornal de Gaia” – 19/Set. / 2003:
“ Sempre fui um bocado respeitadora, pelo menos numas coisas, enquanto noutras talvez não seja.”
Dona Emília Cabral – neta do escritor, – declarou numa entrevista que realizei, que o avô não queria que os filhos, mormente a Maria, lessem os romances.
Em carta dirigida a Rodrigues de Freitas, Eça, escrevia: “ Os meus romances importam pouco: está claro que são medíocres; o que importa é o triunfo do Realismo.”
Estou de acordo que o lugar de Eça é o Panteão, ao lado de outros ilustres (serão todos ilustres?); mas arrancá-lo, 120 anos depois, da sepultura de família, da região que tanto amava e sempre foi acarinhado, não será violência a ele, e à terra que o acolheu?
Depois, o grande Camilo – Mestre dos Mestres, – segundo António Feliciano de Castilho e Vasco Botelho de Amaral, e que o grande Unamuno, considerou “ O Amor de Perdição” um dos livros fundamentais da Literatura Ibérica, não se encontra, igualmente, esquecido na capela de amigo, na cidade do Porto?
E tantos e tantos ilustres figuras, de maior grandeza, não estão “abandonados” nos cemitérios deste Portugal?
A homenagem é bonita e justa, mas chega demasiadamente tarde.
Deixem Eça em paz, na sua “Serra”, na tranquilidade do cemitério de Santa Cruz do Douro, junto da querida filha Maria ,que tanto amava, do neto D. Manuel de Castro e de Dona Maria da Graça Salemo. Será essa – a meu ver, – a maior homenagem que se pode fazer ao ilustre escritor e diplomata.

Humberto Pinho da Silva
nasceu em Vila Nova de Gaia, Portugal, a 13 de Novembro de 1944. Frequentou o liceu Alexandre Herculano e o ICP (actual, Instituto Superior de Contabilidade e Administração). Em 1964 publicou, no semanário diocesano de Bragança, o primeiro conto, apadrinhado pelo Prof. Doutor Videira Pires. Tem colaboração espalhada pela imprensa portuguesa, brasileira, alemã, argentina, canadiana e USA. Foi redactor do jornal: “NG”. e é o coordenador do Blogue luso-brasileiro "PAZ".

sábado, 27 de fevereiro de 2021

Incêndio em Vila Meã destruiu 1500 fardos de palha

 Um incêndio que deflagrou este sábado num armazém agrícola em Vila Meã, aldeia da freguesia de S. Julião de Palácios e Deilão, no concelho de Bragança, destruiu cerca de 1500 fardos de palha.

O fogo foi debelado graças à rápida intervenção dos Bombeiros Voluntários brigantinos que enviaram para o local 10 operacionais, apoiados por cinco viaturas. 

O segundo comandante dos BVB, Carlos Martins, explicou que os prejuízos são materiais e que não houve vítimas, uma vez que fogo ficou confinado ao armazém.

Glória Lopes

Quatro peixes que estão a desaparecer dos nossos rios

 Um terço das espécies de peixes de água doce está em vias de extinção no mundo. Em Portugal há pelo menos quatro espécies que estão, silenciosamente, a desaparecer dos nossos rios, alerta um novo relatório dedicado a estas espécies.


Uma em cada três espécies já está ameaçada de extinção, de acordo com o relatório “Peixes Esquecidos do Mundo”, publicado a 23 de Fevereiro pela Alliance for Freshwater Life, que reúne 16 organizações internacionais de conservação, incluindo a WWF.

Em Portugal, as populações de sável, lampreia-marinha, salmão e enguia “registam já uma diminuição acentuada”, revela o relatório, que alerta para a “enorme perda de biodiversidade de espécies de água doce”.

Estas espécies estão a perder os seus habitats por causa da construção de barreiras nos cursos de água, da extração de inertes, da poluição e da pesca comercial desajustada e sem obrigação de declaração.

Hoje, os peixes de água doce são o grupo ecológico mais ameaçado do nosso país.

Acará-severo (Heros severus) num afluente do rio Tapajos, no estado do Pará, Brasil. Foto: Michel Roggo/WWF

“Espécies como o sável, a lampreia-marinha e o salmão têm visto as suas populações diminuírem devido à inacessibilidade dos locais de desova”, constatou Cláudia Correia, especialista em Gestão Pesqueira de Base Comunitária. Por outro lado, acrescentou, a sobrepesca e as actividades de pesca ilegais contribuem para o declínio da enguia. “A pesca ilegal (de meixão, enguia juvenil), apesar de estar regulamentada como crime, continua a ter uma forte expressão.”

De 2019 a 2021, equipas de peritos de várias universidades estão a fazer o retrato actualizado da situação destes animais selvagens, num novo Livro Vermelho. Estão a trabalhar para sabermos onde estão, quantos são e quão ameaçados se encontram os peixes de água doce e migradores em Portugal Continental.

“O indicador mais claro dos danos que estamos a causar nos nossos rios, lagos e zonas húmidas é o rápido declínio das populações de peixes de água doce”, disse, em comunicado, Afonso do Ó, especialista em Água da ANP|WWF.

Actualmente existirão no mundo 18.075 espécies de peixes de água doce. Este número representa mais de metade de todas as espécies de peixes do mundo e um quarto de todas as espécies de vertebrados na Terra, segundo este novo relatório. É uma “variedade extraordinária”.

Guarda-rios (Alcedo atthis) a pescar um pequeno peixe em Balatonfuzfo, Hungria. Foto:  Laszlo Novak/WWF

A pesca em água doce é a principal fonte de proteína para 200 milhões de pessoas na Ásia, África e na América do Sul, bem como empregos e meios de subsistência para 60 milhões de pessoas.

As populações saudáveis de peixes de água doce também sustentam duas enormes indústrias globais: a pesca recreativa gera mais de 100 mil milhões de dólares anuais, enquanto os peixes de aquário são os animais de estimação mais populares do mundo e impulsionam um comércio global estimado em até 30 mil milhões de dólares.

Os peixes de água doce são extremamente importantes para comunidades locais em todo o mundo. Mas apesar disso, estas espécies “são invariavelmente esquecidas e desconsideradas sempre que são tomadas decisões relativas a barragens hidroelétricas ou à utilização de água”, salientou Afonso do Ó.

A perda de biodiversidade de água doce é duas vezes superior à dos nossos oceanos ou florestas.

De facto, 80 espécies de peixes de água doce já foram declaradas Extintas pela Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), incluindo 16 só em 2020.

Esturjão-branco (Huso huso). Foto: Lubomir Hasek/WWF

As populações de peixes migradores de água doce diminuíram 76% desde 1970 e os grandes-peixes, uns catastróficos 94%.

Em Julho do ano passado, um relatório alertou que há cada vez menos peixes migradores nos rios do planeta. A abundância de peixes como a truta, o salmão ou o peixe-gato do Amazonas registou um declínio mundial de 76% nos últimos 50 anos.

O relatório identificou as principais ameaças aos peixes de água doce, e “às quais Portugal não escapa”: destruição de habitats, barragens e outras barreiras em rios de curso livre, captação de água para irrigação e poluição doméstica, agrícola e industrial.

Além disso, os peixes de água doce também estão em risco devido à pesca excessiva e às práticas de pesca destrutivas, à introdução de espécies não nativas invasoras e aos impactos das alterações climáticas, bem como à extração não sustentável de areia e crimes contra a vida selvagem. 

“Há uma longa lista de ameaças, mas há também soluções e 2021 oferece uma esperança real para que o mundo possa inverter a maré e começar a reverter décadas de declínio das populações de peixes de água doce”, escreve a ANP|WWF.

De acordo com esta organização, “o mundo deve aproveitar a oportunidade para assegurar um acordo global ambicioso sobre biodiversidade na conferência da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica em Kunming, China – um acordo que deve, pela primeira vez, prestar tanta atenção à proteção e restauração dos nossos sistemas de apoio à vida em água doce como à proteção de florestas e oceanos do mundo”.

Chrosomus tennesseensis. Foto: Freshwaters Illustrated

Para Afonso do Ó, “a boa notícia é que hoje sabemos o que é preciso fazer para salvar os peixes de água doce. Assegurar um Novo Acordo para os ecossistemas de água doce do mundo irá trazer vida de volta aos nossos rios, lagos e zonas húmidas em vias de extinção”.

Também “retirará espécies de peixes de água doce da ameaça de extinção – assegurando alimentos e empregos para centenas de milhões de pessoas, salvaguardando ícones culturais, aumentando a biodiversidade e melhorando a saúde dos ecossistemas de água doce que sustentam o nosso bem-estar e prosperidade”, acrescentou Afonso do Ó.

A organização pede aos Governos para se comprometerem com metas para a protecção e restauro dos ecossistemas de água doce.

“Precisamos também de ver parcerias e inovação através de ações coletivas envolvendo Governos, empresas, investidores, sociedade civil e comunidades, à semelhança do trabalho de parceria que a Rede Douro Vivo, à qual a ANP|WWF pertence, fez nos últimos anos na bacia hidrográfica do Douro”, disse Afonso do Ó.

Mas há outros exemplos do que se faz em Portugal. Como os sete troços dos rios Alcabrichel e Sizandro, no concelho de Torres Vedras, que foram melhorados para conservar o ruivaco-do-oeste (Achondrostoma ocidentale), um dos peixes de água doce mais ameaçados de Portugal.

Helena Geraldes

O que procurar no Inverno: a bonina

 Depois de uns dias de chuva nada como voltar a ver o sol brilhar e sair para explorar o que há de novo na natureza. Durante o meu passeio, na pequena mata que existe perto de casa, encontrei imensas flores de Bonina (Bellis perennis). Esta pequena planta rústica e espontânea está agora em flor e podemos encontrá-la junto a caminhos, nos prados, nos campos, nos jardins e até em relvados das cidades.

Foto: Mabel Amber/Pixabay

A bonina

A bonina, também conhecida como margarida ou rapazinhos, pertence à família das Asteraceae, uma das maiores famílias de plantas. Esta família compreende mais de 1.600 géneros e 23.000 espécies. Em Portugal, é representada por cerca de 118 géneros e 376 espécies, distribuídas um pouco por todo o país.

Bellis perennis. Foto: Archenzo/WikiCommons

É uma pequena planta herbácea e perene que pode atingir até 20 cm de altura. As suas folhas, verde vivo, com uma só nervura e de margens serradas, têm forma espatulada e estão cobertas de pelos. Dispõem-se em roseta achatada, ou seja, as folhas dispõem de modo a formarem um círculo, todas situadas à mesma altura, junto ao solo. 

As suas flores surgem acima das folhas, numa haste floral fina, com cerca de 15 a 20 cm de altura. São hermafroditas, aparecem dispostas em inflorescências – capítulos, e são de dois tipos: tubulares, que têm a forma de pequenos tubos amarelos, dispostos em capítulo (parte central, de cor amarela, da inflorescência) e as outras, surgem na zona marginal, que contorna esse disco amarelo de flores, e são denominadas de lígulas, ou flores brancas, rosadas ou avermelhadas, femininas, muitas vezes confundidas como pétalas. 

O fruto é uma cipsela, ou fruto seco, com uma única semente, provido de um tufo de pelos que ajuda à sua dispersão pelo vento. As sementes são pequenas, ovadas, castanhas e pubescentes e as raízes são carnudas.

A denominação científica de Bellis perennis é muito intuitiva, está muito relacionada com a sua beleza e a sua profusão de flores ao longo de todo o ano. O nome do género Bellis, deriva do latim Bellus que significa “bela” ou “graciosa” e perennis, formada a partir da combinação de duas palavras, também do latim, per-+ – annuus que significa “durante todo o ano” ou “perene”, referente ao ciclo de vida da espécie. No entanto alguns autores referem que Bellis deriva da palavra latina Bellum, que significa “guerra”, em referência à sua capacidade de curar feridas. 

Ornamental, comestível e medicinal

A bonina é uma planta nativa no continente europeu, sendo mais comum no centro e sul da Europa. Em Portugal surge um pouco por todo o território continental e é também espontânea nas ilhas da Madeira e dos Açores, onde terá sido introduzida no passado.

Em plena floração. Foto: Sabina Bajracharya/WikiCommons

Tem preferência por uma exposição solar plena ou meia sombra, solos férteis, bem drenados e ricos em matéria orgânica. Tolerante ao frio, floresce abundantemente no inverno, no entanto não tolera geadas fortes, nem solos encharcados.

A profusão de flores e cores desta pequena e delicada planta, tornam-na muito interessante do ponto de vista ornamental, sendo muito utilizada em vasos, floreiras, em canteiros, bordaduras e maciços de jardins privados ou em espaços públicos. Por possuir hastes florais fortes e duráveis a bonina é também muito utilizada como flor-de-corte, na composição floral de arranjos e bouquets. 

Além destas características ornamentais, esta planta é também comestível. As folhas jovens e as flores são comestíveis, cruas ou cozidas, utilizadas em saladas ou para decorar pratos. 

Do ponto de vista medicinal, esta planta tem algumas propriedades terapêuticas. As suas folhas e flores têm sido usadas no tratamento de eczemas, acne, queimaduras, inflamações da pele, dores articulares, etc. Apresenta também propriedades cicatrizantes e depurativas, além de ser um excelente expectorante e antitússico. A infusão de flores e folhas pode servir como repelente de insetos.

A floração prolongada e o marcante disco floral tornam-na importante do ponto de vista ecológico, uma vez que atrai muito facilmente inúmeros insetos. As suas flores são muito visitadas por abelhas, abelhões, borboletas e escaravelhos, etc. e são uma excelente fonte de alimento fora da primavera. Quando surgem nos relvados, não é aconselhável o corte rente ou com muita frequência para não destruir as flores espontâneas.

Outras Bellis em Portugal

Em Portugal continental ocorrem, de forma espontânea, outras duas espécies do género Bellis. 

A Bellis annua, vulgarmente conhecida como bonina-dos-prados, bonina-dos-campos ou margarida-anual, é uma planta anual de menor porte que as restantes do género. Distingue-se delas, sobretudo, pela forma das folhas, ligeiramente mais obovadas (forma oval, com parte mais estreita para baixo) e com margens mais crenadas, com recortes da folha mais arredondados. As inflorescências são mais pequenas e possui pelos mais rígidos. As suas raízes são muito finas. Esta espécie ruderal pode encontrar-se em zonas de prado, clareira de matos, bermas de estradas e caminhos e em locais com alguma humidade, um pouco por todo o território nacional, mas com maior predominância a sul. 

A Bellis sylvestris, conhecida vulgarmente como margarida-brava ou margarida-do-monte, é uma planta vivaz, como a Bellis perennis. Distingue-se pelo caule praticamente inexistente e pelas folhas de cor verde-escura, compridas, com forma oblonga e com 3 nervuras. Os capítulos (inflorescências) são ligeiramente maiores que os da Bellis perennis e as flores líguladas são muitas vezes tingidas de púrpura, na parte posterior. As suas raízes são igualmente carnudas e ao contrário das outras espécies do género, o fruto desta planta, a cipsela, não apresenta um tufo de pelos que ajudará a dispersão pelo vento. As sementes caiem no solo, junto da planta, sendo as formigas as principais responsáveis pela sua disseminação. Esta espécie pode encontrar-se um pouco por todo o território nacional, em zonas de matos e em relvados húmidos.

Bellis sylvestris. Foto: Zeynel Cebeci/WikiCommons

Estas pequenas plantas encontram-se por todo o lado. Quem nunca colheu uma flor da bonina ou da margarida-do-monte e jogou “ama-me, não me ama?”. Um jogo que consiste em remover as lígulas (confundidas como pétalas) brancas ou rosadas, uma a uma, alternando as palavras “ama-me” e “não me ama” cada vez que se retira uma. O que é dito na última lígula (“pétala”) indicará a resposta à sua pergunta. Procurem-nas nas vossas caminhadas, joguem, divirtam-se.

Carine Azevedo

Este grifo sobreviveu a 38 “bagos” de chumbo e foi agora libertado

 Macho foi baptizado de Tiroteo devido aos tiros de caçadeira com que foi atingido, contou à Wilder o coordenador do CERAS – Centro de Estudos e Recuperação de Animais Selvagens, em Castelo Branco.


Tiroteo foi devolvido à natureza esta terça-feira, em Vila Velha de Ródão, onde habita a colónia de grifos mais próxima do local onde tinha sido encontrado. Ali, este grifo nascido no ano passado vai poder juntar-se a outros juvenis da mesma espécie, cujos adultos estão por estes dias ocupados a tratar dos ninhos e dos ovos.

Para que possa ser identificado se for novamente resgatado ou observado por alguém, a equipa do CERAS – Centro de Estudos e Recuperação de Animais Selvagens marcou-o com uma anilha e com marcas alares.

Tiroteo pouco antes de ser libertado. Foto: Samuel Infante

Quando chegou a esse centro de recuperação de fauna selvagem, em Novembro passado, este jovem grifo estava muito debilitado, magro, com um peso abaixo do normal para a espécie e muito desidratado, contou à Wilder o coordenador desta unidade gerida pela Quercus, Samuel Infante.

Mas foi quando fizeram o exame inicial de entrada no centro, que inclui um raio-x, que a equipa percebeu que a ave tinha sido vítima de disparo ilegal. “Foi  possível observar a existência de 38 objectos circulares, com diâmetros compreendidos entre 1 e 2 milímetros”, recorda o mesmo responsável. Verificaram então que se tratava de munições de chumbo, dispersas “em diversos locais do corpo do animal: músculos dos membros, cavidade celómica, tecido subcutâneo, entre outros”.

Raio-x feito ao grifo no CERAS. Foto: Samuel Infante

“Esta ave teve muita sorte de que os 38 projecteis de chumbo  não atingiram nenhum orgão vital, nem provocaram lesões que tornassem a ave irrecuperável e inviável de ser devolvida à natureza”, nota o mesmo responsável.

Assim, passados alguns dias de tratamento, Tiroteo recuperou vitalidade e tudo parecia bem encaminhado para ser rapidamente devolvido à natureza. Mas passado pouco tempo, “voltou a degradar a sua condição”.

O que se passava?

“Fizemos análises ao sangue e descobrimos que tinha níveis elevados de chumbo”, explica Samuel Infante. Os valores encontrados indicaram que se tratava de uma intoxicação subclínica – ou seja, que não é detectada por exames regulares – provocada por “alguns dos ‘bagos’ de chumbo no corpo da ave”.

Na maioria dos casos, a intoxicação por este metal pesado costuma acontecer “quando aves aquáticas ou outras, como as perdizes, ingerem restos de balas, ou então quando algumas aves, em especial as de rapina, comem outras aves que têm chumbo.”

Tiroteo quando estava ainda em tratamento. Foto: Samuel Infante

E os resultados dessa intoxicação, tal como aconteceu com este grifo, são preocupantes: quando é absorvido “o chumbo afecta todo o organismo, prejudicando a saúde geral, a capacidade reprodutiva e as faculdades mentais”, descreve Samuel Infante. E mesmo que as doses de chumbo ingerido não provoquem a morte da ave, o sistema imunitário é também afectado devido à redução de anticorpos e a flora intestinal fica alterada, aponta também.

No caso de Tiroteo, foram necessários vários meses e o acesso a uma substância que não se encontra disponível em Portugal para tratamento veterinário para recuperar do breve momento em que se tinha cruzado com uma caçadeira.

Este grifo também fez treinos de voo. Foto: Samuel Infante

Assim, além dos fluídos e vitaminas que ao longo do tratamento o ajudaram a recuperar o estado geral de saúde, este grifo recebeu também alguns fármacos que eliminaram definitivamente o chumbo do seu organismo. Entre esses, contou-se o cálcio dissódico EDTA, um agente quelante do chumbo usado no tratamento dessas intoxicações, que acabou por ser conseguido através de uma organização internacional, a VCF – Vulture Conservation Foundation (Fundação para a Conservação dos Abutres, em português). “Solicitámos o apoio à VCF que gentilmente nos conseguiu o medicamento”, explica Samuel Infante.

Mas esta situação não é única, pelo contrário. “Infelizmente todos os anos temos vários casos com abutres-pretos, águias-calçadas e grifos, entre outras aves.”

Proibir o chumbo

Medidas necessárias para que casos assim não se voltem a repetir? “Em relação à intoxicação por chumbo, precisamos da proibição total de uso de munições de chumbo na actividade cinegética e também do seu uso na pesca”, defende Samuel Infante, que lembra que no mercado já estão à venda algumas alternativas não tóxicas e que vários países da Europa já aplicam essa regra.

Já no que respeita ao disparo ilegal de que esta ave selvagem foi alvo, o coordenador do CERAS advoga que é importante haver “mais fiscalização e penas mais pesadas para estes crimes, para que não fiquem impunes”. No caso de Tiroteo, o atirador nunca foi encontrado.

Inês Sequeira

O grifo-sentinela Castelo é uma verdadeira fortaleza

 O grifo Castelo, um dos grifos do projeto Sentinelas - Rede de Monitorização de Ameaças para a Fauna Silvestre da Palombar - Conservação da Natureza e do Património Rural, marcado com emissor GPS e anilhas no dia 31 de outubro de 2020 no Parque Natural de Montesinho (PNM), é uma verdadeira fortaleza. Depois de estar ferido e de ter passado cerca de 15 dias sem se alimentar, conseguiu recuperar-se sozinho e em pleno e voltar à sua atividade normal.

Grifo Castelo. Fotografia João Santos/Palombar.

No dia 12 de novembro de 2020, a equipa do projeto Sentinelas detetou movimentos anormais do Castelo e, de imediato, procedeu à localização e monitorização in loco do mesmo. Depois de ter sido detetado numa zona do PNM, a equipa do Sentinelas verificou que o abutre se encontrava com um ferimento, de causa desconhecida, na zona ventral/abdominal, onde foi possível ver manchas de sangue através de observação com telescópio.

Grifo Castelo. Fotografia João Santos/Palombar.
Monitorização do grifo Castelo. Fotografia Uliana de Castro/Palombar.

A ave foi monitorizada durante vários dias e, em articulação e colaboração com o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e técnicos e vigilantes da natureza do Parque Natural de Montesinho, foram realizadas duas tentativas de captura do animal para que este pudesse ser enviado para um centro de recuperação. As capturas não foram concretizadas por este não estar suficientemente debilitado para que o seu resgate fosse possível, apresentando ainda capacidade de reação e voo.

O Castelo continuou, no entanto, a ser monitorizado diariamente para avaliação do seu estado e evolução. O grifo conseguiu, entretanto, recuperar-se sozinho e voltou à sua atividade normal, no final de novembro de 2020, seguindo com a sua missão enquanto grifo-sentinela para monitorizar as ameaças contra a fauna silvestre relacionadas com o furtivismo.


Desde que foi marcado, até início de dezembro de 2020, o Castelo movimentou-se sobretudo no nordeste de Portugal, na fronteira com Espanha, no eixo norte-sul (ver mapa). O Castelo é uma verdadeira fortaleza e continua a ser um guardião da sua espécie e de todas as espécies selvagens afetadas pelo furtivismo.

Programa Especial da Albufeira de Foz Tua está em consulta pública até ao dia 10 de março

 É de todo o interesse social que as entidades e cidadãos que habitam e desenvolvem atividades económicas neste território consultem a documentação e o respetivo regulamento, um documento legal que no futuro irá impor novas regras, inclusive no domínio das atividades agrícolas.
O Programa Especial da Albufeira de Foz Tua está em consulta pública até ao próximo dia 10 de março. É nesta fase que entidades e cidadãos têm a possibilidade de participar com novas achegas, podendo ser denunciados casos particulares de afetação resultantes da implementação do programa. Basicamente, a Consulta Pública é um mecanismo de publicidade e transparência que serve para fazer a ponte entre a administração pública e a sociedade. Constitui-se como um instrumento do poder público para que o mesmo possa obter informações diretas, opiniões e críticas a respeito de um assunto que interessa de forma específica à população residente junto do projeto em causa.

A área de intervenção do Programa Especial da Albufeira de Foz Tua abrange cerca de 3 891 hectares, dos quais 421 correspondem à albufeira de Foz Tua, integrando os distritos de Bragança e de Vila Real, nos concelhos de Alijó (União das Freguesias de Castedo e Cotas, São Mamede de Ribatua e União das Freguesias de Carlão e Amieiro), de Carrazeda de Ansiães (União das Freguesias de Castanheiro do Norte e Ribalonga, Pombal, Pinhal do Norte e Pereiros), de Mirandela (freguesia de Abreiro), de Murça (freguesia de Candedo) e de Vila Flor (freguesia de Freixiel).

O Regulamento de Gestão da Albufeira de Foz Tua integra as regras futuras “aplicáveis a este domínio hídrico, em especial as que se referem às áreas de recreio e lazer, às infraestruturas de apoio e às atividades secundárias, bem com as que dizem respeito a comportamentos suscetíveis de afetar ou comprometer os recursos hídricos. O regulamento vincula as entidades públicas e os particulares”, lê-se no resumo não técnico do programa, pelo que a sua aplicação futura terá implicações diretas para as populações abrangidas por este novo ordenamento.

É pois de todo o interesse social que as entidades e cidadãos que habitam e desenvolvem atividades económicas neste território consultem a documentação e o respetivo regulamento, um documento legal que no futuro irá impor novas regras, inclusive no domínio das atividades agrícolas.

Todos os documentos encontram-se acessíveis no portal Participa e qualquer pessoa os pode consultar e emitir discordâncias caso se registe na documentação ou no articulado do regulamento algumas regras que tenham repercussões negativas para o futuro das atividades que desenvolvem nesse território.

Benjamim Rodrigues apela à participação dos macedenses para incluir ligação à Godiña no Plano de Recuperação e Resiliência

 O presidente da Câmara Municipal de Macedo de Cavaleiros, Benjamim Rodrigues, apela aos macedenses que participem até segunda-feira na Consulta Pública do Plano de Recuperação e Resiliência pedindo que a estrada Macedo – Vinhais – Godiña, através do prolongamento do IP2, ainda possa ser incluída no plano.
A ligação transfronteiriça tem sido reivindicada pelos autarcas portugueses e espanhóis e permitiria criar uma maior proximidade ao trem de alta velocidade espanhol, o AVE:

“Faço um apelo a todos os macedenses para que se incluam na participação e manifestação da opinião de ligar Macedo – Vinhais – Godiña porque é uma ligação prioritária em termos de desenvolvimento económico. As ligações à Galiza que há são perfeitamente rurais e de pequenas dimensões, pelo que faz todo o sentido ligar um eixo com um pólo industrial considerável, que é o Nó da Amendoeira, até à Godiña. Esta ligação iria permitir fazer exportação de produtos em trem de alta velocidade, o AVE.”

O presidente afirma que é uma ligação pela qual vão continuar a lutar.

Também a Assembleia Municipal de Macedo de Cavaleiros aprovou na passada quinta-feira uma proposta, inicialmente apresentada pelo CDS mas que se converteu num pedido de toda a assembleia dirigido ao Governo para que a ligação ainda seja incluída enquanto o plano se encontra em fase de discussão.

A proposta foi apresentada à assembleia pela deputada Jacinta Lopes:

“O importante é agir nos momentos próprios e aproveitar as oportunidades que estão à nossa disposição, em vez de culpabilizar os outros pela nossa inacção.

Por esse motivo propomos, tendo em atenção que ainda nos encontramos no período de discussão e auscultação pública do referido plano, fazer chegar ao Governo a nossa pretensão de incluir no referido plano a ligação transfronteiriça entre Macedo de Cavaleiros – Vinhais – Gudiña.”

O Plano de Recuperação e Resiliência está em consulta pública até segunda-feira e pode ser acedido e comentado na internet AQUI.

Escrito por ONDA LIVRE

Requalificação da EN103 entre Vinhais e Bragança prevista no PNI

 A Estrada Nacional 103 (EN103) entre Vinhais e Bragança integra o Plano Nacional de Investimentos (PNI) 2030 do Governo e vai ser alvo de requalificação, não estando previsto na mesma via intervenções no concelho de Chaves, foi hoje divulgado.


A informação consta de uma resposta do ministro das Infraestruturas e da Habitação aos deputados do PSD na Assembleia da República eleitos por Vila Real, sobre as acessibilidades no Alto Tâmega e a EN103, a que a agência Lusa teve hoje acesso, e na qual o governante diz que PNI 2030 identifica a requalificação da EN103 entre Vinhais e Bragança.

O ministério realçou que não há “uma programação detalhada para o efeito” e lembrou que também no concelho de Vinhais está a decorrer uma empreitada na EN103, consignada em 21 de setembro no valor de 2,6 milhões de euros, com conclusão prevista para abril de 2021.

Na questão colocada ao ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, os sociais-democratas perguntaram se havia “verbas orçamentadas para a beneficiação e requalificação da EN103” no concelho de Chaves, distrito de Vila Real, nos troços ‘Barracão-Chaves’ e ‘Chaves-Vinhais’.

A tutela esclareceu que “não estão previstas intervenções a curto prazo” no concelho de Chaves e acrescentou que o pavimento está classificado com “um índice de qualidade de razoável”.

Os sociais-democratas tinham referido que a EN103, que liga o litoral minhoto ao extremo interior transmontano em 284 quilómetros, é “obsoleta”, “mantém o traçado de há mais de um século o que se traduz numa viagem sinuosa, de curva e contracurva, sem passagem de lentos e sem dispositivos de segurança”.

“É considerada uma das dez estradas mais perigosas do nosso país. O governo é o primeiro responsável por garantir e promover o desenvolvimento equilibrado do território nacional e a coesão territorial, devendo proporcionar condições de fixação de populações e funcionamento de atividades económicas e sociais, que evitem a desertificação do interior do país e acentuem os desequilíbrios existentes”, sublinhavam.

Os parlamentares do PSD questionaram ainda se estava prevista alguma verba para 2021 para a requalificação do nó de acesso da Autoestrada 24 (A24) às Pedras Salgadas bem como a ligação dos concelhos de Montalegre, Boticas e Valpaços, todos do distrito de Vila Real, à A24.

Sobre o nó de Pedras Salgadas da A24, Pedro Nuno Santos realçou que este tem ligação [a Pedras Salgadas, concelho de Vila Pouca de Aguiar] através das Estradas Municipais (EM) 549-1 e 549 “cuja requalificação não se encontra na esfera da tutela deste ministério”.

“No que se refere à acessibilidade dos concelhos de Boticas, Montalegre e Valpaços às autoestradas mais próximas, ou seja, A4, A7 e A24, a totalidade do território de Boticas encontra-se a menos de 30 minutos de percurso até ao nó de uma autoestrada”, acrescentou.

Quanto ao concelho de Valpaços, “tem situação semelhante, à exceção de uma pequena região a norte do mesmo em que o percurso pode atingir os 45 minutos”.

“O de Montalegre é o único que apresenta, desde a sua região noroeste, percursos com tempos que podem atingir, no máximo, os 60 minutos”, referiu ainda.

Foto: António Pereira

Portugueses e espanhóis reclamam reabertura da fronteira de Bemposta

 Portugueses e espanhóis reclamaram hoje reabertura da fronteira de Bemposta, no concelho de Mogadouro, por entenderem que há condições sanitárias para o efeito, não se podendo "a qualquer preço" prejudicar as relações económicas e sociais transfronteiriças.
A fronteira de Bemposta, no distrito de Bragança, faz a ligação do Planalto Mirandês, através da localidade espanhola de Fermoselle, para toda a província de Castela e Leão.

"Fizemos este protesto simbólico para ver se as nossas reivindicações chegavam aos governos de Portugal e Espanha. Não faz sentido ter esta fronteira fechada, numa altura em que praticamente não há casos covid-19 tanto no concelho de Mogadouro como em Fermoselle", disse aos jornalistas o presidente da Câmara de Mogadouro, Francisco Guimarães, à margem da concentração que juntou cerca de três dezenas de pessoas.

As populações raianas de Bemposta e Fermoselle juntaram-se ao coro de protesto por entenderem que as relações económicas e sociais saem prejudicadas em ambos os lados da fronteira.

"As relações económicas, sociais e culturais são fundamentais para os territórios raianos. Por estes motivos, reclamamos a reabertura imediata da fronteira entre o concelho de Mogadouro e Fermoselle. Há profissionais de ambos os lados que estão sujeitos a deslocações de muitos quilómetros para exercer as suas mais diversas atividades profissionais", indicou o alcaide de Fermoselle, José Manuel Pilo.

Durante o protesto simbólico houve mesmo a partilha de bandeiras dos dois países em sinal de "união" entre os dois territórios ibéricos, numa altura em que todos garantem "que não faz sentido que as fronteiras entre territórios deprimidos, como são as zonas raianas, estejam encerradas".

"Os governos de Portugal e Espanha tomam decisões a quente que prejudicam os territórios de baixa densidade populacional. Não é normal que se imponham restrições deste tipo. Isto não Madrid ou Lisboa", vincou o autarca espanhol.

Do lado das populações há um sentimento de revolta tudo porque há pessoas que têm de andar cerca de 80 quilómetros quando o trajeto normal com a fronteira verta de pouco mais de 12 quilómetros.

"Sou de Bemposta e estou casada em Fermoselle. Tenho uma casa em Bemposta e não me posso deslocar para cuidar dos meus bens pessoais ou visitar a minha família. Tenho negócios na raia e por vezes não consigo chegar a horas já que a passagem em Miranda do Douro, que é mais próxima, só está aberta três horas em dois períodos do dia", lamentou Filomena Silva, proprietária de uma loja de móveis.

Já Carlos Gomes, trabalhador da construção civil, queixou-se dos quilómetros que tem de fazer diariamente para chegar ao seu posto de trabalho em Fermoselle.

"Tenho de andar mais de 60 quilómetros por dia e levantar-me mais cedo, quando em condições normais só tenho de percorrer 12 quilómetros. É muito complicado", justificou.

Segundo o último boletim epidemiológico, emitido na sexta-feira pela Unidade Local de Saúde do Nordeste, a que a Lusa teve acesso, o concelho de Mogadouro tem quatro casos ativos de covid-19.

Autarcas do distrito dizem que "bazuca" está direccionada para o litoral

 O autarca de Vimioso diz que o Plano de Recuperação e Resiliência foi recebido como um “murro no estômago” pela região.


Num fórum da Rádio Brigantia sobre a “bazuca” europeia", Jorge Fidalgo afirmou não compreender que a ligação do concelho a Bragança e à auto-estrada não esteja incluída nos investimentos. O presidente da câmara espera que se tenha tratado de um esquecimento, porque a obra até já tem o projecto praticamente concluído.

“Do que se trata é uma ponte e dos respectivos acessos, entre Vimioso e Carção, que são cerca de três quilómetros, absolutamente fundamental para ligar o concelho de Vimioso à auto-estrada”, salientou.

Outro dos projectos deixados de fora é a revitalização do Complexo Agro-industrial do Cachão, nos concelhos de Mirandela e Vila Flor. O autarca deste último concelho, Fernando Barros, afirma que contava com a inclusão do investimento no plano para os próximos 5 anos.

“Há áreas, relativamente às empresas e a outras actividades, a que ainda nos podemos candidatar. O importante é que o interior está a concorrer com o litoral e fica sempre prejudicado”, acrescentou.

Segundo a presidente da câmara de Mirandela, Júlia Rodrigues, é notório o centralismo na distribuição do investimento.

“Não sabemos ainda como é que o estado central, que fica com o grande bolo do investimento público, vai depois operacionalizar com as autarquias. De salientar que a nível de empresas o investimento é menor do que aquilo que as empresas esperariam”, referiu.

Também o autarca de Torre de Moncorvo, Nuno Gonçalves, diz que o plano está muito centrado no litoral. O também vice-presidente da CIM Douro diz que foram esquecidas todas as reivindicações da região.

“Este PRR é uma pequena fraude e uma ilusão. Se formos a lê-lo de uma ponta à outra, concentra os investimentos no litoral e esquece as prioridades do interior e esquece por completo as reivindicações do Douro”, afirmou.

As críticas dos autarcas da região ao Plano de Recuperação e Resiliência, que está em consulta pública até à próxima segunda-feira.

Escrito por Brigantia
Jornalista: Olga Telo Cordeiro

Estudo alerta para a fraca qualidade ecológica dos rios em todo o mundo

 O estudo, que abrangeu 88 países, revela fraca qualidade ecológica dos rios em todo o mundo e a sua elevada perda de biodiversidade. Cerca de metade dos troços ou rios analisados encontra-se abaixo do nível aceitável na Europa e nos Estados Unidos, um terço na Austrália e um quarto na Coreia do Sul.
Uma equipa de 29 peritos de todos os continentes, liderada por Maria João Feio, do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE) da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), fez o ponto da situação sobre a qualidade ecológica dos rios no mundo e as notícias não são boas.

O estudo, que abrangeu 88 países, revela fraca qualidade ecológica dos rios em todo o mundo e a sua elevada perda de biodiversidade. Cerca de metade dos troços ou rios analisados encontra-se abaixo do nível aceitável na Europa e nos Estados Unidos, um terço na Austrália e um quarto na Coreia do Sul.

Maria João Feio
Uma das consequências da fraca qualidade ecológica dos rios «é uma perda muito elevada de biodiversidade. Por exemplo, na Nova Zelândia 70% das espécies de peixes de água doce estão em perigo, enquanto no Japão 40% estão ameaçadas. Noutros países a monitorização físico-química mostra um grau de poluição muito elevado que põe em risco a saúde humana», assinala Maria João Feio no artigo científico publicado na revista Water, intitulado “The Biological Assessment and Rehabilitation of the World’s Rivers: An Overview”.

Os cientistas avaliaram também o estado de implementação da biomonitorização dos rios, ou seja, a avaliação dos rios com base nas comunidades aquáticas – por exemplo, peixes, invertebrados bentónicos, algas ou outras plantas –, e as medidas que estão a ser tomadas para os recuperar, tendo concluído que, «na maioria dos países do mundo, a monitorização biológica dos rios de forma regular não está a ser feita. Numa grande parte dos países existe, no máximo, uma análise físico-química da água o que é insuficiente para traduzir a degradação destes sistemas resultantes das ações humanas (tais como a articialização das margens, corte de vegetação, presença de espécies não nativas e espécies invasoras, açudes e barragens que alteram a circulação da água, sedimentos e espécies ao longo das bacias hidrográficas)», expõe Maria João Feio.

Em relação à implementação de medidas de reabilitação dos rios, o panorama também não é animador. Segundo os autores do estudo, «apesar de existirem bons exemplos, tanto na Europa (principalmente no norte) como nos Estados Unidos, Japão e Coreia do Sul, concluímos que a este nível muito pouco tem sido feito a nível global».

«Se recuperados, os rios podem fornecer serviços muito importantes às pessoas, desde o fornecimento de água e alimento, e contribuir para a melhoria da qualidade do ar, do solo, a mitigação de extremos climáticos e ainda proporcionar zonas de lazer essenciais ao bem-estar humano», comenta a investigadora da FCTUC.

No que respeita aos rios portugueses, Maria João Feio diz que seguimos o padrão europeu, «com cerca de metade das massas de água analisadas em bom estado ecológico. E temos situações muito críticas ao nível dos grandes rios que estão muito alterados por barragens. Em todo o país, existem ainda casos de poluição pontual e difusa e também fortes alterações na vegetação ribeirinha, que é essencial tanto para o funcionamento do ecossistema aquático como para melhorar a qualidade do ar e do solo e filtrar as águas de escorrência que vão ter aos rios».

Tendo em vista a melhoria da qualidade dos rios, a equipa internacional de peritos produziu ainda um conjunto de recomendações, destacando-se, por exemplo, «a necessidade de definição de objetivos ecológicos realistas e claros para os planos de reabilitação/restauro; a obrigatoriedade de fazer planos de reabilitação/restauro ecológico com base em dados recolhidos, a priori, em programas de monitorização e fazer o acompanhamento desses planos também com monitorização ecológica».

Os especialistas defendem ainda a necessidade da criação de equipas interdisciplinares na elaboração dos referidos planos – cientistas conhecedores dos ecossistemas, engenheiros e ainda cientistas sociais –, de modo a «permitir envolver todos os tipos de utilizadores da água (população, indústria, decisores) num objetivo comum. É ainda essencial existir financiamento adequado e que a recuperação dos rios seja colocada nas prioridades políticas nacionais e internacionais».